Royalties: em defesa do Rio de Janeiro

É incompatível com o princípio da isonomia dar tratamento idêntico aos estados e municípios que sofrem os impactos da exploração do petróleo e aos que não sofrem



✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

O Brasil vive um importante momento impulsionado, dentre vários fatores, pela indústria petrolífera. As descobertas das reservas localizadas no pré-sal representam um marco para todo o país e irá gerar dezenas de milhares de novos empregos, desenvolvimento de regiões pouco exploradas, aumento expressivo de arrecadação do Estado etc, colocando o país no grupo dos maiores produtores de petróleo do mundo.

Por conta dessa grande revolução, é preciso discutir meios legais para obter o máximo de benefícios para toda a população. Afinal, o petróleo é um bem de toda a sociedade brasileira. No entanto, essa nova situação vivida na indústria não pode servir de pretexto para modificar a estrutura normativa estabelecida pela Constituição Federal e que vem mantendo, mesmo com dificuldade, o equilíbrio entre os vários entes da federação.

A previsão do pagamento desta receita está intimamente ligada aos impactos ambientais, sociais e estruturais gerados pela exploração de petróleo, que notoriamente provoca uma intensa modificação no respectivo território. Para adequar-se devidamente para receber toda a indústria petrolífera, os estados e os municípios envolvidos na exploração necessitam de investimentos pesados, uma vez que, iniciada a busca pelo petróleo, há um significativo aumento populacional, que gera custos na área da saúde, educação, transporte etc. Para que seja possível a realização de tais investimentos, a Constituição e a legislação ordinária previu o pagamento de royalties.

continua após o anúncio

As propostas enviadas ao Congresso Nacional para implementação de um novo marco regulatório na indústria de petróleo irão provocar substanciais mudanças nas normas que cuidam do tema. Nos projetos, o sentido e o alcance da norma prevista na Constituição Federal, que é expressa em estabelecer que os royalties oriundos da exploração do petróleo pertencem aos estados e municípios produtores, foi ignorado, de modo que o objetivo é redistribuir a receita indiscriminadamente para todos os entes da federação, independentemente se participam ou não da cadeia exploratória.

O legislador constituinte fez questão de dar um tratamento diferenciado aos estados produtores em decorrência dos ônus causados pela exploração do petróleo. Aí se inclui, notadamente, o aumento pela demanda de serviços públicos, como abastecimento de água, saneamento básico, educação, saúde, transporte e segurança pública, dentre muitos outros. Da forma como é estipulado na Constituição Federal, o pagamento dos royalties são uma forma de compensação financeira. Trata-se de um direito subjetivo constitucional assegurado a esses entes, e não um favor concedido a critério da União. É incompatível com o princípio da isonomia dar tratamento idêntico aos estados e municípios que sofrem os impactos da exploração e aos que não sofrem. É importante notar que sucessivas leis, desde 1953, já tratavam do tema e a Constituição, que foi implantada após a previsão dos royalties, teve a clara intenção de manter o instituto. Uma lei ordinária, ao regulamentar dispositivo constitucional, não pode, em hipótese alguma, modificar seu sentido e alcance, sob pena de ser expressamente inconstitucional.

continua após o anúncio

Além da interpretação adequada da Constituição, é preciso analisar a sistemática dos royalties em paralelo ao regime de cobrança do ICMS, segundo o qual o tributo incidente sobre o petróleo é devido ao Estado de destino e não ao de origem, criando, assim, uma exceção à regra que estabelece que o imposto é cobrado na origem. Sendo assim, uma vez não arrecadado o montante do ICMS, como poderiam os estados e municípios produtores também se verem sem a receita dos royalties na forma prevista na legislação atual? Na hipótese de aprovação da emenda Ibsen ou Simon, os produtores perderiam expressivas quantias a título de royaltie, além de continuarem "exportando ICMS", acarretando prejuízos para os cofres públicos locais. Se os estados produtores, que têm de suportar os ônus do impacto da exploração petrolífera, ficarem sem o ICMS e sem os royalties, estarão sofrendo discriminação incompatível com a Constituição.

O princípio federativo nacional vive um delicado momento de desequilíbrio. Os estados e munícipios buscam utilizar mecanismos para obter vantagens para si em detrimento dos outros membros da federação, tornando o pacto federativo uma utopia. A previsão de uso do FPE e FPM - Fundos de Participação dos Estados e Municípios - para distribuição dos royalties é mais um exemplo dessa guerra travada entre os entes federativos, e além de não resolver o problema da desigualdade no país, irá ser responsável por uma grande injustiça aos estados e municípios produtores de petróleo. Viola a lealdade que se devem mutuamente os entes federativos e compromete a autonomia financeira de Estados da Federação, pela mudança arbitrária das regras do jogo. Conforme entendimento do STF de outrora, tais fundos não representam a realidade do país e necessitam de novas regulamentações. A sua utilização como critério de distribuição da receita oriunda do petróleo acarretará mais um ponto inconstitucional nas normas reguladoras da indústria de óleo e gás. Além disso, as mudanças buscadas pelo Congresso Nacional, representado em especial pelos Estados não produtores, não podem avançar sob os contratos firmados com base na legislação anterior. Se o fizer, estará afrontando a segurança jurídica de nosso ordenamento, desrespeitando o ato jurídico perfeito e o direito adquirido.

continua após o anúncio

Interpretando o sentido e alcance dos dispositivos constitucionais que tratam do tema aplicado aos projetos de lei que pretendem modificar o regime de distribuição dos royalties, conclui-se que tais normas são claramente inconstitucionais por diversos motivos. A perspectiva de um futuro promissor em decorrência do aumento expressivo das reservas de petróleo no país não podem servir de pretexto para desmantelar toda a estrutura jurídica do país, violando princípios que são a base do Brasil, em especial a igualdade e o pacto federativo. É necessário discutir meios eficazes de utilização dessa iminente receita para reduzir a desigualdade e a pobreza do país, mas a Constituição Federal deverá sempre ser respeitada. A luta dos entes não produtores para receber parte da receita oriunda do petróleo é justa, uma vez tratar-se de bem pertencente à toda população brasileira. No entanto, não deve ser permitido que os estados e municípios produtores, ao saber da garantia constitucional do repasse de compensação financeira estabelecem as diretrizes orçamentárias, tenham suas receitas suprimidas de forma não permitida em lei.

continua após o anúncio

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247