Jovem estudante é encontrado morto em cela de delegacia e Polícia alega suicídio
Charles Wallace dos Reis era gay e tinha símbolos do comunismo tatuado pelo corpo
✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.
Por Denise Assis, para o 247 - "É com extremo pesar e luto que comunicamos a perda de nosso querido aluno Charles Wallace dos Reis. Neste momento de dor, em que buscamos entender ainda o que aconteceu, o ICHS manifesta solidariedade aos familiares, aos amigos mais próximos que com ele conviviam na República Cangaço e, também, aos alunos do Instituto, expressando as mais sinceras condolências. Que possamos nos restabelecer da dor e, juntos, nos fortalecer".
A nota foi emitida pelo Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), por Charles, 23 anos, morto em circunstâncias ainda não esclarecidas, na madrugada do último domingo (21), dentro de uma cela na delegacia da cidade de Ouro Preto – região central de Minas Gerais.
O jovem negro, gay e com símbolos do comunismo tatuado pelo corpo, militava em movimentos sociais, cursava História na instituição e foi detido depois de se envolver em uma briga com o namorado durante uma festa. Tal como nos tempos da ditadura – em que o jornalista Vladimir Herzog foi dado como tendo cometido suicídio nas dependências da Polícia Política, do DOI-CODI de São Paulo – no boletim de ocorrência de sua morte consta que ele se enforcou “usando um tirante (cordão) de uma caneca.
Charles Reis era estudante de história da universidade, que cobra uma apuração rígida sobre a morte sob a tutela do Estado.
A Polícia Civil abriu inquérito para investigar as circunstâncias da morte do estudante, noticiada primeiramente pelo jornal O Tempo. De acordo com a Polícia Civil, por nota, a perícia esteve no local e fez os levantamentos iniciais que irão "subsidiar a investigação". "O corpo foi encaminhado ao Posto Médico-Legal, onde foi submetido a exames. A PCMG aguarda a conclusão dos laudos, cujo prazo estimado é de até 30 dias, podendo variar conforme a complexidade dos exames", completa.
Conforme a PM, a primeira ocorrência envolvendo o jovem começou ainda na noite de sábado (20), depois que ele e o namorado começaram a se agredir em um evento na cidade vizinha de Mariana, por conta de ciúmes. Depois dos militares conversarem com eles, Reis afirmou que iria embora e o companheiro preferiu não representar contra ele. Horas depois, o universitário teria retornado à casa onde acontecia a festa, descontrolado e forçando a porta do imóvel, levando os moradores a acionarem a polícia novamente. Ao ser abordado ele teria se recusado a colocar a mão na cabeça e acabou sendo contido com uso de força, conforme versão da PM.
Foi então que Reis e o namorado acabaram sendo levados, primeiramente para a UPA da cidade. Lá, o rapaz teria chegado a ameaçar o militar, falando que seria "a última pessoa que ele iria prender". Depois disso, o casal foi então levado para a delegacia, onde, horas depois, foi encontrado morto.
Em entrevista sob anonimato à reportagem de O TEMPO, uma pessoa próxima de Reis, que acompanhou a prisão, contou que ele estava embriagado quando se envolveu na briga. "Ele ficou agressivo e preferimos chamar a polícia. Lá, na delegacia, ficamos na entrada e ele foi levado algemado para a cela, onde tiraram a algema e o trancaram, mas não tiraram nada dele, o cordão, os brincos ou os sapatos. Ele pediu pra fumar, pois acalmava ele, mas tomaram o celular e o cigarro. Faltou humanidade e empatia", disse.
Entretanto, ainda segundo a conhecida, o tirante supostamente usado no suicídio não esteve com o jovem o tempo todo. "No caminho para Ouro Preto esse cordão estava na parte da frente da viatura, com os policiais. Quando descemos do carro, vi o tirante cair no chão, mas o policial pegou e pôs no bolso do Charles", lembra. "Não sei se ele esqueceu de pegar quando o colocou na cela ou o que, mas não deveriam deixar ele entrar lá com nada. Quando soubemos da morte, a gente só chorava, não queríamos acreditar, pois ele não faria uma coisa dessas. Não pudemos nem ir ao velório dele, pois ficamos na delegacia", continuou a fonte.
O diretor do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS) da UFOP e professor do Departamento de História da universidade, Mateus Henrique de Faria Pereira, contou que conhecia Reis desde quando ele era estudante do serviço social e, depois, quando se tornou aluno do instituto.
"Só soube que teria se matado na segunda-feira (22) e, depois, descobrimos que isso aconteceu sob a tutela do Estado. Para nós, que somos professores de história, imediatamente nos vêm na lembrança a morte de Vladmir Herzog", diz.
"Tudo precisa ser apurado já que pairam muitas dúvidas, como se ele sofreu violência policial, como entrou com o tirante na cela e se isso seria o suficiente para cometer o autoextermínio. Mas, de toda forma, parece que há algum tipo de negligência. Precisamos saber se ele foi estimulado a alguma ação, se sofreu alguma ação. Temos os agravantes de ele ser um jovem gay, negro e comunista. Ele tinha uma tatuagem da foice e o martelo no corpo. Então, a gente espera que seja esclarecido. Foi muito difícil conversar com a família, que está arrasada", lembra o professor.
A reitoria da UFOP enviou um ofício às autoridades solicitando informações sobre a morte do estudante e, ainda segundo Pereira, a família do jovem foi aconselhada a acionar a OAB de Ouro Preto. "A comissão de Direitos Humanos da ALMG também está acompanhando o caso a nosso pedido", lembra o diretor do ICHS. A UFOP, por meio de nota, cobrou uma "apuração rígida" do caso. Confira o texto na íntegra:
"É com pesar que a Universidade Federal de Ouro Preto comunica o falecimento de Charles Wallace dos Reis, aluno do curso de História.
Charles faleceu neste domingo (21), em Ouro Preto, em circunstância ainda não esclarecida. A Administração Central está solicitando mais informações sobre o ocorrido, assim como uma apuração rigorosa para que não haja dúvidas sobre os fatos.
A comunidade acadêmica se solidariza com familiares e amigos"
Também por nota, o ICHS lamentou a perda:
"É com extremo pesar e luto que comunicamos a perda de nosso querido aluno Charles Wallace dos Reis. Neste momento de dor, em que buscamos entender ainda o que aconteceu, o ICHS manifesta solidariedade aos familiares, aos amigos mais próximos que com ele conviviam na República Cangaço e, também, aos alunos do Instituto, expressando as mais sinceras condolências. Que possamos nos restabelecer da dor e, juntos, nos fortalecer"
* Com informações do jornal O Tempo
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:
iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popularAssine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:
Comentários
Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247