Em "Não tem preço", Chico deixa lição de vida

Ele deixou sua genialidade no texto que o 247 escolheu; a crnica, publicada no blog do humorista em maio de 2008, mostra sua genialidade e sua trajetria de vida; leia aqui o texto na ntegra



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247_ Mestre na arte, mestre nas lições da vida. Chico Anysio escreveu a crônica "Não tem preço", em que resume sua experiência de vida. Publicada no blog Bloglog, em 27 de maio de 2008, o texto demonstra humildade, perseverança e toda a sua genialidade.

Leia abaixo, o texto na íntegra.

" Não tem Preço!

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 Assistir uma peça de Teatro = R$ 80,00

 Porção de bolinhos de Bacalhau = R$ 20,00

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 Uma forra em nome de todos os artistas do país = “NÃO TEM PREÇO“

O CASO DA GOVERNANTA

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Posso contar uma vitória? Não é que seja exatamente uma vitória, mas é uma

grande forra. Sabe? Vingança é uma palavra forte para definir. Acho que

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forra é o que é. Não uma forra minha, particular. Uma forra que eu tomei em

nome de todos os artistas do país.

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Vamos lá.

Quando o Sr. Victor Costa, diretor geral da Rádio Nacional, comprou a Rádio

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Mayrink Veiga, nós da Mayrink passamos a ser escalados para shows em casas

de pessoas ricas, gente a quem o Sr. Victor devia favores ou desejava

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obtê-los. O fato é que a gente chegava na tabela e estava lá:

- Fulano, Fulano, Francisco Anysio, Fulano, Altamiro Carrilho,

Jorge Veiga, Dolores Duran, Antonio Carlos – show na casa do Dr.

Não-Sei-O-Quê de tal, na rua Tal número tanto. 20 horas.

E a gente ia e fazia um show para o qual ninguém dava a menor

bola. Mas nem olhavam. Aquele show era uma coisa chata, que só servia para

atrapalhar a conversa deles. Mas fazer o show era uma ordem do patrão, e o

jeito qual era? Obedecer.

Pois bem.

Uma tarde estava na tabela o meu nome para um show numa casa da Lagoa

Rodrigo de Freitas. A gente lia o nome ali, escalado para esse serviço e

dava um frio que corria pela espinha. Era pedra!

Eu lembro do elenco escalado para aquele show: Jorge Veiga, Dolores Duran,

Aracy Costa, eu e (deixei de propósito para citar no final), o Antonio

Carlos – o pai da Glorinha Pires e maior comediante que eu conheci em toda a

minha vida.

Um locutor apresentava o show. E os cantores seriam acompanhados, como

sempre, pelo regional do Altamiro Carrilho.

Era pra chegar às oito horas, 15 para as 8 eu toquei a campainha,

abriu a porta uma governanta. Loura, já de uma certa idade, muito elegante,

um vestido cinza até os tornozelos, parecendo mais uma governanta de filme

inglês. Chiquérrima.

- Pois não.

- Eu sou artista do show.

- Ah, artista? Ali pela porta de serviço, por favor.

Eu fui lá e ela me ofereceu uma cadeira na copa. Daí a pouco

chegou a Dolores, chegou o Jorge, o Tuneca, o Altamiro com o regional dele.

Nós, os artistas, ficamos todos ali na copa.

A cozinheira serviu pra gente uns bolinhos de bacalhau e cerveja.

Ai veio a hora fatal: a hora do show. Nós fizemos aquela infelicidade que

era habitual, e fomos embora.

Quatorze anos depois, eu estava no Teatro da Lagoa com um show arrebentando

a boca do balão, um record que não tem como ser batido, porque eram oito

sessões por semana – (2ª, 3ª, 4ª, 5ª, 6ª, duas no sábado e duas no domingo),

eu fiz 15 meses, com uma média de público de 23 pessoas acima da lotação, ou

seja: todas as casas superlotadas.

Pois bom.

Numa noite lá o Ricardo Amaral que até hoje não sei se é um amigo irmão ou

um irmão amigo, me disse:

- Olha aqui, Chico Anysio: você não me marque nada para depois do

espetáculo, porque o Fulano de Tal viu o show, adorou, e fez um jantar em

sua homenagem. Olha aqui o endereço.

E botou um papel no meu bolso.

- Ta legal.

- Eu não vou poder ir, porque já tinha um compromisso, ele sabe disso, mas

me falou que ele mesmo vai tomar conta de você.

- OK, Amaral. Eu vou lá.

Depois do show eu peguei o papel, vi o endereço e fui pra lá, para o tal

jantar em minha homenagem.

Quando eu desci do carro e olhei...

Era aquela mesma casa de quatorze anos atrás. A mesma. Olha só.

Quatorze anos depois eu estava ali, de volta.

Eu então o que fiz? Tranqüila e modestamente, fui à porta de serviço e

toquei a campainha.

Abriu a porta a mesma governanta, com a mesma roupa cinzenta...

- Chico Anysio. O que é isso? Aqui é a entrada de serviço. A porta

da frente é ali.

Eu disse:

- Eu sei. É que há quatorze anos atrás eu vim aqui fazer um show a

mando do Sr. Victor Costa, toquei a campainha lá e a senhora mesma me disse

que artista entrava pela porta de serviço. Como eu continuo artista vou

entrar por aqui. Com licença.

Entrei e fiquei na cozinha. Nem à copa eu fui. Fiquei brincando

com a cozinheira, tirando tampa de panela, dando uma provadinha numa coisa e

noutra e as pessoas foram vindo, me chamando pra sala e eu não indo e

mexendo nas panelas e a festa passou para a copa e cozinha.

Minha mãe me dizia que isto foi uma indelicadeza minha, mas será

que foi?

Pra mim foi uma forra, porque eu já estava de saco cheio de ser discriminado

somente por ser artista.

Julguem vocês."

 

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