Reforma administrativa concentra cortes nos novos servidores
A proposta não mexe com estabilidade e salários dos atuais servidores, mas, para os novos funcionários públicos, haverá a eliminação de uma série de benefícios como licença-prêmio, adicional por tempo de serviço, aumentos retroativos e férias superiores a 30 dias por ano
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BRASÍLIA (Reuters) - O governo do presidente Jair Bolsonaro apresentou nesta quinta-feira sua Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da reforma administrativa que restringe a prerrogativa de estabilidade no emprego para os servidores públicos e acaba com uma série de benefícios, como férias de mais de 30 dias e aposentadoria compulsória como punição, mas as mudanças valerão apenas para novos funcionários.
A PEC também poupou categorias que são usualmente contempladas com esses condições. Isso porque o texto valerá para os servidores públicos dos três Poderes --Executivo, Legislativo e Judiciário-- na União, Estados e municípios, mas deixará de fora parlamentares, magistrados e militares.
Técnicos da equipe econômica justificaram que militares não são considerados servidores públicos. Já deputados, senadores, juízes, desembargadores, ministros dos tribunais superiores, procuradores e promotores são tidos como membros dos seus respectivos Poderes, e não seus servidores.
Assim, para entrarem no escopo da reforma, cada Poder terá que encaminhar uma proposta nesse sentido ou a PEC precisará ser ampliada por iniciativa do Congresso.
A PEC da reforma administrativa representa, na realidade, um primeiro passo de um projeto mais amplo do time do ministro Paulo Guedes, que envolve outras duas fases de mudanças, ainda sem data definida para serem encaminhadas ao Congresso.
O secretário especial adjunto de Desburocratização, Gestão e Governo Digital, Gleisson Rubin, defendeu que a PEC, que exige maior esforço de aprovação no Congresso, será o instrumento apenas do que realmente precisa ser modificado na Constituição.
Outros temas serão tratados via projetos de lei, emendou ele, e serão encaminhados aos parlamentares “tão logo” haja avanço na discussão da PEC. Por conta disso, o governo reconheceu que não há, de pronto, impacto fiscal com a proposta.
A economia para os cofres públicos virá, segundo Rubin, nas fases subsequentes. Em apresentação, o time econômico destacou que a segunda fase da reforma envolverá o envio de vários projetos, tocando em temas como consolidação de cargos, funções e gratificações, além de gestão de desempenho e diretrizes de carreira.
O projeto de lei complementar que regulamenta a possibilidade de desligamento do servidor por baixo desempenho, por exemplo, ainda está em fase de elaboração e “em breve” deve ser enviado à Presidência para posterior encaminhamento ao Congresso. Essa regra específica valerá também para os atuais servidores.
A última fase da reforma administrativa será um projeto de lei complementar do “novo serviço público”, estabelecendo marco regulatório para as carreiras, com “governança remuneratória” e direitos e deveres.
A apresentação da proposta do governo, que bate de frente com interesses de uma categoria que reúne cerca de 11,4 milhões de brasileiros em todo o país, representa uma inflexão na postura de Bolsonaro, que chegou a frisar há poucos meses que não enviaria ao Congresso uma reforma administrativa neste ano.
O ex-secretário especial de Desburocratização Paulo Uebel, inclusive, deixou o cargo em agosto alegando frustração com o ritmo da reforma, principal projeto sob batuta da secretaria. A PEC terminou sendo encaminhada às vésperas das eleições municipais, o que tende a ser um complicador adicional para sua tramitação.
A proposta veio após preocupações recorrentes sobre a situação das contas públicas do país mexerem com os mercados, e foi prometida por Bolsonaro para esta quinta-feira após reunião com líderes no Congresso realizada mais cedo nesta semana.
Os gastos com pessoal representam a segunda maior despesa orçamentária do governo federal, depois da previdenciária. Para 2021, estão previstos 337,3 bilhões de reais para essa rubrica, de um total de 1,517 trilhão de despesas primárias.
O presidente, contudo, fez questão de delimitar os efeitos da proposta somente para os funcionários que entrarem no quadro público após sua aprovação, buscando com isso diminuir a resistência dos servidores, categoria organizada e com forte poder de pressão junto aos parlamentares.
DETALHES
A PEC dará ao presidente poder para extinguir cargos, reorganizar autarquias e fundações e extinguir órgãos sem a aprovação do Congresso, com a condição de que as medidas não impliquem aumento de despesas.
O texto também propõe que o regime jurídico único dos servidores públicos dê lugar a cinco vínculos distintos, na prática mexendo com o critério de estabilidade.
De acordo com Rubin, desde 1988 todos os servidores públicos, independentemente da natureza da sua função, são estatutários, e consequentemente gozam de estabilidade.
Com a PEC, o regime jurídico único deixa de existir. A estabilidade será mantida apenas para carreiras típicas de Estado.
“No Ministério das Relações Exteriores todos são estáveis, do agente de portaria até o diplomata. E isso não faz sentido”, afirmou Rubin. Ele destacou que cada vez que havia concurso público o país assumia um compromisso de longo prazo, já que na média os servidores têm permanecido 28 anos em atividade, com mais 10 anos de aposentadoria e 11 anos de pensão, totalizando um vínculo médio de 59 anos.
Uma lei federal, posterior ao encaminhamento da PEC, definirá quais são as carreiras de Estado. Mas mesmo para esses cargos haverá diferença de tratamento em relação aos servidores atuais, que ingressaram no cargo logo após o concurso.
Pela PEC, haverá uma etapa intermediária entre as provas e o efetivo ingresso no cargo, o chamado vínculo de experiência. Esse período será de no mínimo dois anos. Depois, o servidor ainda terá que concluir um ano de trabalho para atingir a estabilidade.
Também por concurso público e com necessidade de cumprimento do vínculo de experiência, mas por um mínimo de um ano, haverá a possibilidade de contratação para cargo por prazo indeterminado, em que o servidor prestará funções sem que haja definição de tempo e sem que haja estabilidade.
Nesse caso, uma lei futura também estabelecerá em que hipóteses esse vínculo poderá ser desfeito. De acordo com Rubin, sua natureza não será celetista.
Assim, tanto o servidor de cargo exclusivo de Estado, quanto o servidor por tempo indeterminado ou aquele na situação de vínculo de experiência estarão sob o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS), dos funcionários públicos.
Nas duas situações em que há realização de concurso público, o período de vínculo de experiência não irá pressupor direito automático ao cargo. De acordo como governo, os mais bem avaliados ao final do vínculo de experiência é que serão efetivados.
Outros dois tipos de vínculos também foram criados pela reforma, estes sem exigência de realização de concurso público e que ficarão sob a esfera do INSS: o chamado vínculo por prazo determinado, que substituirá os atuais contratos temporários para atender situações de demandas temporárias e sazonais; e os cargos de liderança e assessoramento, que virão no lugar dos atuais cargos comissionados e funções simplificadas.
FIM DE BENEFÍCIOS
A proposta não mexe com estabilidade e salários dos atuais servidores, mas, para os novos funcionários públicos, haverá a eliminação de uma série de benefícios como licença-prêmio, adicional por tempo de serviço, aumentos retroativos, férias superiores a 30 dias por ano e aposentadoria compulsória como punição.
Em apresentação, a equipe econômica classificou essas possibilidades como distorções, incluindo no grupo a concessão de parcelas indenizatórias sem previsão legal, a progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço e a possibilidade de redução de jornada sem redução de remuneração.
Para os cargos típicos de Estado, contudo, haverá vedação da redução de remuneração e da redução de jornada.
A proposta do governo também flexibiliza regras de acumulação de cargos, permitindo que um servidor que não seja de uma carreira de Estado exerça funções acadêmicas ou na iniciativa privada, por exemplo, observada a compatibilidade de horário.
O texto não tratou da regulamentação do pagamento de remuneração aos servidores acima do limite constitucional. Hoje o teto é de 39,2 mil reais, mas muitos funcionários públicos recebem penduricalhos que elevam seus salários para além desse patamar.
Rubin afirmou que o assunto é matéria a ser regulada em projeto de lei e que já há várias propostas no Congresso que versam a respeito.
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