Meninas na política: a realidade no imaginário popular

Crianças do interior do país reconhecem como natural o novo papel da mulher no Brasil



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Um conhecido ditado diz que ao lado de um grande homem há sempre uma grande mulher. Eu creio nisso. A mulher, ao longo dos tempos participou ajudando, apoiando, cuidando da comida, da roupa, dos filhos, da estrutura familiar e do psiquismo do homem, para que ele se transformasse em astronauta, juiz, jogador de futebol, deputado, governador, rei, imperador. Este papel foi nobre e bonito. Mas creio, também, que estamos hoje numa nova fase.

Numa outra fase e num outro patamar. A consciência feminina de seus direitos e de seu poder no Brasil avançou muito com a ascenção da presidenta Dilma à Presidência da República. Até no imaginário de jovens e crianças do interior do país este novo papel da mulher é visto como natural.

Em visita a minha família no Maranhão, neste final de ano, perguntei a minha sobrinha de nove anos o que ela queria ser quando crescesse. Para minha surpresa ela respondeu sem titubear que queria ser a prefeita da cidade. Ao ser questionada sobre o porquê, ela novamente tinha na ponta da língua a resposta: para arrumar a saúde e a educação da nossa cidade.

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Se uma menina de nove anos já se preocupa com os hospitais e as escolas de sua cidade podemos imaginar o que esta nova juventude estará preparada para fazer daqui há 10 anos. De 1996 pra cá - ano da primeira eleição no país com garantia de participação mínima de 30% de mulheres - a presença das mulheres na disputa e na prática política aumentou de forma pequena mas bastante visível.

Em 1998 pela primeira vez na história do pais uma mulher, Thereza Ruiz, do pequeno PRN, foi candidata a presidência da República. Dois anos depois as capitais de seis estados passaram a ser dirigidas por mulheres, dentre elas, Marta Suplicy, venceu as eleiçoes para a prefeitura da maior cidade do país. Apenas dez anos mais tarde Dilma Roussef foi eleita presidenta do Brasil.

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A luta das mulheres pelo acesso ao Poder Legislativo ocorreu junto a outras por níveis de paridade no Executivo e Judiciário, com reivindicações de acesso igual a cargos de chefia no serviço público, assim como políticas afirmativas em grandes empresas (sobretudo multinacionais), em busca da valorização das mulheres e de características consideradas como "femininas" (subjetividade, emoção, capacidade relacional, etc.), uma vez que esses atributos passaram a ser reconhecidos como fator positivo para melhores relações e rendimento no trabalho.

O mesmo ocorreu no âmbito dos movimentos sociais, no sentido de se implantar cotas por sexo nas regras para a composição de suas instâncias de direção, garantido-as nos estatutos das entidades, a exemplo do que ocorreu na Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical, Confederação Geral de Trabalhadores (CGT), Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), União Nacional dos Estudantes (UNE), dentre outras.

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É necessário agora que nós homens percebamos esta nova realidade e passemos a entender melhor e a valorizar o papel da mulher. Pequenos epsódios em nosso cotidiano nos mostram que estamos ainda trilhando apenas o início de um longo caminho.

Na última eleição, uma senhora de uns 50 anos, acompanhada de sua filha de cerca de 30 anos, disse-me que na sua casa todas as mulheres haviam decidido votar numa candidata mulher mas que seu marido não podia saber da decisão que haviam tomado. Isso para mim foi significativo. Estamos no século XXI e ainda existem maridos que não podem saber que a mulher, a filha, a mãe e a sogra vão votar em uma mulher.

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Mesmo nos poderes constituídos, até pouco mais de uma década, não se tratava a mulher com a devida consideração. Um relato interessante da vereadora Eni Fernandes, do PT de São José do Rio Preto, ilustra a situação. Ao ser empossada, em 1996, recebeu uma carteira onde estava escrito: Poder Legislativo. Vereador Eni Fernandes. Ela não aceitou a carteira e fez um requerimento pedindo ao Presidente da Câmara que imprimisse nova carteira com os dizeres vereadora Eni Fernandes.

No documento da diplomação a mesma situação. Estava escrito: Vereador Eni Fernandes. Ela teve que fazer um requerimento ao Tribunal Regional Eleitoral do Estado de São Paulo solicitando mudança. O Tribunal respondeu que não havia impressos destinados a mulheres, mas que, a partir da próxima eleição, seria feita a distinção.

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No Congresso Nacional ao serem eleitas as primeiras senadoras e deputadas elas tiveram que lutar para a instalação de banheiros femininos ao lado do plenário das duas casas.

Outro aspecto que deve ser lembrado é o da dificuldade encontrada pela mulher política dentro de casa, com maridos que questionam suas agendas cheias e se negam a dividir qualquer tarefa doméstica. Companheiras na política me contam que a intenção delas não é inverter paradigmas mas convencer os maridos a realizar tarefas prazerosas que elas sempre fizeram como brincar com os filhos, fazer os deveres da escola, cozinhar, etc. Isso facilitaria dividir com eles espaços que o mundo oferece normalmente aos homens.

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Algumas experiências mostram ainda que mulheres candidatas dificilmente conseguem concorrer segundo as mesmas regras dos homens candidatos. O partido muitas vezes não reconhece vantagens de intenções de voto para a candidata e algumas vezes, por não ter um candidato homem, prefere esvaziar a candidatura feminina, propondo alianças com outros partidos.

Como dificuldades encontradas pelas mulheres para uma maior participação na política, podemos lembrar ainda a falta de apoio financeiro e de recursos materiais para as suas campanhas por parte dos partidos, colocando-as, também nesse momento, em situação de desvantagem em relação aos homens.

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O número de mulheres no poder não mudou de forma relevante, como poderia ter ocorrido, mas a forma de fazer política está mudando. Parece haver unanimidade na crença de que as mulheres são mais "sensíveis" ao social. Ou, antes disso, que existiria uma diferença entre a política feita pelos homens e a política feita por mulheres, sendo que, no cerne desta diferença, estaria a sensibilidade.

Os argumentos sobre a sensibilidade feminina nos leva a pensar na reflexão feita pelo historiador Joan Scott sobre a luta pela paridade na França e seus efeitos concretos no governo do primeiro ministro socialista francês Lionel Jospin, que no período 1997/2002 teve mulheres a frente de ministérios escolhidos como prioritários, entre eles os de Ação Social, Justiça, Meio Ambiente e Educação.

O exemplo francês, para Scott, além de ser emblemático do compromisso do Partido Socialista com a implantação da lei da paridade no Executivo e Legislativo, mostra como a presença das mulheres em cargos chaves e valorizados estimula positivamente o imaginário a respeito das mulheres na política.

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