Factóide de celas VIP gera desmentidos de juízes
Publicado no jornal Correio Braziliense, boato de que ampliação do Complexo de Progressão Penitenciária (CPP), no SIA, abrigaria celas vips para condenados na Ação Penal 470 gera desmentidos oficiais; juízes Afonso Álvares e Ângelo Pinheiro, do Tribunal de Justiça do DF, atestam que informações "não condizem com a realidade"; memorial da obra aponta cárceres normais, com água fria; rede de intrigas acionada para atacar GDF espalhou que José Dirceu e Waldemar Costa Neto iriam para lá desfrutar de mordomias
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247 – Um boato que foi parar nas páginas do jornal Correio Braziliense ganhou, até ser dissipado pela manifestação formal de dois juízes do Tribunal de Justiça do DF, ares de escândalo na capital federal. Noticiou-se que uma ampliação do Centro de Progressão Penitenciária, no setor de Indústria e Abastecimento, comportaria celas vips para abrigar réus que saírem condenados na Ação Penal 470, o chamado mensalão. A nova área do presídio estaria sendo levada a toque de caixa para terminar a tempo de poder ser utilizada pelos mais notáveis, entre eles o ex-presidente do PT José Dirceu e o deputado federal Waldemar Costa Neto. As novas instalações da cadeia equivaleriam às de bons hotéis, com cama grande e confortável, ducha forte e quente e, quem sabe, ar condicionado.
Nada disso, porém, é verdadeiro. Mais que imaginação fértil, entrou em ação, neste caso, a conhecida rede de intrigas existente da capital federal. Uma máquina que usa o velho método da repetição e ampliação de mentiras ao ponto de parecerem verdades. O atingido, mais uma vez, deveria ser o governo do Distrito Federal, que estaria bancando a obra para agradar ao PT.
A construção do chamado terceiro galpão do CPP, obra que serviu de base para o rumor, está projetada desde 2010, ano em que o Distrito Federal teve quatro governadores, entre eles José Roberto Arruda e Rogério Rosso. Dois anos, portanto, antes do início do julgamento da Ação Penal 470 . E um ano antes do início da atual gestão no GDF.
Em agosto de 2011 foi iniciada a elaboração do projeto arquitetônico. Exatamente um ano, portanto, antes do início do julgamento, que começou em agosto de 2012. O pedido de crédito suplementar para a obra foi feito em abril de 2012. Portanto, quatro meses antes do início do julgamento. O processo de licitação iniciou-se em maio de 2012. Em junho, começou a ser elaborado o edital para a concorrência.
Basta uma rápida pesquisa no noticiário dos primeiros dias de julgamento da Ação Penal 470 para se verificar que, naquele momento, os advogados dos condenados tinham uma expectativa otimista com relação ao que viria a ser julgado. Era comum a repetição de que não havia provas para a condenação. Mas, na mente dos que dão curso ao factóide, o GDF já teria a expectativa de condenações. Quando, afinal, a licitação foi aberta, em novembro de 2012, o julgamento ainda não havia terminado e não estava concluída a fase de estabelecimento das penas.
A rigor, na verdade, até hoje o julgamento não terminou. Ainda que houvesse um suposto esforço do Governo do DF para abrigar os mensaleiros petistas no CPP, tal situação esbarraria na fixação das penas para que, de fato, os condenados ocupem aquela área. Para ali, vão somente aqueles que são condenados pela Justiça a penas em regime semiaberto, ou seja, aquele em que a pessoa só dorme na prisão. Tal regime é reservado àqueles condenados a um tempo inferior a oito anos de detenção.
Dos condenados que são filiados ao PT, apenas um – José Genoino, condenado a 6 anos e 11 meses – tem pena para regime semiaberto. José Dirceu (condenado a 10 anos e 10 meses), Delúbio Soares (8 anos e 11 meses) e João Paulo Cunha (9 anos e quatro meses) estão condenados a prisão em regime fechado. Não iriam para o CPP.
Ainda assim, não há qualquer garantia de que, presos, os condenados cumprirão pena em Brasília. Ainda que José Genoino venha a ocupar um espaço no CPP, não há nada de "VIP" na cela. Como qualquer outra, ela não tem água quente – apenas fria. Não há também nenhuma outra regalia.
Erradamente, os produtores do factóide imaginaram que os condenados iriam para quatro novas salas construídas. Na verdade, essas salas já estão ocupadas por funcionários públicos do sistema: um núcleo de informática, um núcleo de inteligência e um paiol para armas e munições.
Já está decidido que, depois de expedido o mandado para o cumprimento das penas, os condenados serão levados para o Centro de Detenção Provisória, que fica no Complexo Penitenciário da Papuda. Os condenados em regime fechado ou cumprirão pena na própria Papuda ou serão recambiados para presídios em suas cidades de origem. Para os que cumprem pena em regime semiaberto, somente depois de deferido um pedido de trabalho externo é que eles seriam transferidos para o CPP. Mesmo assim, ficariam em uma ala de um dos galpões, que é destinada a presos considerados vulneráveis: policiais, empresários, políticos, pessoas que podem ser vítimas de extorsão ou tornadas reféns numa rebelião. Essa logística já é assim há 16 anos.
O factóide construído é tão absurdo que mereceu na quarta-feira (4) uma manifestação por meio de nota dos dois juízes do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) que coordenam o projeto de mutirão carcerário do Conselho de Justiça, Afonso Álvares e Ângelo Pinheiro.
"As informações até então publicadas, ao meu sentir, não condizem com a realidade. A um porque as reformas e construções (...) não decorrem de interesses específicos, mas sim de uma necessidade histórica e fundada no concreto déficit de vagas no sistema prisional local", afirma Ângelo Pinheiro, na nota. "Não há sequer indícios de que serão construídas alas especiais, seja sual for sua destinação", prossegue ele. "Por fim, há que se pontuar que, independentemente da existência ou não de eventuais alas especiais, caberá exclusivamente ao órgão judiciário com competência para a execução penal, no caso concreto, definir o local em que qualquer sentenciado expiará sua pena", conclui.
Abaixo, o memorial da ampliação do CPP:
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