“Estupidez administrativa”: congressistas rejeitam uso de recursos da educação para substituir Bolsa Família

“Políticas de proteção social são necessárias e urgentes no Brasil. Contudo, querer bancar isso retirando recursos da educação é um absurdo e uma imensa estupidez administrativa”, disse vice-líder do PCdoB na Câmara, deputado Márcio Jerry (MA)

Ministro da Economia, Paulo Guedes, durante coletiva de imprensa após reunião. 28 de setembro de 2020
Ministro da Economia, Paulo Guedes, durante coletiva de imprensa após reunião. 28 de setembro de 2020 (Foto: Alan Santos/PR)


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Por Nathalia Bignon, para o 247 - O anúncio de que o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pretende usar parte dos recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) e de precatórios para bancar o novo programa social que substituirá o Bolsa Família mobilizou vozes dentro e fora no Congresso.

O tema, inclusive, é tido por muitos parlamentares como o principal assunto desta terça-feira (29). A possibilidade do uso de verbas do Fundo para financiar o benefício, que deverá substituir o auxílio emergencial pago durante a pandemia, foi apresentada pela equipe econômica durante pronunciamento no Palácio da Alvorada, após reunião com ministros e líderes da base aliada na manhã da segunda (28). O Fundeb é, atualmente, o principal mecanismo de financiamento da educação brasileira.

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A criação da renda social vem sendo apontada como a principal a estratégia de Bolsonaro para criar uma marca de sua gestão que garanta o crescimento da sua popularidade para a reeleição, em 2022. Internamente, o projeto vem sendo tratado como “Renda Brasil” ou “Renda Cidadã”. Não houve, porém, a divulgação do valor que cada futura família no programa deverá receber com o novo benefício.

Vice-líder da bancada do PCdoB na Câmara, o deputado federal Márcio Jerry (MA) classificou como “estupidez administrativa” a ideia de retirar fundos de uma área essencial ao desenvolvimento do país para destinar a outra igualmente importante.

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“Políticas de proteção social são necessárias e urgentes no Brasil. Contudo, querer bancar isso retirando recursos da educação é um absurdo e uma imensa estupidez administrativa. Bolsonaro quer tirar 5% do Fundeb que recentemente aprovamos no Congresso Nacional. Não aceitaremos”, garantiu.

Armadilha

Líder do PSB na Câmara, o deputado Alessandro Molon (RJ) comparou o uso de precatórios a um dos tipos mais comuns de endividamento, aquele que usa cartões de crédito. “O que Bolsonaro quer fazer com os precatórios é parecido com pagar só parte da fatura do cartão de crédito: deixar sempre um pedaço para o ‘mês que vem’, formando uma bola de neve de dívidas que podem se arrastar por anos. Ou melhor, por governos. Não devemos cair nessa armadilha!”, previu o deputado carioca.

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Companheiros de partido, os deputados Glauber Braga (PSOL-RJ) e Marcelo Freixo (PSOL-RJ) não pouparam nas condenações do governo. “Bolsonaro não quer trabalhar. Mais uma vez ele foge à responsabilidade e coloca a culpa nos outros. Cabe ao presidente propor uma solução pra continuidade da renda básica. Cabe a ele conduzir o país na pandemia, mas ele, como sempre, lava as mãos. É o pior presidente do mundo”, disse Freixo.

“Essa de retirar dinheiro do Fundeb para financiar outro programa de renda vai na linha de desmontar o Estado nas garantias sociais pra ampliar negócios particulares. Não esqueçam que Paulo Guedes ganhou muita grana com educação privada antes do ministério; transações bilionárias”, ponderou Braga.

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Taxação dos super-ricos

Economista de formação, o deputado federal Reginaldo Lopes (PT-MG) foi um dos congressistas a defender o andamento de projetos relacionados à tributação dos super-ricos. “Há várias formas de fazer justiça e garantir uma renda básica universal para os brasileiros e brasileiras. A regulamentação das grandes fortunas, a revisão de incentivos fiscais, tributários e creditícios e a taxação de lucros e dividendos, o que só o Brasil e a Estônia não fazem”, analisou.

Crítico ao governo, Camilo Capiberibe (PSB-AP) disse que o possível remanejamento é mais uma prova da repulsa do presidente à parcela mais pobre da população. “Bolsonaro nem disfarça seu ódio ao povo brasileiro e o servilismo aos muito ricos. As ‘reformas’ arrancam de quem paga muito para prometer migalhas aos miseráveis. Ameaça cortar na educação do povo mais pobre pra ampliar a miséria e a desigualdade social”, comentou o deputado.

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Vai ter impeachment?

A presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) perguntou se a ‘pedalada’ econômica levaria ao fim do governo. “Ainda sobre o renda cidadã que Bolsonaro quer criar. Isso é que é ‘pedalada’ nos precatórios. Guedes está criando um novo conceito de contabilidade criativa’. E pegar dinheiro do Fundeb é um absurdo total. Aliás, é uma ‘contabilidade destrutiva’. Vai ter impeachment?!”, ironizou, em referência à justificativa que vigorou no processo que levou à destituição da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016.

Já o deputado Túlio Gadelha (PDT-PE) definiu o movimento como mais uma “presepada” governamental. “Nova presepada de Bolsonaro: tentar desviar dinheiro do Fundeb pra bancar o seu programa Renda Cidadã. Querem usar os recursos que servem pra pagamento de professores e melhoria de condições de ensino pra driblar o teto de gastos. Porque não revogar o teto ou taxar grandes fortunas?”, questionou.

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Marca do populismo

No senado, o líder da oposição, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que a tática é mais um exemplo do populismo que tem marcado a gestão de Bolsonaro. “Num momento em que o MEC [Ministério da Educação] lavou as mãos e deixa 50 milhões de brasileirinhos sem educação básica, o governo quer ‘tesourar’ recursos da educação para bancar o Renda Brasil: isso é mais que tirar dos pobres para dar aos paupérrimos! É sacrificar o futuro do país a troco de populismo barato!”, sentenciou.

Presidente nacional do Cidadania, Roberto Freire, foi taxativo ao dizer que a equipe econômica está à altura de Jair Bolsonaro. “Ué. Não era um governo liberal, inovador, reformista, formado por técnicos, que ia enterrar a social-democracia? Pra pagar o auxílio só tem essas alternativas? Dar calote, roubar o Fundeb, recriar CPMF? Poucas vezes vimos equipe econômica tão incompetente. À altura de Bolsonaro”, definiu.

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Entre os aliados, também não faltaram críticas

E sobrou crítica até mesmo de membros da base aliada do governo. O ex-tucano, o senador Álvaro Dias (Podemos-SP) defendeu a demissão de quem propôs a medida ao mandatário. “Quem sugeriu ao presidente Bolsonaro a utilização dos recursos dos precatórios e do Fundeb (educação) para bancar o programa que substituirá o Bolsa Família, deveria ser demitido. Tenho dificuldade de acreditar que seja verdade”, afirmou.

O deputado Fábio Trad (PSD-MS) insinuou o que todos desconfiam. “Dinheiro do Fundeb é para financiar educação. Fora disso, é para financiar reeleição. Governo precisa pensar nas próximas gerações e não nas próximas eleições.”, opinou.

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