Acampamento mostrou unidade e indígenas vão intensificar pressão contra retrocessos, diz cacique

Apesar de muitas delegações já terem deixado a capital federal, centenas de indígenas permanecerão no Distrito Federal por pelo menos mais uma semana. É o que garante o cacique Agnaldo Pataxó Hã-Hã-Hãe, coordenador do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoíba)

Agnaldo Pataxó Hã-Hã-Hãe e Acampamento Luta pela Vida em Brasília
Agnaldo Pataxó Hã-Hã-Hãe e Acampamento Luta pela Vida em Brasília (Foto: Arquivo Pessoal | @mvelos2/Mídia NINJA)


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Por Pedro Rafael Vilela, de Brasília
Edição: Claudia Correia

Uma das maiores mobilizações indígenas das últimas décadas, o Acampamento Luta pela Vida, que reuniu 7 mil de indígenas de mais de 170 etnias de todo o país essa semana, em Brasília, deve continuar em atividade permanente para acompanhar o julgamento da tese do marco temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), e também o avanço do Projeto de Lei 490/2007. Apesar de muitas delegações já terem deixado a capital federal, centenas de indígenas permanecerão no Distrito Federal por pelo menos mais uma semana. É o que garante o cacique Agnaldo Pataxó Hã-Hã-Hãe, coordenador do Movimento Unido dos Povos e Organizações Indígenas da Bahia (Mupoíba). A delegação baiana, com a presença de 28 povos diferentes, foi a mais numerosa do acampamento.

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"Totalizamos quase 800 parentes, chegando a quase 1.000, se consideramos aqueles que vieram de forma autônoma. Isso foi muito importante para a Bahia e serviu para que os nossos parentes baianos, de mais de 28 etnias, dialogassem entre si". Em entrevista, Agnaldo destaca que o acampamento propiciou um momento de grande diálogo e aliança entre os povos, com o debate de estratégias e fortalecimento da unidade. "Nós conseguimos dar uma visibilidade muito boa sobre o que tem acontecido com os nossos povos", celebra.

O STF analisa um processo de repercussão geral que vai definir a validade ou não da exigência de comprovação da posse e ocupação do território reivindicado pelos povos tradicionais antes do dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. O julgamento, que deveria ter começado na última quarta-feira (25), foi adiado para a semana seguinte, quando deve ser retomado, provavelmente no dia 1º de setembro.

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Na Bahia, o marco temporal poderá ser desastroso no reconhecimento do direito originário dos povos indígenas às suas terras, atingindo a maior reserva preservada de Mata Atlântica do Nordeste, no território Pataxó, no Extremo Sul do estado. Relatório da Associação Nacional de Ação Indigenista (Anaí), que mostra o andamento dos processos de demarcação em 10 estados brasileiros, não deixa dúvidas. O levantamento inclui todas unidades da federação do Nordeste, com exceção do Maranhão, que faz parte da Amazônia Legal, além de Minas Gerais e Espírito Santo. Das 224 áreas listadas, mais de 100 estão sem qualquer providência regulatória adotada pelo governo federal. Apenas 16 são terras indígenas com processos concluídos ou área homologada e pouco mais de 40 estão em fase de estudos ou possuem a área delimitada. 

Porém, mesmo que o STF derrube a tese do marco temporal, ela ainda pode sobreviver se o PL 490 fora aprovado. O texto consolida esse entendimento e já foi aprovado na principal comissão da Câmara dos Deputados, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Agora, aguarda votação em plenário. O projeto, defendido arduamente por ruralistas e pela base bolsonarista, também facilita a grilagem de terras e o aumento da exploração de florestas e áreas protegidas, já que passa permitir a legalização de empreendimentos em áreas de reserva como garimpos ilegais e hidrelétricas.

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"O PL 490 e o marco temporal não afetam apenas nossa vida, eles acabam com o artigo 231 da Constituição Federal. Se você analisar, em nosso país, onde o meio ambiente é mais preservado é dentro dos territórios indígenas", aponta o cacique baiano.

A seguir, confira os principais trechos da entrevista:  

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Qual avaliação que as lideranças indígenas de todo o país fazem do Acampamento Luta pela Vida? Apesar do julgamento não ter sido concluído, o saldo pode ser considerado positivo?

Foi muito importante esse momento nosso nesse Acampamento Luta pela Vida. Quase 7 mil parentes e, durante todo esse tempo, houve diálogo e aliança entre os povos, montagem de estratégia contra esse ambiente de negação dos nossos direitos. Foi muito bom para definirmos estratégias de enfrentamento ao governo atual, no Congresso Nacional, e contra as forças reacionárias. Nós conseguimos dar uma visibilidade muito boa sobre o que tem acontecido com os nossos povos. A garantia dos nossos direitos foi mais publicizada, a nível nacional, e até a nível internacional. Com isso, a gente espera, daqui pra frente, intensificar nossa permanência em Brasília. Acreditamos que vamos influenciar o Supremo Tribunal Federal no julgamento e mobilizar ainda mais nosso povo para o enfrentamento do PL 490.

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Como está a expectativa para o julgamento da semana que vem? 

Na próxima semana, vamos continuar mobilizados. Talvez não tenhamos tantos parentes como tivemos aqui essa semana, mas vai ter uma comitiva muito boa aqui ainda. Muitos continuam em Brasília, outros vão vir, mas vamos mobilizar todo país, com manifestações, ações e protestos. A esperança é que o STF acabe de uma vez com essa ideia de marco temporal, para que a gente possa concentrar esforços na mobilização contra o PL 490. 

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Qual balanço você faz especificamente sobre a participação dos povos indígenas da Bahia? Qual foi a representatividade dessa participação?

Dessa vez, a Bahia foi a maior delegação do Acampamento Luta pela Vida. Nós articulamos essa vinda tendo à frente o Mupoíba, que articula mais de 70% dos povos indígenas baianos. O Mupoíba tirou como estratégia articular também outros movimentos, como o Miba, as bases da Apoinme, as federações, os conselhos, todos foram articulados, mesmo aqueles que não estão na base do Mupoíba. Totalizamos quase 800 parentes, chegando a quase 1.000, se consideramos aqueles que vieram de forma autônoma. Isso foi muito importante para a Bahia e serviu para que os nossos parentes baianos, de mais de 28 etnias, dialogassem entre si. Uma comissão de 100 lideranças deve continuar em Brasília para a semana que vem. Vamos manter protestos em pontos estratégicos da Bahia  

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O que a população em geral, os não-índios, pode fazer para colaborar com essa luta? Por que a luta dos povos indígenas é também uma luta que interessa toda a sociedade?

Com essa manifestação, nós acreditamos que a população baiana, brasileira e internacional possa nos ajudar. Nós lutamos por todos, na preservação do meio ambiente, a preservação da vida, e da vida de todo o planeta. Precisamos que a sociedade não-indígena nos apoie. Além de ajudar nossos parentes e caciques chegarem até Brasília, pode sim ajudar nos meios de comunicação, na internet, postando apoio. E, quem sabe, em alguns pontos estratégicos, fazendo protestos, alguma fala demonstrando visibilidade e apoio à luta dos povos originários. O PL 490 e o marco temporal não afetam apenas nossa vida, eles acabam com o artigo 231 da Constituição Federal. Se você analisar, em nosso país, onde o meio ambiente é mais preservado é dentro dos territórios indígenas.

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