A federalização do Distrito Federal

A melhor tradução do equilíbrio é, paradoxalmente, uma desigualdade elementar: este DF é o recinto da Capital Federal



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Abre-se uma crise cada vez maior no Distrito Federal (DF), que diz respeito à sua própria natureza, “distrital e federal“ – que se revela, para nosso espanto, dual. Há mesmo dois componentes a considerar, e pelo menos UMA forma de equilíbrio sustentável. Esse crescente abismo entre o papel precípuo do DF e o que realmente está a acontecer em seus padrões de organização governamental, de ocupação territorial, de impacto regional, depende, para a sua compreensão, de sério exame do que realmente interessa ao Brasil “Federal“, em primeiro lugar.

“Distrito Federal“ é uma frase composta por um componente FEDERAL, que é “finalístico“, pois essa é a sua função essencial: abrigar a Capital da Federação, dessa República Federativa do Brasil. O outro componente, o DISTRITO, é contingente, instrumental, meio: é função acessória. No entanto, a lógica contida na expressão oculta algumas equações possíveis, a saber:

FEDERAL > DISTRITAL;

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FEDERAL = DISTRITAL;

FEDERAL < DISTRITAL.

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Devemos entender que “os fins determinam os meios“. Concordam com isso? Se essa é a racionalidade da conduta do Estado brasileiro, a expressão que melhor traduz o equilíbrio para esta nossa unidade especial da Federação é a primeira (FEDERAL > DISTRITAL). A melhor tradução do equilíbrio é, paradoxalmente, uma desigualdade elementar: este DF é o recinto da Capital Federal; a razão precípua para a criação do Distrito Federal é o abrigo de sua Capital e, nela, das funções de ação e coordenação dos três poderes da República.

A grande mudança nessa inequação foi criada pela “Constituição Cidadã“ de 1988, que estabeleceu a eleição do Governador do Distrito Federal, a autorização para a instalação de sua Câmara Legislativa, entre outras medidas dessa “Autonomia Política“ que gozamos, de forma imprudente, corrupta, descontrolada.

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A Constituição Cidadã foi movida pelo ideal de um “DF Livre e Democrático“, por uma primária aversão a tudo o que fosse associado à Ditadura Militar. Essa autonomia política revelou-se um tiro no pé de todos, menos dos espertalhões que avançaram diante de todos, tomando o controle do DF para si, logrando todos aqueles bem-intencionados democratas. Dá vontade de rir da ironia, dessa inesperada “virada de jogo“, se não fosse o caso de chorar muito.

No DF, a democracia foi feita de tola, graças ao extraordinário episódio que leva José Sarney a se tornar o Presidente da República (1985-1990) e, por sua vez, nomear seu correligionário (e vizinho de cerca rural) Joaquim Roriz como governador “biônico“ (1988) com a missão de preparar a primeira eleição para Governador do DF.

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Roriz, como se sabe, preparou avidamente a sua própria eleição e, desde então, a política e a administração pública do Distrito Federal têm o “Padrão Roriz de Qualidade“ - pois foi governador ELEITO por mais três vezes: 1990-1994, 1998-2002, 2002-2006, e quase retorna em 2010.

Contudo, se Roriz imprimiu um péssimo caráter a esse início de Autonomia Política, a esses seus primeiros 22 anos, não se pode atribuir apenas a um político ou ao seu sequioso grupo político, a responsabilidade pela perda de controle, pela degeneração do Distrito Federal: ela é ESTRUTURAL, e a situação da Autonomia Política necessariamente levaria ao estado de caos em que nos encontramos, por melhor qualificados que fossem seus Governadores Eleitos.

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Vejam, nesse sentido, o exemplo de Cristovam Buarque, que não deixou nenhuma marca duradoura, nem sequer investigou Roriz e os grileiros que detonaram nosso território com as centenas de “Condomínios Irregulares“, ou criminosos: Cristovam não fez nenhuma “correção“ realmente séria. Foi uma enorme decepção, como dizemos nas ruas.

A verdade é que se há um Governo do Distrito Federal, seu papel é dar todo o apoio necessário para que a Capital da República funcione bem, com perfeição. Para cumprir esse papel, o Brasil comemora pelo menos 52 anos de generosidade com Brasília: são bilhões de reais despejados aqui, anualmente, para a “manutenção da Capital“ e de seu ávido Governo. O Brasil agua um deserto de realizações dignas do nome. Brasília se tornou refém de criminosos.

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Contudo, esse papel “federal“ de Brasília já foi esquecido há décadas, tanto pelo Governo do DF quanto pelo próprio Governo Federal, que não se impõe em meio à bagunça administrativa e territorial de Brasília. É uma casa em que ninguém manda, e onde todos parecem mandar. Quem lucra com o desconcerto? Os grileiros, os oportunistas, os aventureiros, os corruptos e corruptores. Esses são os principais agentes das políticas públicas do Distrito Federal, na atualidade e por todo o episódio da Autonomia Política. 22 anos de grilagem e sucateamento, de depredação ambiental e corrupção da máquina pública.

Com o Governo Federal “de costas para Brasília“ (“Eu É Que Não Vou Me Meter Nesse Rolo“, dizem todos os presidentes da República, desde Collor), o Governo do DF virou um câncer: perdeu totalmente a sua finalidade de mantenedor da Capital Federal, e virou outra coisa – ou várias outras coisas, como um grande balcão de negócios desta terra de imenso valor imobiliário, onde a “pior perambeira“ vale uma fortuna por metro quadrado. Um câncer que não pára de crescer.

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Essa pérfida associação de um governo federal transigente e de um governo local transigentíssimo (apesar de seus “objetos de transigência“ serem muito diferentes), leva a um padrão de crescente deterioração: moral, territorial, ambiental, entre outras dimensões que devem ser URGENTEMENTE diagnosticadas.

Mas, por QUEM? Quem teria a vontade política para recolocar, no Distrito Federal a sua especialíssima “inequação do equilíbrio“, ou FEDERAL > DISTRITAL?

Bem, a própria inequação contém a solução da questão proposta.

Prof. Frederico Flósculo Pinheiro Barreto – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UnB.

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