O desabafo do deputado Jean Wyllys

Em entrevista ao Bahia 247, parlamentar baiano, mas eleito pelo Rio, revela as ameaas que sofreu por ter abraado a causa LGBT



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Rebeca Bastos_Bahia247 - Jean Wylliys é deste tipo de gente que enxerga os obstáculos e as pedras no caminho e logo cria uma estratégia de superá-los e conquistar seu objetivo final. O que ele quer? Respeito aos direitos humanos e às diferenças que distinguem um indivíduo do outro. Para tanto, não importa se está como redator nas páginas de um jornal, na tela da tevê interpretando a si mesmo num reality show ou no parlamento atuando como deputado federal eleito (PSol-RJ). No entanto, sua atuação em busca dos direitos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transgêneros – os LGBTs – o levou a um caminho inesperado no sistema democrático: a ameaça à sua própria vida.

Embora esteja exercendo o seu primeiro mandato Jean já fez história: é o primeiro deputado federal brasileiro, assumidamente homossexual, a abraçar a causa LGBT. E o trabalho executado por ele tem incomodado bastante a ala conservadora da política nacional. São apenas oito meses no cargo, mas já rolou muito babado por aí.

Jean é um dos principais defensores do projeto Escola sem Homofobia (que foi apelidado de Kit Gay), do projeto de criminalização da homofobia, e é o proponente da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que estende aos homoafetivos o direito ao casamento civil. Pelo engajamento, hoje ele é um dos favoritos a receber o prêmio Congresso em Foco de melhor parlamentar do ano. Seus principais concorrentes nesta disputa são os experientes Chico Alencar (PSOL-RJ), ACM Neto (DEM-BA) e Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

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Jogo sujo

A vida não é feita apenas de conquistas positivas, e Jean sabe bem disso. A defesa da causa LGBT também tem um preço alto e rende a Jean ameaças de morte. O parlamentar já recebeu várias, por telefone e até pelo Twitter. Entre alguns impropérios descabidos, seus ofensores dizem:

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- É por ofender a bondade de Deus que você deve morrer

- Cuidado ao sair de casa, você pode não voltar

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- A morte chega, você não tarda por esperar

Mas Jean não se espanta. Já recebeu ameaças em outras ocasiões. "Acho que são feitas mais para intimidar; no entanto, já tomei as providências cabíveis", avisa. Com o objetivo de se proteger, Jean prestou queixa na delegacia de crimes virtuais e tenta localizar os IPs de onde partiram as ameaças. Também já comunicou as ameaças à ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário.

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Jean tem como um dos principais opositores o deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ), com quem protagoniza um confronto direto acerca do projeto Escola sem Homofobia (que ele deu o apelido de Kit Gay). "Bolsonaro e seus aliados políticos fazem um jogo sujo para conseguir atingir seus interesses", ataca. Ele assegura que o projeto Escola Sem Homofobia não tem o objetivo de "transformar crianças em gays", como seus opositores sugerem. O material é voltado apenas para adolescentes e jovens acima de 14 anos que já estão no ensino fundamental e médio.

Mas todo estardalhaço em torno das questões da homossexualidade remetem à fala de Dom Quixote, no clássico de Cervantes:

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- Os cães ladram, Sancho, é sinal de que estamos avançando

Para "sair do romantismo dos direitos humanos", o deputado também se engajou na Comissão de Finanças e Tributação. "Violação de diretos humanos no Brasil é uma questão de orçamento", justifica, lembrando que 46% do orçamento da União é usado para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública. Jean também compõe a Comissão de Legislação Participativa da Câmara, que visa aumentar a participação da sociedade civil na legislatura, e também está nas frentes parlamentares pela Igualdades Racial e pela Cultura.

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Com uma religiosidade aflorada que contém elementos da Igreja Católica (da qual fez na infância e adolescência quando pertencia às pastorais da Juventude Estudantil e da Juventude do Meio Popular), das religiões de matriz africana e uma pitada de esoterismo, Jean atribui aos astros parte da motivação que o fizeram tomar a decisão de se candidatar.

Jean lembra que o despertar para uma carreira política veio através de dois convites que o fizeram pensar. O primeiro convite foi de ACM Neto, que o convidou para sair como candidato a vereador pelo DEM. A proposta foi recusada pois Jean diz que não tem identificação ideológica com o partido nem com suas "práticas carlistas". A segunda proposta, foi de Heloísa Helena (presidente do PSol). "Relutei a princípio, mas com o tempo percebi que com a política eu poderia continuar exercendo o meu ativismo de uma forma mais eficaz".

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Com orçamento de campanha de apenas R$ 28 mil (insuficiente para produzir cartazes ou adesivos ), o deputado conseguiu chegar à Câmara com uma campanha feita nas redes sociais. Foi o segundo mais votado do partido, ficando atrás de Chico Alencar, cuja expressiva votação garantiu a eleição de Jean.

Ainda Lembro

Hoje como deputado federal, Jean pode gozar de certos direitos distantes para a maioria da população brasileira como auxílio paletó, auxílio moradia, auxílio combustível, auxílio correio e telefone, carros a disposição, apartamento funcional 13°, 14° salário. Mas nem sempre foi assim. Jean conta a equipe do Bahia 247, que foi recebida em seu apartamento no Centro de Salvador, que já viveu com sua família abaixo da linha da pobreza. "Foram tempos difíceis, todo mundo lá em casa tinha que trabalhar desde cedo. Passamos fome", relembra. Jean que assim como seus outros cinco irmãos sempre trabalhou para ajudar nas despesas da família.

Natural de Alagoinhas, cidade a 107 km de Salvador, Jean é o quarto filho da tímida e orgulhosa dona Inalva, mulher forte e batalhadora que sempre incentivou o estudo aliado ao trabalho para conseguir uma vida melhor. "Quando terminei o ensino médio, minha mãe achava que já bastava de estudo, mas eu precisava seguir adiante". E seguiu. Passou no disputado vestibular da Universidade Federal da Bahia e cursou jornalismo. Depois, seguiu para o mestrado e como idéia de doutorado queria estudar a Antropologia do Consumo de Mídia. Foi aí que surgiu a ideia de fazer um estudo de campo no Big Brother Brasil, em 2005, do qual saiu do milionário.

O escritor

Jean está finalizando a edição de seu quarto livro, que deve ser publicado até o final deste ano. O título provisório da publicação é "Bahia, minha Preta", e será uma seleção de crônicas que destrincham o cotidiano da Bahia e dos baianos. Para o próximo ano, um dos projetos é voltar a dar aulas na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM) e Universidade Veiga de Almeida (UVA), ambas no Rio. Além disso, continuará como colunista da Revista Carta Capital.

Apesar de toda as dificuldades enfrentadas ao longo da vida, Jean se diz – e transparece ser – um cara leve que não perdeu a ternura diante das pedras no caminho. Não à toa, gosta muito daquele conhecido poema de Mário Quintana, o Poeminha do Contra. Taí um bom lema:

"Todos estes que aí estão

Atravancando o meu caminho,

Eles passarão.

Eu passarinho!"

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