Maldita Geni

O legislativo é o poder que legitima a democracia. Então por que tanta repulsa, tantas ofensas, tanto descaso com os seus representantes?



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O legislativo é o poder que legitima a democracia. Quanto mais forte e operante for a Casa de Leis, mais garantias de progresso e liberdade terão os cidadãos. Então por que tanta repulsa, tantas ofensas, tanto descaso com os seus representantes? Para alguns, eles não representam o interesse dos cidadãos. São tachados como corruptos, ineptos e mentirosos. Para outros, são eles os donos dos favores e dos cargos, os poderosos de plantão.

É tão forte a revolta que chegamos a renegar o nosso voto e, pior, esquecer em quem votamos. As pesquisas estão aí para comprovar. Seis meses depois das eleições, o cidadão não se lembra mais em quem votou para representá-lo no Congresso ou nas Assembleias Estaduais.

Estão errados os que pensam assim de seus representantes? Absolutamente não. Da forma como está desenhada a política no país, o legislativo brasileiro está devendo e muito à sociedade. E aqui farei uma reflexão de quem vota e é votada. Ou seria um desabafo?

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Já é de praxe, quando se inicia um novo Governo, se juntar partidos, arregimentar-se o maior número de parlamentares, cuja afinidade é simplesmente nenhuma, e está garantida a maioria. O objetivo de se formar uma maioria esmagadora nas casas legislativas, sob o rótulo da tão propalada governabilidade, nada mais é do que impedir que as assembleias e o Congresso cumpram com rigor o seu papel fiscalizatório e de aprofundamento do debate de matérias a serem votadas. É a arte de sufocar todos e todas e de governar como se não houvesse contrários.

O Congresso e as Assembleias são historicamente divididos entre situação e oposição. Até aí, tudo bem. É assim que funciona a Democracia Representativa. A questão é como agem as bancadas no parlamento, ou melhor, como são pressionadas a agir. É quase sempre mandatório que a situação vote com o Governo e a oposição vote contra. Não importa qual seja o tema, o resultado é sempre conhecido, salvo um ou outro percalço que pode perfeitamente ser resolvido por um rolo compressor ou, se for o caso, uma suposta denúncia intempestiva tirada da manga. As votações são geralmente, como se diz no futebol, para cumprir tabela.

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E é assim, por se entregar a cada dia, dar-se a qualquer causa, com tamanha subserviência e no toma lá da cá, que o legislativo perde a sua dignidade. É por isso que chegam pacotes de última hora e que são votados a "toque de caixa", sem que a população possa acompanhar. É por isso que desmandos e desvios de agentes públicos são colocados debaixo do tapete e CPIs são enterradas. Nesse processo em que a situação sempre diz "amem" e a oposição é do contra, a população se sente à margem e prefere ignorar o que se passa, como se não fizesse parte do processo e, nem tampouco, fosse ela a mais atingida por tudo isso. E o pior: essa submissão do Legislativo inibe o parlamentar de fiscalizar, de maneira isenta e satisfatória, os atos do Poder Executivo, o que é uma de suas mais importantes funções.

Joga pedra na Geni! Maldita Geni! (*)

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Sem afinidade e, sobretudo, sem debates mais aprofundados, nosso Legislativo atua como uma extensão do Executivo. E por que esse modelo é tão recorrente no parlamento brasileiro? Porque o nosso sistema de governança por coalizão, que pressupõe a obtenção de maioria no Legislativo acabou por reforçar esse agrupamento de partidos sem nenhum tema, ideia ou compromisso comuns para o país.

Ousei falar de algo tão caro para todos nós: A Democracia brasileira. Conquistada a duras penas, após sete constituições entremeadas por golpes de estado e supressão de direitos, chegamos ao ano de 1988 com a nossa Constituição Cidadã. Nela, consolidamos o direito de votar e ser votado. De eleger representantes para o nosso Parlamento, o nosso espaço de voz, símbolo maior da Democracia. Tão maior, que a cada ameaça ao regime democrático, a quem corremos, nós, o povo? Corremos todos em busca do poder Legislativo.

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Ousei sim, desatar o nó da garganta e mexer na ferida que arde no Congresso Nacional e nas Assembleias Estaduais. E vai arder mais ainda se não fizermos nada. Não podemos aceitar que o Legislativo se distancie de sua mais importante missão que é representar o povo nas suas demandas por justiça e cidadania. Precisamos resgatá-lo e torná-lo palco de discussões, ações e, sobretudo, leis que venham ao encontro dos anseios da população. Precisamos nos apropriar desse espaço de liberdade do pensar múltiplo para o bem estar da sociedade.

O tempo urge e as pedras rolam. Não adianta apenas jogar pedra na Geni.

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(*) Geni e o Zepelim - Chico Buarque de Holanda

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