Gilmar Mendes: delações aceitas pela PF precisam ser reavaliadas
Para o ministro do STF Gilmar Mendes "houve um entusiasmo juvenil com o instituto das delações premiadas" e algumas delas precisam ser reavaliadas. Ele cita o acordo envolvendo o ex-ministro Antonio Palocci: "são informações que estão no Google, muita coisa de 'ouvi dizer'", falou
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247 - Em entrevista ao Valor publicada nesta segunda-feira (23), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes disse que houve um "entusiasmo juvenil" com o instituto da delação, que acabou, segundo ele, se prestando à criminalização da política.
Gilmar criticou a fragilidade de colaborações fechadas com a PF - como a do ex-ministro Antonio Palocci e, mais recentemente, a do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, e disse que algumas delações que haviam sido rejeitadas pelo MPF e aceitas pela PF precisam ser reavaliadas.
Leia abaixo alguns trechos da entrevista:
Valor: Algumas delações foram rejeitadas pelo MPF e aceitas pela PF, depois que o Supremo decidiu pela legitimidade de ambos para firmar acordos de delação
Gilmar: Essa é uma questão que terá de ser talvez reavaliada. À época dessa decisão, sopesou muito a ideia de que era preciso ter um certo equilíbrio entre o MP e a PF. Já havia a decisão anterior do tribunal sobre o poder de investigação do MP, que acabou tendo efeitos extravagantes. Mas estamos com dois casos que são casos de escola. Um é o caso Palocci. São informações que estão no Google, muita coisa de "ouvi dizer". Outra é o caso do Cabral. Mas isso tudo não invalida a experiência. Sabemos todos que a corrupção exige de fato meios mais enfáticos de combate, mas é preciso também ter o devido controle. Até porque os órgãos de combate à corrupção também se corrompem.
Valor: Pode dar exemplos?
Gilmar: Os exemplos brasileiros são suficientes. Todos os episódios que estão aí O que ocorreu com o Marcello Miller [ex-procurador acusado de aconselhar a JBS quando ainda era membro do MP], essa fundação de Curitiba, esses episódios envolvendo procuradores, delegados, pessoal da Receita. O chefe de programação da Lava-Jato no Rio, da Operação Calicute, está preso. Era o homem da Receita.
Valor: O senhor é muito criticado pelo número de habeas corpus que concede. É uma maneira de modular essas decisões da Lava-Jato?
Gilmar: Não. Se você olhar, segundo estatísticas do gabinete, na Segunda Turma eu sou o ministro que mais concede, mas logo depois vem o ministro Edson Fachin [relator da Lava-Jato], e em número muito próximo. Todos os casos em que eu concedi estão confirmados na turma. A prisão provisória tem pressupostos. Não pode ser feita para que o sujeito seja convencido a delatar. Isso não está escrito em lugar nenhum. A prisão diz respeito a fatos atuais? Tem risco de fuga? Houve destruição de prova ou ameaça de testemunha? Se não, não se justifica.
Valor: O senhor também é um crítico contumaz do MPF. A partir de que momento viu que, na sua avaliação, o órgão cometia abusos?
Gilmar: Há várias falas minhas dizendo que temos encontro marcado com as prisões alongadas de Curitiba. Sempre apontei que havia exageros nessa sistemática. Advogados vinham aqui e relatavam que o MP indicava as pessoas que deveriam ser delatadas, caso contrário os benefícios não seriam concedidos. Isso não é bom para o sistema. Eu desconfiava do que foi publicado pelo "The Intercept Brasil". Eu tinha as informações - e a gente também sabe ler estrelas, fazer conexões. Nesse sentido, não me surpreendeu, mas claro que determinadas práticas chocam. Quando um procurador conversa com um auditor fiscal, um superintendente da Receita, e diz para ele olhar determinada conta sem deixar digitais, esse sujeito o faz e depois vira chefe do Coaf aí você botou a raposa pra cuidar do galinheiro. Nos trópicos ou fora deles, isso é crime.
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