Família dá adeus a Alencar
Dona Marisa beija Jos Alencar no caixo exposto no Palcio do Planalto; o filho Josu recebe a solidariedade do presidente em exerccio Michel Temer
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247, Rodolfo Borges, de Brasília – A chegada do corpo do ex-vice-presidente José Alencar a Brasília, na manhã desta quarta-feira 30, mereceu honras dedicadas a chefe de Estado. Coberto com a bandeira do Brasil, o caixão foi recebido na Base Aérea da Fab, às 10h20, pelos presidente em exercício, Michel Temer, presidente do Senado, José Sarney, presidente da Câmara dos Deputados, Marco Maia, e presidente do Supremo Tribunal Federal, Cesar Peluso. O trajeto até o Palácio do Planalto, de 18 quilômetros, foi cumprido num carro aberto do Corpo de Bombeiros. Ao subir a rampa do Planalto, sobre os ombros e ladeado pelos Dragões da Independência, o caixão foi aplaudido pelo público que já aguardava no saguão do primeiro andar. O velório é aberto ao público e vai se estender até às 23 horas. As cerimônias fúnebres se transferem para o Palácio do Liberdade, sede do governo de Minas Gerais, na quinta-feira 31, onde o velório será feito entre 8h30 e 13h00. O sepultamento deve ocorrer no cemitério do Bonfim. O governo brasileiro decretou luto oficial de sete dias pela morte de Alencar. A presidente Dilma Rousseff, que viajou nesta terça-feira 29 pela manhã para Portugal, onde foi acompanhar as homenagens prestadas ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, decidiu antecipar sua volta ao País para a quarta 30, a tempo de acompanhar as cerimônias fúnebres. Lula recebeu o título de doutor honoris causa da Universidade de Coimbra e o dedicou a Alencar. "Nós tínhamos uma relação de pai para filho", disse o ex-presidente. O ex-vice-presidente morreu no começo da tarde desta terça 29, em São Paulo.
O presidente em exercício Michel Temer expediu nota oficial em que destaca o exemplo de luta, perseverança e superação dado por ele a todos os brasileiros. "Mesmo nos momentos de maior sofrimento pessoal, transmitia otimismo permanente e fé inquebrantável", ressaltou Temer. "Lamento profundamente a morte desse mineiro que não conhecia fronteiras e acreditou sempre no Brasil", completou Temer. "Transmito em meu nome e em nome da presidente Dilma Rousseff a solidariedade à família e aos amigos nessa hora triste", concluiu Temer.
Em Brasília, o falecimento do ex-vice-presidente que lutava contra o câncer há 13 anos comoveu a Esplanada dos Ministérios e motivou uma série de homenagens de parlamentares e políticos. “Alencar receberá as honras fúnebres de chefe de Estado, porque passou praticamente um ano como presidente (durante as viagens de Luiz Inácio Lula da Silva ao exterior). Alencar revelou vitalidade física e espiritual extraordinárias e enfrentou a doença com galhardia exemplar”, disse Temer. Para o presidente do Senado, José Sarney, Alencar foi um gladiador pela vida. “Teve sempre a liberdade de concordar, de ajudar, da solidariedade, e a coragem de discordar. O Brasil muito deve a José Alencar por sua postura estadista”, disse Sarney.
O presidente da Câmara, Marco Maia, destacou que Alencar soube distinguir seu papel como vice-presidente e empresário enquanto esteve na Presidência da República. “Quando ele foi indicado para ser o vice de Lula, houve grandes dúvidas entre os petistas. Estávamos recebendo pela primeira vez um empresário numa chapa com um trabalhador. Aquilo criou certa apreensão, mas isso foi mudando e, no último congresso do PT, Alencar foi tratado como filiado benemérito e aplaudido de pé por todos os integrantes”, disse. “Um homem de tantas posses se aliou a um operário e lhe ajudou a ter credibilidade. Isso é algo muito bonito”, emendou a senadora Marta Sulicy (PT-SP).
Depois de anunciada a morte de José Alencar, os parlamentares passaram a dedicar seus discursos nas sessões dos plenários da Câmara e do Senado ao ex-vice-presidente. "Alencar foi um obstinado, sempre um obstinado, sobretudo pela vida. Iniciou sua vida política mais tarde, mas sempre demonstrando um enorme espírito público, um desprendimento permanente e uma vontade de viver que nos surpreende a todos”, disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG). “Ele compreendia como poucos a necessidade de ampliar as parcerias do Estado com o setor privado, e talvez nisso tenha se frustrado um pouco em relação às tímidas ações do governo de que participou nessa área”, completou. Para o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), Alencar deu um exemplo enorme à nação brasileira de como enfrentar a adversidade, transferindo sempre uma mensagem otimista. “Competência, dignidade, caráter, espírito publico e coragem são outros nomes de José Alencar”, disse.
De passagem pelo Senado para uma sessão em memória aos 10 anos de morte do ex-governador Mário Covas, o ex-governador de São Paulo José Serra (PSDB) classificou Alencar como “exemplo de homem cordial”. “Sempre fui simpático à idéia de que tivéssemos uma política monetária e cambial mais favorável tanto à estabilidade quanto ao desenvolvimento, que era uma aspiração dele também”, disse. O senador Pedro Simon (PMDB-RS) disse que não existiu na história do Brasil “um vice-presidente tão digno, tão leal, tão serio, tão competente e disposto a ajudar e colaborar com a Presidência nas horas difíceis e debater as questões importações como a taxa de juros”.
HOMEM DE FIBRA E CONVICÇÕES - Um vencedor. Qual definição mais precisa que esta para o empresário e ex-vice-presidente da República José Alencar? Homem de fibra e convicções, ele nasceu em uma família pobre de 15 filhos, em Muriaé, no interior de Minas, para se tornar um dos mais bem sucedidos capitães de empresa do País, à frente da gigante têxtil Coteminas. Em 1997, os médicos descobriram tumores cancerígenos em seu intestino e, a partir de 2003, em razão da visibilidade alcançada por sua chegada ao poder ao lado de Luiz Inácio Lula da Silva, todo o País passou a acompanhar sua batalha contra a doença e pela vida.
“Não tenho medo da morte, porque não sei o que é a morte”, dizia Alencar. “Peço a Deus que não me dê nenhum tempo de vida a mais, a não ser que eu possa me orgulhar dele”. E foi durante sua batalha contra o câncer que Alencar se reafirmou como um vitorioso. Cultivando o bom humor e olhando de frente para a sua própria situação, ele manteve suas atividades no cargo ao mesmo tempo em que alternava a realização de exames complexos e operações delicadas. Foram nada menos que dezessete cirurgias. Em lugar de mostrar sinais de abatimento, apresentava confiança e semeava lições. Tornou-se, assim, um exemplo de dignidade e altivez diante da adversidade.
“AQUI NÃO HÁ LUGAR PARA DESÂNIMO” - Em 2008, na nona das intervenções cirúrgicas que sofreu, enfrentou um dos momentos mais difíceis de sua jornada. Alencar precisava decidir a respeito de uma complexa operação para a retirada de tumores intestinais. Já havia perdido o rim direito e dois terços do estômago, em 1997. Cinco anos depois, teve retirada a próstata. Submeteu-se a novas operações até atingir aquele momento, quando disse que aceitava ir, mais uma vez, à mesa cirúrgica. Antes, precisou assinar um documento isentando os médicos por um eventual fracasso. “Não foi heroísmo nenhum, foi uma decisão lógica”, resumiu ele ao repórter José Roberto Burnier, da TV Globo. “Sempre me deparei na vida com problemas difíceis e nunca deixei de enfrentá-los”. Momentos antes de passar 18 horas na mesa, o próprio Alencar, ainda não totalmente sedado, incentivou a equipe médica que parecia preocupada na ante-sala do centro cirúrgico do hospital Sírio-Libanês. “O que está havendo?”, perguntou ele. “Por que vocês estão desanimados? Aqui não há lugar para desânimo. Vamos todos com fé, coragem e ânimo, porque nós não podemos recuar da operação”. Alencar saiu da mesa bem mais saudável do que chegou, distribuindo sorrisos horas depois. Vencera mais uma.
Na vida pessoal, ultrapassar problemas parecia mesmo ser uma especialidade. Começou a trabalhar aos sete anos de idade. Circulando pelo interior de Minas Gerais, chegou a dormir no chão do corredor de uma pensão, sem ter dinheiro para pagar um quarto. Foi vendedor de cereais, roupas e macarrão. Era dos bons. Com o apoio de um dos irmãos, montou sua primeira loja, a Queimadeira, em Caratinga, no ano de 1950. Mas queria mais. Foi mudando de área, sempre no comércio, até encontrar o parceiro Luiz Ferreira e com ele fundar a Companhia de Tecidos do Norte de Minas, a Coteminas, em 1969. Sete anos depois, inaugurava a fábrica de tecidos mais moderna do Brasil daquela quadra. Hoje, a companhia é um gigante com cerca de R$ 2,4 bilhões de faturamento a cada ano e onze fábricas espalhadas pelo país.
“NOSSO ETERNO VICE-PRESIDENTE” - Na vida política, Alencar foi sempre ativo. Com um profundo sentimento de mineridade, elegeu-se presidente da Federação das Indústrias do Estado (Fiemg) e vice-presidente da Confederação Nacional das Indústrias (CNI). Em 1998, pelo PMDB, recebeu quase três milhões de votos dos mineiros e tornou-se senador pelo Estado. Pelo PL, para o qual se transferiu, concorreu ao cargo de vice-presidente, em 2002, na chapa encabeçada por Lula. Como mostra a história, elegeu-se e reelegeu-se, acumulou a função com o cargo de ministro da Defesa, entre 2004 e 2006, e jamais se mostrou acomodado pelo conforto da situação. Bateu-se publicamente contra as taxas de juros, mas nunca foi desleal à liderança de Lula. Ao contrário, a amizade pessoal entre eles só fez aumentar com o tempo. Em janeiro deste ano, recebeu das mãos da presidente Dilma Rousseff a medalha 25 de janeiro, dedicada pela Prefeitura de São Paulo. Foi saudado por ela como “nosso eterno vice-presidente”. Em retribuição, José Alencar reafirmou sua fé na vida. “Não posso me queixar”, disse. “A situação está tão boa que não tem como melhorar, todo mundo está rezando por mim”.
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