Breno Altman: atual modelo de Ministério Público corrompe democracia

Jornalista expõe como o MP brasileiro ganhou poder, criticando os governos petistas por terem alimentado um 'monstro institucional'; veja vídeo na íntegra

(Foto: Felipe Gonçalves / Brasil 247)


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Opera Mundi - No programa 20 MINUTOS HISTÓRIA desta terça-feira (26/10), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, discorreu sobre como o Ministério Público chegou a ter tanto poder e as consequências disso para a vida política brasileira.

Altman retomou o episódio da rejeição da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) número 5 na Câmara dos Deputados, que pretendia reformular o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), organismo responsável por avaliar infrações administrativas e constitucionais dos procuradores. A votação contou, inclusive, com o apoio de setores de esquerda. A bancada do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), por exemplo, deu oito votos contrários à emenda.

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“Mesmo que a mudança fosse muito superficial, apenas ampliando um pouco o controle parlamentar sobre o CNMP, o espírito corporativo se fechou em copas, mobilizando parte da imprensa e das forças políticas que defendem o atual modelo de funcionamento do MP. Aliás, não existe nenhum outro Ministério Público do planeta com tanta autonomia, poder e autorregulação corporativa. E esse modelo de funcionamento precisa ser totalmente revisto, por se tratar de uma aberração”, denunciou o jornalista.

Para ele, o órgão, como é, representa um entrave à democracia e à soberania popular. Citando os exemplos dos Estados Unidos e da França, Altman afirmou que o MP deve ser “um braço do poder executivo, não um órgão de controle sobre o governo". 

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"Função que somente pode ser exercida por outro poder eleito, o parlamento. Tampouco a defesa de todos os direitos de cidadania deve estar concentrada em uma só instituição, para evitar sua hipertrofia”, disse.

Ainda que ele tenha reconhecido que os procuradores devem ser autônomos, precisam estar submetidos a mecanismos de controle e revisão para impedir que o MP assuma tarefas que não lhe competem, “sob o risco de graves ameaças às garantias constitucionais”.

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“Não tenhamos dúvidas ou ilusões: a batalha pela reforma do MP será um dos grandes combates democráticos se um novo governo de esquerda for eleito. Sem uma mudança profunda, o ovo da serpente do golpismo e do neofascismo continuará a ser chocado”, enfatizou.

Inícios do MP

Para justificar seu argumento, Altman retomou a história do Ministério Público. Criado em 1890, foi inspirado no modelo norte-americano e era considerado um organismo do Poder Executivo e destinava-se a representar judicialmente o governo frente aos tribunais do país. Esse modelo, implícito na Constituição de 1891, vigorou por 44 anos. 

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Nas diversas cartas constitucionais posteriores, houve alterações da natureza do MP, mas o jornalista deu destaque especial para o período militar e a Constituição de 1967. Outorgada, mantinha na formalidade os atributos do MP previstos na carta de 1946 (em que a nomeação e exoneração do procurador-geral eram responsabilidade do Estado), “mas os poderes atribuídos pelo AI-5 ao Poder Executivo, na prática, anulavam qualquer autonomia ou direitos concedidos à Procuradoria”.

Talvez por isso foi se criando no imaginário público a ideia dos procuradores como lutadores implacáveis pela verdade, justiça e democracia, relembrou Altman, “ainda que a imensa maioria dos integrantes da carreira fosse formada pela elite branca, senhorial e oligárquica”. Desse modo, o avanço da resistência democrática levaria, também, a uma crescente valorização da defesa da autonomia do MP.

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A transição democrática representou uma derrota para a esquerda: “Todo o esforço das frações burguesas que controlavam o Congresso Constituinte era de construir uma institucionalidade que retornasse à democracia liberal, impedindo que houvesse flancos capazes de colocar em risco a hegemonia de classe sobre o Estado pós-ditadura. Ou seja, no caso de a esquerda conseguir eleger o presidente da República, o que era bastante provável pela força das mobilizações populares então em curso, as próprias instituições deveriam ser capazes de impedir mudanças que abalassem os grandes interesses capitalistas”.

No entanto, como seguiu explicando Altman, a correlação de forças obrigou certas concessões para apaziguar a oposição das ruas e uma dessas “aparentes” concessões foi a reforma do Ministério Público.

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Reforma do MP

De acordo com o jornalista, o plano era expandir ao máximo as atribuições do MP, incluindo a defesa dos chamados direitos difusos de cidadania (o direito à vida, à liberdade, à saúde, à educação etc), transformando-o em uma instituição autônoma e soberana, na prática um quarto poder, auto-regulado. 

“Essa alteração era vista, pela esquerda, em especial pelo PT, mas não só, como um avanço democrático. Sem força eleitoral, naquele momento, para imaginar que poderia comandar o Estado, muitas vozes progressistas imaginavam que o MP pudesse ser um enclave reformador no interior do Estado oligárquico”, agregou. 

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Ele contou que o MP era visto como um aliado das lutas sociais e havia, de fato, vários procuradores, oriundos da classe média, “que pareciam ser verdadeiros paladinos das causas populares. Quando pendularam à direita, a partir dos anos 90, já estava montada uma estrutura corporativa praticamente inexpugnável, ironicamente com o apoio determinante dos partidos de esquerda”.

O Conselho Nacional do MP, órgão de controle e fiscalização, por exemplo, foi criado apenas em 2004 e até hoje não há sequer um código nacional de ética para os procuradores, “que raramente são punidos por seus erros e desvios”.

Ilusão da esquerda

Altman criticou a esquerda não apenas por seu deslumbramento com certos procuradores, mas por uma mudança de pensamento, de forte cunho liberal e reformista, que tomava o Estado como um espaço republicano, relativamente neutro, contrário ao que dizia a análise marxista.

“Esse caráter republicano deveria ser cada vez mais fortalecido, portanto. Nessa lógica, quanto mais autonomia tivessem as instituições de controle – como o MP, o Poder Judiciário e os demais aparatos repressivos, como a polícia e as Forças Armadas -, maior seria a taxa de republicanismo”, ilustrou.

Para ele, foi essa concepção que levou os governos petistas a inventarem “uma verdadeira jabuticaba: a aceitação de uma lista tríplice votada pela Associação Nacional dos Procuradores da República, com o compromisso de sempre indicar aquele que tivesse recebido maior votação”.

Assim, desde o chamado “Mensalão”, até chegar à Operação Lava-Jato, a soberania corporativa do MP permitiu que quadrilhas políticas se formassem, na opinião de Altman.

Isso, somado à ideia de que os procuradores eram “a última linha de defesa da sociedade, da nação e da moralidade pública”, impediu que reformas fossem feitas, por exemplo com a PEC 37.

“A PEC 37 repunha um modelo mais equilibrado de funcionamento judicial: a polícia investiga, MP recebe a investigação, denunciando ou não eventuais réus ao Poder Judiciário, que acata ou não essas denúncias, então julgando os pacientes após ouvir alegações do MP e da Defesa. Sem a PEC 37, abriu-se caminho para o conluio entre policiais e procuradores, pois elimina-se um dos freios que poderia conter abuso de poder. Mais que isso: consolidou-se no MP possibilidades quase infinitas de investigações secretas, prolongadas a seu bel-prazer, com provas e indícios duvidosos, como ficou sobejamente evidente na Operação Lava Jato”, concluiu. 

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