Afrânio: STF não se deixou levar pela sanha punitivista

Jurista Afrânio Silva Jardim afirmou que, ao derrubar a prisão em segunda instância, o STF não mais se deixou "levar pela sanha punitivista e voluntarista de alguns personagens de nosso sistema de justiça criminal". "Finalmente, o princípio constitucional da não presunção de culpa passa a ter sua eficácia plena reconhecida judicialmente", disse



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Por Afrânio Silva Jardim, em seu Facebook

CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DA DECISÃO DO STF SOBRE A VEDAÇÃO DE EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA DE PRISÃO.

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Como é público e notório, o Supremo Tribunal Federal, por maioria de votos, em recente sessão plenária, decidiu que o artigo 283 do Código de Processo Penal é constitucional, vale dizer, não contraria qualquer regra ou princípio da Constituição da República.

O citado dispositivo processual só admite as prisões cautelares e a prisão em decorrência de condenação TRANSITADA EM JULGADO. A toda evidência, esta regra está em consonância com o princípio da presunção de inocência, previsto no art.5, inc. LVII, da nossa Carta Magna.

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Assim, não sendo inconstitucional, o artigo 283 tem de ser aplicado pelo Poder Judiciário. Ele veda a chamada execução provisória ou antecipada da pena de prisão. Vale dizer, prisão como efeito de uma condenação somente após o seu trânsito em julgado, ou seja, quando tal condenação penal não puder mais ser modificada em razão de algum recurso processual.

Não resta a menor dúvida de que as demais prisões processuais (cautelares) não são afetadas por esta decisão do S.T.F., pois o tão mencionado art. 283 expressamente prevê a prisão em flagrante, a prisão temporária e a prisão preventiva. Esta última pode ser decretada antes do processo penal e em quaisquer de suas fases procedimentais.

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O que não mais se admite é a prisão como mero efeito de uma condenação de segundo grau, vale dizer, uma prisão imediata e automática, sem consideração de sua necessidade. Em outras palavras, não mais se admite começar o cumprimento de uma pena em decorrência de decisão judicial não definitiva.

Esclarecidas estas questões prévias e de ordem sistemática, vamos examinar as consequências desta correta decisão do Supremo Tribunal Federal. Por amor à brevidade e por preocupação didática, vamos dar ao nosso texto uma forma tópica e objetiva.

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1) Como o artigo 283 do Código de Processo Penal não admite a chamada execução provisória da pena, todos os processos de execução de penal devem ser julgados extintos, por serem ilegais, determinando a liberdade daqueles que estavam cumprindo pena indevidamente.

Nada mais compete ao juízo da execuções. Extinta a ilegal execução provisória, carece este juízo de competência para a prática de qualquer outro ato jurisdicional;

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2) No processo de conhecimento, onde tramitam ainda os recursos da defesa dos réus, poderão o Ministério Público ou eventual assistente da acusação (art.311 do CPP) requerer a decretação da prisão preventiva dos recorrentes, demonstrando o preenchimento dos requisitos do artigo 312 do Cod. Proc. Penal.

Evidentemente, o tribunal não poderá decretar a custódia cautelar “de ofício” e deve ouvir o réu antes de decidir fundamentadamente.

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Se prevalecer o entendimento de que o juízo da execução penal não deve soltar o apenado, pois a prisão fora decretada pelo tribunal de segundo grau, ele deveria se limitar a prolatar uma sentença, decretando a extinção do ilegal processo de execução.

Não me parece este o melhor entendimento, pois o condenado ficaria preso “no limbo”, vale dizer, em razão de um título executivo ilegal e cumprindo uma pena que não estaria sendo executada. Bizarro.

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De qualquer forma, apenas para argumentar, vamos sugerir um procedimento para resolver esta incômoda situação processual.

1) No caso aventado acima, caberia ao tribunal de segundo grau anular o título da prisão ilegal (execução provisória), expedindo o respectivo alvará de soltura, independentemente de qualquer provocação, vale dizer, desfazer a ilegal prisão “de ofício”.

2) Evidentemente, antes desta decisão de soltura do réu condenado, o Ministério Público (ou eventual assistente de acusação) poderá requerer a manutenção da prisão preventiva se preso estiver o réu, demonstrando a persistência dos motivos que justificaram a anterior custódia cautelar (requisitos do artigo 312 do Cod. Proc. Penal).

A toda evidência, já não mais cabe o requisito “por conveniência da instrução criminal”, pois não haverá mais atividade probatória.

3) Se o réu “respondeu” ao processo em liberdade ou já foi solto pelo tribunal em razão da inexistência da execução provisória, o Ministério Público (ou o eventual assistente da acusação) poderá requerer a prisão preventiva do réu, sempre com base no disposto no artigo 312 do Cod. Proc. Penal. Isto se o crime permitir esta espécie de prisão, segundo dispõe a aludida lei processual.

Atenção: a situação do ex-presidente Lula é muito peculiar e suscita um procedimento diferente. A juíza federal da execução de sua pena, da cidade de Curitiba, declinou de sua competência para a segunda-turma do S.T.F., tendo em vista que anterior decisão plenária deste tribunal decidiu que o ex-presidente deveria cumprir a pena na Polícia Federal de Curitiba. Ela entendeu que não mais tinha competência para decidir sobre a progressão de seu regime de pena.

Desta forma, entendo que caberá ao ministro Edson Fachin decretar a extinção de tal execução provisória e expedir o alvará de soltura do ex-presidente Lula, salvo se decretar a sua improvável prisão preventiva, cabendo sempre recurso para o colegiado.

O problema que surge com a vedação da execução provisória é que o réu que está recorrendo não mais terá, em princípio, os direitos previstos na Lei de Execução Penal, pois agora o título de sua prisão será uma decisão de prisão preventiva.

Neste caso, o réu sai prejudicado, pois teria de desistir dos seus recursos para, com o trânsito em julgado da condenação, poder lograr um regime de pena mais benéfico do que a prisão meramente cautelar.

Em nome do princípio maior de justiça, a solução seria dar a este preso que está recorrendo o tratamento legal dos presos em cumprimento de pena de prisão, embora este entendimento não seja juridicamente o mais técnico. A Lei de Execução Penal tem dispositivo legal que autoriza este entendimento.

De qualquer forma, aplaudo a decisão do Supremo Tribunal Federal que prestigiou o nosso sistema jurídico claramente positivado, não mais se deixando levar pela sanha punitivista e voluntarista de alguns personagens de nosso sistema de justiça criminal.

Finalmente, o princípio constitucional da não presunção de culpa passa a ter sua eficácia plena reconhecida judicialmente.

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