Vai custar caro: O preço de uma aliança contra o Estado Islâmico
Para convencer os árabes a participar de uma coligação contra os jihadistas, Barack Obama tem de dar garantias sobre o futuro do Iraque, da Síria e do processo de paz entre israelenses e palestinos. Estará disposto a pagar o valor do negócio?
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Fonte: Jornal Al-Hayat, Londres
O rei Herodes ofereceu a Salomé metade do reino como prêmio pela dança que a jovem tinha executado em sua homenagem. Salomé preferiu pedir-lhe a cabeça de João Batista. Achava mais urgente eliminar o perigo que o profeta representava para si, deixando para depois a conquista, não da metade, mas de todo o reino.
Num passado mais recente, os árabes pediram um processo de paz sério e global com Israel, em troca de sua participação na guerra contra Saddam Hussein. Este tinha acabado de ocupar o Kuwait em agosto de 1990 e condicionava a sua retirada ao fim da ocupação israelense na Cisjordânia e na Faixa de Gaza. Era pura propaganda de Saddam, mas não havia forma de a contestar sem obter uma contrapartida efetiva. Esta materializou-se na conferência de Madri, realizada em outubro de 1991, considerada o início de um processo de paz entre Israel e os países árabes.
A imagem do Islã
Hoje, muitos pedem “a cabeça do Daesh” (acrônimo em árabe do Estado Islâmico, EI). É preciso, evidentemente, destruir esse flagelo que paira sobre os Estados e as sociedades árabes, tanto mais que ele prejudica a imagem do Islã, dos muçulmanos e dos árabes num grau sem precedentes nos tempos modernos. Contudo, para que isso aconteça, é preciso definir a moeda de troca da participação árabe no combate ao Estado Islâmico.
Não é nenhum segredo dizer que um número significativo de árabes viu no Daesh/EI uma oportunidade de contrariar o aumento da influência iraniana no Iraque. A prova é que os dirigentes iranianos foram obrigados a substituir o seu encarregado dos assuntos iraquianos e sírios, Suleiman Qassem, que tinha dado um apoio ilimitado às políticas violentamente discriminatórias do primeiro-ministro Nouri al-Maliki, xiita, contra os sunitas iraquianos. Em 14 de agosto, o contestado Maliki anunciou o seu afastamento do cargo. Um novo Governo foi aprovado pelo Parlamento, em Bagdá, a 8 de setembro, liderado pelo xiita Haider al-Abadi.
A aliança internacional contra o Daesh/EI (anunciada pelo presidente Obama no dia 10 de setembro) seria conduzida por Washington e envolveria Irã e Iraque, operações na Síria e as petromonarquias árabes do Golfo Pérsico. Mas para que as coisas resultem é preciso um acordo sobre matérias de fundo. E responder à difícil questão de saber que sucederá nas áreas de onde o EI seja expulso.
Na Síria, deverão voltar ao controle do regime de Bashar al-Assad? O Iraque deverá ser novamente entregue à influência total do Irã? Em outras palavras, fará sentido combater o EI sem agir sobre as razões que levaram ao seu surgimento, incluindo o apoio popular real de que dispõe e que permitiu a sua expansão?
Como formar uma aliança?
Há quem relativize o perigo que representa o EI perante o crescente vazio político e de segurança no mundo árabe. Até no Egito, longe da região do Crescente Fértil (Síria-Iraque-Jordânia), agita-se o espectro da expansão dos jihadistas do Estado Islâmico. Em suma, se quisermos formar uma aliança internacional contra o terrorismo do EI, será preciso levar em conta a decomposição dos Estados árabes, o aumento da área de influência iraniana e a situação dos palestinos perante a máquina letal israelense. O problema, no entanto, também se coloca quanto à chefia dessa aliança. O Presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, terá percebido que a política do “deixá-los esgotar-se mutuamente” (na Síria e no Iraque) chegou ao fim?
Reféns ocidentais degolados
O jornalista norte-americano James Foley, degolado pelo EI, pode, assim, ter sido o primeiro de uma série de vítimas norte-americanas. Steven Sotloff, outro jornalista norte-americano, seria morto da mesma forma duas semanas depois, e o britânico David Hanes a 13 de setembro. A quarta decapitação ocorreu na Argélia, a 24 de setembro: o alpinista francês foi decapitado por jihadistas. Seu único “crime”: ser francês. Em todos os casos houve vídeos divulgados pelos extremistas na Internet. Não nos esqueçamos de que os sucessivos fracassos de George W. Bush e Obama levaram ao surgimento do Estado Islâmico. Obama teria ganho muito, se tivesse sido aconselhado a pensar nisso há um ano, quando optou por não fazer nada na sequência do uso de armas químicas por Bashar al-Assad contra a oposição (na área de Ghouta, arrredores de Damasco.
Todos contra o Estado Islâmico
Em meados de setembro foi anunciada uma coligação de dez países islâmicos com os Estados Unidos e começaram os ataques aéreos a posições do EI no norte do Iraque. Barack Obama falou em “enfraquecer para destruir” o Estado Islâmico no quadro de uma estratégia que se estenderá também à Síria (onde também haverão ataques aéreos ao EI e apoio aos rebeldes laicos anti-Assad). Houve mais de 160 ataques aéreos levados a cabo desde 8 de agosto. Além da cobertura aérea, os EUA assegurarão os armamentos dos curdos e das milícias sunitas anti-EI. O envolvimento terrestre dos norte-americanos na região resume-se, por enquanto, a 1500 homens das forças especiais e de informações.
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