Turquia. Erdogan por trás do golpe de Estado?
Órgãos de comunicação de todo o mundo tentam interpretar a intentona falhada de 15 de julho, por entre teorias da conspiração e previsões de repressão reforçada por parte de Erdogan
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Fonte: Revista Courrier International, Paris
Desde o dia 17 de julho, na sequência do golpe falhado de parte do exército turco, o Presidente Recep Tayyip Erdogan lançou uma vasta operação para retomar o controle do país. Segundo o diário argelino El-Watan, nos dois dias que se seguiram ao golpe de Estado houve 6 mil detenções de militares, 104 golpistas foram mortos e 2745 juízes exonerados das suas funções.
O Governo também anunciou a hipótese de repor a pena de morte, abolida em 2004. Para o site Al-Monitor, estas medidas levantam dúvidas: “A rapidez e a envergadura das ações do Executivo são notáveis. Dá a impressão de que o Governo e Erdogan já estavam preparados para uma tentativa de golpe de Estado.”
A suspeita é reforçada pela imagem de evidente despreparo da intentona, sublinha, em Beirute, o diário L’Orient Le Jour, que se refere um “golpe de Estado de natureza estranhamente amadora, que suscitou desconfianças na sociedade civil”.
Para que complicar?
Al Monitor revisita o desenrolar do golpe: “Fazer um golpe de Estado é bastante simples. Começa-se por apanhar o chefe, depois os meios de comunicação, depois exibe-se o chefe humilhado nos meios de comunicação. Em vez disso, decidiram levar a cabo um golpe de Estado enquanto Erdogan estava de férias... os golpistas exigiram às pessoas que ficassem em casa, enquanto Erdogan lhes pedia que saíssem à rua. Os que estavam a favor do golpe ficaram, por isso, em casa, ao passo que os apoiadores de Erdogan enchiam as ruas".
Para o Kapitalis, esta tentativa de golpe pode muito bem ter sido uma “encenação cuidadosamente orquestrada". Este sítio tunisino considera que “não é errado pensar que a desordem foi organizada pelo chefe de Estado para consolidar o seu poder absoluto”. O Presidente terá adotado uma estratégia “na linha dos ensinamentos de O Príncipe, de Maquiavel, filósofo italiano que teorizou sobre a arte de governar e que “recomenda a simulação e mesmo a conspiração para neutralizar os inimigos. Maquiavel preconizava, se necessário, o recurso à repressão, mas de uma só vez, para não ter de recomeçar tudo de novo, acrescenta o Kapitalis, que conclui: “Por trás das aparências de hoje, o segredo desvenda-se diante dos nossos olhos”.
Esta tese, no entanto, é repudiada por vários jornais turcos, como o diário Hurriyet, para quem esta explicação “não e' convincente: não leva em conta as incertezas inerentes a uma operação desse tipo, na medida em que a reação dos oficiais que não estivessem ao corrente do projeto teria sido demasiado imprevisível”. Já o jornal Haberturk considera que “não devemos esquecer que este golpe de Estado não se dirigia apenas contra o Governo do partido AKP e do Presidente Erdogan, mas antes à classe política no seu todo. A oposição deverá, por isso, assumir o seu papel e recordar isso ao Executivo, de forma a travar a vaga autoritária que se manifestará depois desta tentativa de golpe”.
Em todo o casso, as interrogações são legítimas, insiste o sítio Al Monitor: “Enquanto houve mais perguntas do que respostas convincentes, não admira que surja um grande número de teorias da conspiração”.
O silêncio duvidoso do Ocidente
“Se quiserem saber porque é que os europeus e os americanos perderam toda e qualquer autoridade moral no Médio Oriente, basta olharem para as três horas de silêncio durante as quais esperaram até ver para que lado soprava o vento”, escreve David Hearst no site Middle East Eye. “Tratou-se, indubitavelmente, de um golpe de Estado, mas enquanto os turcos lutavam pelo seu futuro, havia silêncio na mídia e nos governos do Ocidente, cuja imagem de marca é, não obstante, a democracia".
A embaixada dos Estados Unidos começou a falar de “um levante”, antes de enviar a Erdogan uma mensagem de apoio sem ambiguidades, coisa que aliás só fez “após a confirmação do fracasso do golpe de Estado”. O colunista também não poupa os países árabes. Os meios de comunicação egípcios festejaram ruidosamente o golpe de Estado, enquanto “os jornais dos Emirados Árabes Unidos fizeram manchetes dizendo que Erdogan estava acabado” e “o canal de televisão saudita Al-Arabiya chegou a dizer que o golpe de Estado fora bem-sucedido”.
Quanto à Arábia Saudita, “esperaram 15 horas antes de emitirem uma declaração”. E Hearst comenta: “Os únicos países que apoiaram Erdogan sem reservas foram Marrocos, Qatar e Sudão”.
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