Tempestade sobre a Ásia. As esperanças adiadas do Sudeste Asiático
Abertura limitada na Birmânia. Autoritarismo em Singapura e na Malásia. Golpe na Tailândia. A situação já esteve melhor nessa região da Ásia.
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Por: Christian Caryl (excertos)
Fonte: Revista Foreign Policy, Washington
No dial de abril de 2012, a população de Myanmar (antiga Birmânia) participou das primeiras eleições livres (parciais) realizadas em 25 anos. O povo votou com alegria e os comícios de campanha do partido de oposição pró-democrático, a Liga Nacional pela Democracia (LND), foram ocasiões de festa, depois da entrega do Premio Nobel da Paz a Aung San Suu Kyi (sua líder), que fez uma entrada triunfal no Parlamento.
A evolução que então se verificava em Myanmar inscrevia-se numa tendência regional mais ampla. Dizia-se que o Presidente Thein Sein, um ex-general que, em 2010, lançou o país numa senda de abertura e de reforma ao estilo de Gorbatchov na antiga União Soviética, se inspirara nos exemplos de países vizinhos como a Indonésia, a Tailândia e as Filipinas – que, em anos anteriores, tinham registado um significativo crescimento econômico, depois de passarem de regimes autoritários para regimes mais democráticos.
Na altura, era legítimo pensar que até os bastiões do autoritarismo, como a Malásia e Singapura, estariam prestes a ser postos em causa pelas respetivas populações.
Em 2011, o partido no poder em Singapura havia décadas obteve os piores resultados eleitorais em 50 anos. Na Malásia, o firme aumento da influência da oposição, dirigida por Anwar Ibrahim, parecia indicar que a velha guarda enfrentava um novo desafio vindo de uma classe média cada vez mais indignada com as mentiras e a corrupção endêmica das autoridades.
Claro que era necessária alguma reserva. Ninguém esperava que, dadas as profundas divisões religiosas, étnicas e econômicas existentes, o Sudeste Asiático entrasse sem esforço num nirvana democrático. Mas nem os mais pessimistas
tinham previsto que as aspirações dos reformadores viessem a abortar tão rapidamente. O Sudeste Asiático vive hoje sob o signo de uma reação generalizada contra a democracia, uma versão suavizada da situação do Médio Oriente desde a Primavera Árabe. “Em toda a região, o respeito dos governos pelos direitos humanos está em queda livre", afirma Phil Robertson, da Ong Human Rights Watch. “Tal, como todos os que, no Sudeste Asiático, se preocupam com esta questão, estamos redobrando a vigilância."
Na Tailândia, o golpe de Estado militar do ano passado reduziu a zero as perspectivas de um rápido regresso à democracia. Embora a junta militar que passou a governar o país diga querer fazer reformas ambiciosas, a sua reação ao mínimo sinal de protesto não pressagia nada de bom.
Campanha pessoal contra Ibrahim
Na Malásia, os resultados das eleições de 2013 mostraram a que ponto o pais está longe da democracia. Embora tenha obtido 47% dos sufrágios, a coligação governamental controla 60% do Parlamento, graças a um sistema eleitoral concebido para dar vantagem ao partido no poder. Em vez de procurar coexistência com a oposição, o Executivo apostou no confronto.
A polícia reprimiu com violência todas as vozes dissonantes. 0 Governo lançou nova campanha contra Anwar Ibrahim e voltou a detê-lo, sob a acusação duvidosa de ofensa à moral e aos bons costumes.
A maior decepção, porém, continua a ser Myanmar. No próximo outono, o país vai realizar as primeiras eleições nacionais desde o início do processo de reforma. As esperanças de muitos birmaneses de que esse escrutínio pudesse dar um novo impulso à democratização começam a parecer cada vez mais vãs. A campanha da LND em prol da revisão da Constituição em vigor, que contem normas que impedem Aung San Suu Kyi de se candidatar as eleições presidenciais, falhou. As tensões étnicas entre a maioria budista birmanesa e a minoria muçulmana dos Rohingya provocaram um aumento do nacionalismo, de que o Governo se apressou a tirar partido.
As forças de segurança reprimiram violentamente as recentes manifestações de estudantes e têm sido pedidas penas de prisão para um número crescente de vozes críticas.
Tendo em conta a complexidade e o dinamismo espantosos do Sudeste Asiático, o melhor será abstermo-nos de fazer previsões acerca do futuro da democracia. Contudo, uma coisa é certa: os tempos não são para grandes otimismos.
ENTREVISTA
MODI: A TENTAÇÃO AUTORITÁRIA
A opinião do indiano Rana Dasgupta
A Índia, a maior democracia do mundo, hesita entre o modelo autoritário e um sistema mais próximo do povo. É o que se conclui desta entrevista a Rana Dasgupta, importante intelectual indiano.
Por: Lynn Parramoro (excertos)
Fonte: The Huffington Post, Nova York
Que efeitos teve a globalização na democracia indiana?
O debate é aceso, até porque tanto se verificou a eleição de Narendra Modi para o cargo de primeiro ministro, como a vitória (reeleição) de Arvind Kejriwal no estado de Delhi (início de fevereiro). Que faz a democracia por nós? Existe só para garantir que as grandes empresas ganhem mais dinheiro? As respostas divergem.
Alguns julgam que o melhor para a Índia é ter muitas grandes empresas dinâmicas. Partem do princípio de que isso dinamizaria o conjunto da economia e daria também um ascendente simbólico à Índia, o que é importante para aqueles que sentem que, historicamente, o país tem sido marginalizado e desprezado.
Narendra Modi gaba-se do seu poder e procura alardear porte físico e virilidade. É um personagem autoritário, claramente movido por instintos antidemocráticos e, ao mesmo tempo, carismático. Apresenta-se como vegetariano, frugal e não corrupto. Trata-se de uma mistura de características que seduz muita gente. É uma imagem simultaneamente viril, ascética e favorável aos meios empresariais.
Que segmentos da população se sentem desconfortáveis com as políticas de Modi?
Para muitos, a ampla vitória eleitoral de Modi é vista como um voto de apoio ao capitalismo autoritário. Contudo. há uma outra corrente na sociedade que defende uma democracia mais radical, mais próxima das pessoas, e que fala mais abertamente dos pobres. Arvind Kejriwal faz parte desse movimento.
O símbolo do Partido Aam Aadmi (AAP, Partido do Homem Comum), de Kejriwal. é uma vassoura, em representação dos cidadãos mais pobres. O dirigente do AAP também está interessado no combate à corrupção e em reinventar a democracia.
O seu minúsculo apartamento, num bairro modesto no setor leste de Nova Delhi, funcionou como quartel-general do movimento. Kejriwal foi o homem que, apenas alguns meses depois da vitória de Modi, decidiu candidatar-se em Nova Delhi, o que prova que as duas correntes políticas são muito ativas e que, na Índia, as pessoas se interrogam sobre a forma de conciliar política e capitalismo.
(*) Rana Dasgupta, ensaísta e romancista de origem indiana, nasceu no Reino Unido e vive em Nova Deli (Índia). Dedicou o seu último livro (Capital: A Portrait of Twenty-First Century Delhi) à capital indiana. Site do autor: httpJ/www.ranadasguptacom/
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