Saltei da estratosfera. Foi assim que fiz
Em 21 de outubro de 2014, Alan Eustace, vice-presidente do Google, vestiu um traje espacial de 227 kg, feito sob medida, prendeu-se a um balão atmosférico e chegou a mais de 41 km de altitude, de onde saltou em direção ao solo, superando a velocidade do som e recordes anteriores de saltos a grandes altitudes. Ouça a história dele, sobre como e por quê.
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Vídeo: TED – Ideas Worth Spreading
Tradução: Leonardo Silva. Revisão: Cláudio de Aquino
Dos limites da estratosfera, Alan Eustace saltou em direção ao solo usando apenas um traje espacial, quebrando todos os recordes de saltos espaciais.
Dois anos depois que Felix Baumgartner saltou de uma cápsula na estratosfera, Alan Eustace bateu o recorde de salto de altura – sem o uso de uma cápsula.
No interior de uma roupa espacial com o peso de 227 quilos, Eustace ascendeu pendurado a um balão imobiliário, e subiu até uma altura de 41 quilômetros. Desse ponto, Eustace se soltou do balão e iniciou o seu salto em direção à superfície.
Vídeo: Palestra de Alan Eustace no TED
Tradução integral da palestra de Alan Eustace:
Fui criado em Orlando, na Flórida. Meu pai era engenheiro aeroespacial. Vivi e respirei o programa Apollo. Víamos os lançamentos do nosso quintal, ou os víamos no trajeto de uma hora até Cabo Canaveral. Claro, eu ficava impressionado com tudo a respeito do espaço, mas o que mais me impressionava era a engenharia utilizada para isso.
Atrás de mim, vocês têm uma visão incrível, uma fotografia tirada da Estação Espacial Internacional, e ela mostra uma parte do nosso planeta que raramente é vista e estudada e que quase nunca é explorada. É a chamada estratosfera.
Se você partir do solo e for subindo, subindo e subindo, fica cada vez mais frio, até chegar ao início da estratosfera e, então, algo incrível acontece. Fica mais frio bem mais devagar e, então, começa a esquentar, e vai ficando cada vez mais quente, até o ponto em que você quase pode sobreviver sem qualquer proteção, a cerca de zero grau, e aí acaba ficando cada vez mais frio, chegando então ao topo da estratosfera. É um dos lugares menos acessíveis em nosso planeta. Normalmente, só astronautas a visitam, ao atravessarem-na em alta velocidade, provavelmente a diversas vezes a velocidade do som, em questão de alguns segundos na subida, e quando reentram na atmosfera como uma bola de fogo, no caminho de volta.
Mas a pergunta que fiz foi: "É possível permanecer na estratosfera? É possível vivenciar a estratosfera? É possível explorar a estratosfera?"
Estudei isso utilizando minha ferramenta de busca preferida, durante um bom tempo, cerca de um ano, e depois fiz uma ligação telefônica assustadora. Um amigo meu me recomendou ligar para Taber MacCallum, da Paragon Space Development Corporation, e perguntei a ele o seguinte: "É possível criar um sistema para entrar na estratosfera?" Ele respondeu que sim. Após um período de cerca de três anos, foi exatamente o que fizemos. E, em 24 de outubro do ano passado, usando este traje, parti do solo, subi a 41,4 quilômetros usando um balão... mas pra que contar?
Voltei ao solo a uma velocidade de até 1.322 km/h. Foi uma descida de 4 minutos e 27 segundos. Quando cheguei a 3 km, abri o paraquedas e pousei.
Mas esta é, na verdade, uma palestra sobre ciência e sobre engenharia, e, para mim, o mais incrível nessa experiência foi Taber dizer que sim, que achava possível criar um traje estratosférico e, mais que isso, que eu fosse lá no dia seguinte e conversasse com a equipe que integrava o cerne do grupo que de fato criou o traje. Eles fizeram algo que acho importante: utilizaram o mergulho de profundidade como analogia. No mergulho de profundidade, você tem um sistema de sobrevivência. Nele, você tem tudo de que possa precisar. Você tem tanques de oxigênio. Tem roupa de mergulho. Tem lentes. E este sistema que vamos lançar na estratosfera é igual ao de mergulho.
Três anos depois, é isto que temos. Temos um traje incrível, feito pela ILC Dover. ILC Dover foi a empresa que criou todos os trajes do Apollo e todos os trajes de atividades extraveiculares. Eles jamais haviam comercializado um traje, a não ser para o governo, mas me venderam um, pelo que sou muito grato. Aqui em cima, temos um paraquedas. Tudo levou em conta a segurança. Todos na equipe sabiam que tenho esposa e duas filhas pequenas, de 10 e de 15 anos, e que eu queria voltar em segurança. Temos um paraquedas principal e um reserva e, se eu não fizer nada, o paraquedas reserva se abre, devido a um dispositivo automático. O próprio traje me protege do frio. Esta área frontal possui proteção térmica, que aquece água que circula pelo traje. Ele possui dois tanques bem cheios de oxigênio. Mesmo que o traje tivesse um buraco de seis milímetros, o que é extremamente improvável, esse sistema ainda me protegeria da baixa pressão do espaço.
A principal vantagem desse sistema é o peso e a complexidade. Ele pesa cerca de 227 kg, e em comparação a outra tentativa recente de chegar à estratosfera, foi usada uma cápsula. Criar uma cápsula é algo extremamente complexo e ela pesava cerca de 1.360 kg. Para levar 1.360 kg a 41 km de altitude, que era minha altitude almejada, seria preciso usar um balão de 1.274 a 1.416 km³. Sendo de 227 kg o peso do sistema que usei, pudemos usar um balão cinco vezes menor que isso, o que nos permitiu utilizar um sistema de lançamento extremamente mais simples do que o que precisa ser usado com um balão maior.
Então, vou contar a vocês sobre Roswell, Novo México, em 24 de outubro. Tínhamos uma equipe incrível, que acordou no meio da madrugada. Aí está o traje. Ele está sendo levado num trator que vocês logo verão, e quero mostrar a vocês um vídeo do lançamento de fato. Roswell é ótima para lançamento de balões, mas é fantástica para pouso de paraquedas, especialmente quando o pouso é a 113 km do lugar de onde você partiu. Aquele é um caminhão com hélio, no fundo. Está escuro. Já passei cerca de uma hora e meia treinando a respiração. Aqui, estou vestindo o traje. Leva cerca de uma hora para vesti-lo. Os astronautas são levados numa van bem legal, com ar-condicionado, até o local de lançamento, mas eu fui num trator.
Dá para ver o alto. Dá para ver o balão lá em cima. É lá que o hélio está. Esse é o Dave deixando o espaço aéreo livre com a FAA por 24 km. E lá vamos nós.
Eu, acenando com a mão esquerda. Estou acenando com a mão esquerda porque, na mão direita, está a ejeção de segurança.
Minha equipe me proibiu de usar minha mão direita. A viagem de subida é linda. Parecida com o Google Earth retrocedendo.
Levei duas horas e sete minutos para subir, e foram as duas horas e sete minutos mais serenos. Tentei basicamente relaxar. Minha frequência cardíaca estava bem baixa e eu tentei não usar muito oxigênio. Dá para ver como os campos atrás estão relativamente grandes a essa altura, e dá para me ver subindo cada vez mais.
Aqui é interessante, porque se repararem, estou bem acima do aeroporto e estou a 15 km de altura, mas logo estou prestes a entrar num vento estratosférico de mais de 190 km por hora. Esse é o meu diretor de voo me dizendo que havia acabado de ir mais alto do que qualquer um já havia ido usando um balão e eu estava a cerca de 1 km do ponto de soltura. Essa é a vista. Dá para ver a escuridão do espaço, a curvatura da Terra, o frágil planeta abaixo. Agora, estou praticando mentalmente os procedimentos de emergência. Se algo der errado, quero estar preparado. E a principal coisa que quero fazer aqui é me soltar, cair e ficar totalmente estável.
(Vídeo) Controle de solo: Todos preparados? Cinco, quatro, três, dois, um.
Alan Eustace: Aquele é o balão passando, completamente inflado. E dá para ver o paraquedas estabilizador, que vou já vou mostrar, porque é muito importante. Aquele é o balão passando uma segunda vez. Agora, estou praticamente à velocidade do som. Não há nada que me diga que estou à velocidade do som e, logo, alcançarei, na verdade, minha velocidade máxima, 1.322 km por hora.
(Vídeo) Controle de solo: Perdemos os dados.
AE: Já desci bastante agora e dá para ver o paraquedas sair bem ali. A essa altura, estou feliz que o paraquedas tenha saído. Achei que eu fosse o único feliz, mas o controle da missão também estava muito feliz. O mais legal foi o momento em que abri... Eu tinha um grande amigo, o Blikkies, o homem do paraquedas. Ele foi em outro avião, pulou e pousou bem ao meu lado. Ele foi o meu apoio na descida. Esse é o momento do pouso; mais apropriadamente uma queda, talvez.
Odeio admitir, mas foi bem pior que meu pior pouso até então.
(Vídeo) Homem: Como você está?
AE: Olá! Legal!
Quero dizer uma coisa que talvez vocês não tenham visto no vídeo, mas uma das partes mais críticas de tudo isso foi a soltura e o que acontece logo após ela. Tentamos usar algo chamado paraquedas estabilizador, e ele estava lá para me estabilizar. Vou mostrar um a vocês agora. Se alguém aqui já saltou de paraquedas lado a lado, provavelmente usou um desses. Mas o problema dessa coisa é que, exatamente na soltura, você está em gravidade zero. Então, é bem fácil ele se enroscar em você. Antes que perceba, você pode estar enrolado e girando, ou pode soltá-lo tarde, e aí você estará a 1.300 km por hora, e essa coisa vai se despedaçar e não será muito útil. Mas o pessoal da United Parachute Technologies tiveram uma ideia, e foi um rolo como esse, mas observem o que acontece quando eu o solto. Ele forma uma tubo. Esse tubo é tão sólido que você pode pegar esse paraquedas estabilizador e enrolá-lo, mas ele jamais vai se enroscar em você. Isso evitou um problema potencial bem grave.
Nada é possível sem uma equipe incrível. O centro disso tudo foram cerca de 20 pessoas que trabalharam nisso nos três anos, e eles foram incríveis. As pessoas me perguntavam qual a melhor parte disso tudo: foi a chance de trabalhar com os melhores especialistas em meteorologia, balonismo, tecnologia de paraquedas, sistemas ambientais e medicina de grandes altitudes. Foi fantástico. É o sonho de um engenheiro trabalhar com esse grupo de pessoas. E, ao mesmo tempo, queria agradecer aos meus amigos da Google, por me apoiarem durante essa empreitada e por me cobrirem quando eu estava fora. Mas há um outro grupo ao qual gostaria de agradecer: minha família. É!
Sempre dava aulas a elas sobre tecnologia de segurança e elas não prestavam atenção em nada. Foi superdifícil para elas e a única razão de minha esposa ter tolerado isso era eu voltar incrivelmente feliz depois de cada um dos 250 testes, pois ela não queria tirar aquilo de mim. Quero concluir com uma história. Eu e minha filha Katelyn, de 15 anos, estávamos no carro, na estrada, e ela estava sentada, quando teve uma ideia e disse: "Pai, tenho uma ideia". Ouvi a ideia dela e disse: "Katelyn, isso é impossível". Ela olhou para mim e disse: "Pai, depois do que você fez, como pode dizer que algo é impossível?" Eu ri e disse: "Certo, não é impossível; só é bem, bem difícil". Então, pausei por um segundo e disse: "Katelyn, talvez não seja impossível; talvez não seja nem bem, bem difícil. É que eu não sei como fazer.
Obrigado.
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