Origens do universo. Telescópio pode mostrar como tudo começou

Quando e de que forma o universo teve início? Um grupo de astrônomos de várias partes do mundo quer responder essa pergunta observando o mais distante que um novo telescópio possa nos permitir. Wendy Freedman chefiou a criação do Telescópio Gigante de Magalhães, em construção na América do Sul. No TEDGlobal, no Rio, ela compartilha uma visão corajosa das descobertas sobre o nosso universo que o TGM pode tornar possíveis.

Quando e de que forma o universo teve início? Um grupo de astrônomos de várias partes do mundo quer responder essa pergunta observando o mais distante que um novo telescópio possa nos permitir. Wendy Freedman chefiou a criação do Telescópio Gigante de Magalhães, em construção na América do Sul. No TEDGlobal, no Rio, ela compartilha uma visão corajosa das descobertas sobre o nosso universo que o TGM pode tornar possíveis.
Quando e de que forma o universo teve início? Um grupo de astrônomos de várias partes do mundo quer responder essa pergunta observando o mais distante que um novo telescópio possa nos permitir. Wendy Freedman chefiou a criação do Telescópio Gigante de Magalhães, em construção na América do Sul. No TEDGlobal, no Rio, ela compartilha uma visão corajosa das descobertas sobre o nosso universo que o TGM pode tornar possíveis. (Foto: Gisele Federicce)


✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no canal do Brasil 247 e na comunidade 247 no WhatsApp.

 

continua após o anúncio

O Telescópio Gigante de Magalhães, no deserto de Atacama, Chile (Ilustração de artista)

 

continua após o anúncio

Vídeo: TEDGlobal - Rio

Tradução: Leonardo Silva. Revisão: Maricene Crus

continua após o anúncio

A astrônoma Wendy Freedman dirigiu a construção do Telescópio Gigante de Magalhães (GMT), um enorme observatório astronômico situado no deserto do Atacama, norte do Chile. Freedman, à frente de uma enorme equipe de cientistas e de técnicos, trabalha na construção de vários telescópios de nova geração. OP Gigante de Magalhães, por exemplo, faz parte de um conjunto de três megatelescópios que estão sendo construídos no Atacama. Os outros dois são o Telescópio Alma e o Telescópio Europeu Extremamente Grande (E-ELT).

 

continua após o anúncio

continua após o anúncio

A astrônoma Wendy Freedman

 

continua após o anúncio

O GMT terá um poder de resolução dez vezes maior do que o Telescópio Espacial Hubble. Quando estará pronto e em pleno funcionamento ele poder dar uma contribuição fundamental à pergunta que está hoje na mente de todos nós, astrônomos ou não: Haverá lá fora outros planetas como a Terra, capazes de abrigar a vida?

Graças ao seu enorme tamanho e capacidades, o GMT poderá obter imagens de objetos extremamente distantes, muito mais distantes de tudo que já vimos até agora. Seremos capazes de observar os primeiros objetos formados no universo. As primeiras estrelas e galáxias. O começo de tudo.

continua após o anúncio

 

Vídeo: Wendy Freedman no TED. 

 

 

Tradução integral da palestra de Wendy Freedman:

 

Aos 14 anos, eu tinha interesse por ciência, era fascinada por ela e empolgada em aprendê-la. Eu tinha um professor de ciências, no ensino médio, que dizia à turma: "As meninas não precisam ouvir isso".

Que encorajador.

Eu escolhia não ouvir, mas só aquela frase.

Vou levá-los aos Andes, no Chile, a 300 milhas, 500 km, ao nordeste de Santiago. É uma lugar bem remoto, bem seco e bem bonito. Não há muita coisa lá. Há condores, tarântulas e, à noite, ao escurecer, é possível vermos um dos céus mais escuros vistos na Terra. É um lugar meio mágico, as montanhas. É uma maravilhosa combinação de topo de montanha bem remoto e tecnologia extremamente sofisticada.

Nossos ancestrais, desde de que se tem registro, observavam o céu noturno e refletiam sobre a natureza da nossa existência. E a nossa geração não é diferente. A única dificuldade é que, hoje, o céu noturno é ofuscado pelo brilho das luzes das cidades. Por isso, os astrônomos vão a topos de montanhas isoladas para visualizar e estudar o cosmos. Os telescópios são nossa janela para o cosmos.

Não é exagero dizer que o Hemisfério Sul será o futuro da astronomia no século 21. Já existe uma rede de telescópios, nas montanhas andinas, no Chile, que, em breve, receberá uma série sensacional de novas capacidades. Haverá dois grupos internacionais que vão construir telescópios gigantes, sensíveis à radiação óptica, assim como nossos olhos. Haverá um telescópio de pesquisa que vai varrer esporadicamente o céu noturno. Haverá telescópios de radiofrequência, sensíveis à radiação de radiofrequência de ondas longas. Haverá também telescópios no espaço. Haverá um sucessor do Telescópio Espacial Hubble, chamado Telescópio James Webb, que será lançado em 2018. Haverá um satélite chamado TESS, que descobrirá planetas existentes fora do nosso sistema solar.

Durante a última década, venho liderando um grupo, um consórcio, um grupo internacional, para construir o que será, quando terminado, o maior telescópio óptico do mundo. Ele se chama Telescópio Gigante de Magalhães, ou TGM. Esse telescópio terá espelhos com 27 pés de diâmetro, cada um. São quase 8,4 metros. Ele é maior que este palco, chegando talvez à quarta fileira da plateia. Cada um dos sete espelhos nesse telescópio terá quase 8,4 metros de diâmetro. Juntos, os sete espelhos desse telescópio terão 24,4 metros de diâmetro, basicamente o tamanho deste auditório. O telescópio inteiro terá cerca de 43 metros de altura e, novamente, estando no Rio, alguns de vocês foram visitar a estátua gigante de Cristo. Eles se comparam em altura. Na verdade, o Cristo é menor do que o telescópio será.O telescópio é comparável, em tamanho, à Estátua da Liberdade. Ele ficará dentro de um gabinete de 22 andares, 60 metros de altura, mas é uma construção incomum para proteger esse telescópio. Terá janelas abertas para o céu, poderá apontar para o céu e observá-lo, e girará numa base; 2 mil toneladas de construção giratória.

 

O Telescópio Gigante de Magalhães (Ilustração)

 

O Telescópio Gigante de Magalhães terá uma resolução dez vezes maior do que a do Telescópio Espacial Hubble. Será 20 milhões de vezes mais sensível que o olho humano e, talvez, pela primeira vez, possa encontrar vida em planetas existentes fora de nosso sistema solar. Ele nos permitirá observar o passado, a primeira luz do universo; literalmente o amanhecer do cosmos. O amanhecer cósmico. É um telescópio que nos permitirá enxergar o passado, vermos galáxias como eram no momento em que estavam se formando, os primeiros buracos negros do universo, as primeiras galáxias.

Bem, durante milhares de anos, temos estudado o cosmos, temos nos questionado sobre nosso lugar no universo. Os antigos gregos nos contaram que a Terra era o centro do universo. Quinhentos anos atrás, Copérnico destronou a Terra e pôs o Sol no centro do cosmos. E como aprendemos ao longo dos séculos, desde que Galileu Galilei, cientista italiano, apontou para o céu, pela primeira vez, um telescópio de duas polegadas, sempre que construímos telescópios maiores, aprendemos algo sobre o universo,fizemos descobertas, sem exceção. No século 20, aprendemos que o universo está se expandindo e que o nosso sistema solar não está no centro dessa expansão. Hoje, sabemos que o universo contém cerca de 100 bilhões de galáxias que podemos ver, e que, em cada uma dessas galáxias, há 100 bilhões de estrelas.

Estamos observando agora a imagem mais profunda do cosmos que já foi obtida. Ela foi obtida com a ajuda do Telescópio Espacial Hubble, apontando-o para o que antes era uma região vazia do céu, antes de seu lançamento. Se puderem imaginar esta minúscula área, ela é 50 vezes menor que o tamanho da lua cheia; imaginem uma lua cheia. E hoje existem 10 mil galáxias visíveis dentro dessa imagem. E a distorção dessas imagens e o tamanho minúsculo significam que essas galáxias estão muito distantes, a distâncias gigantescas. Cada uma dessas galáxias pode conter bilhões ou até centenas de bilhões de estrelas. Os telescópios são como máquinas do tempo. Quanto mais distante olhamos no espaço, mas distante voltamos no tempo. Eles são como baldes de luz, literalmente coletando luz. Quanto maior o balde, quanto maior o espelho que temos, mais luz podemos ver e mais distante no passado podemos ver.

 

A astrônoma do Observatório Carnegie, Wendy Freedman

 

No último século, aprendemos que existem objetos exóticos no universo, buracos negros. Aprendemos até que existem matéria escura e energia escura, que não podemos enxergar. Agora vocês estão vendo uma imagem real da matéria escura.

Vocês entenderam. Nem todas as plateias entendem.

Nós inferimos a presença de matéria escura, pois não podemos vê-la, mas há uma prova contundente, devido à gravidade. Hoje, olhamos lá para fora e vemos um mar de galáxias em um universo que está em expansão.

O que eu faço é mensurar a expansão do universo e um dos projetos que conduzi na década de 90 usou o Hubble para medir a velocidade de expansão do universo. Hoje, podemos enxergar 14 bilhões de anos no passado. Aprendemos, com o tempo, que as estrelas têm histórias próprias, ou seja, elas nascem, chegam à meia-idade e algumas têm até mortes dramáticas. As brasas dessas estrelas, na verdade, formam as novas estrelas que vemos, e a maioria destas tem planetas orbitando-as.

Um dos resultados realmente surpreendentes nos últimos 20 anos foi a descoberta de outros planetas orbitando outras estrelas. São os chamados planetas extrassolares. Até 1995, sequer sabíamos da existência de qualquer outra planeta, além dos que orbitam o nosso Sol. Mas há quase 2 mil outros planetas, orbitando outras estrelas, que hoje podemos detectar, cuja massa podemos medir. Há 500 desses que estão em sistemas de múltiplos planetas. Há 4 mil outros candidatos, e este número está crescendo, a planetas que orbitam outras estrelas. São planetas bem variados, de tipos diversos. Há planetas parecidos com Júpiter que são quentes. Há outros planetas que são congelados, há mundos aquáticos e há planetas rochosos como a Terra, chamados de "Superterras", e há até planetas que especula-se serem mundos de diamante.

8:52Sabemos que há pelos menos um planeta, nossa própria Terra, no qual há vida. Já até descobrimos planetas que orbitam duas estrelas. Isso não é mais algo de ficção científica. Em nosso próprio planeta, sabemos que há vida, desenvolvemos vida complexa, podemos questionar nossas próprias origens. Considerando tudo que descobrimos, os números esmagadores sugerem que talvez haja milhões, quem sabe até centenas de milhões, de outras estrelas próximas o bastante, à distância ideal dos planetas que as orbitam, a ponto de estes conterem água líquida e talvez poderem abrigar vida. Hoje nos maravilhamos com essas probabilidades tremendas, e o incrível é que, na próxima década, o TGM talvez consiga captar o espectro das atmosferas desses planetas e determinar se eles têm potencial para abrigar vida.

Então, o que é o projeto TGM? É um projeto internacional. Ele inclui Austrália, Coreia do Sul e fico feliz por dizer, estando aqui no Rio, que nosso mais novo parceiro em nosso telescópio é o Brasil.

Também participam algumas instituições dos Estados Unidos, inclusive a universidade Harvard, as instituições Smithsonian e Carnegie e as universidades do Arizona, de Chicago, Texas-Austin e Texas A&M. O Chile também participa.

A fabricação dos espelhos desse telescópio também é fascinante por si só. Pegue pedaços de vidro, derreta-os numa fornalha giratória. Tudo acontece embaixo do estádio de futebol da universidade do Arizona, escondido sob 52 mil assentos. Ninguém percebe. É basicamente um caldeirão giratório. Os espelhos são moldados e resfriados bem devagar, sendo depois polidos com requinte de precisão. Para se ter uma ideia da precisão desses espelhos, as ondulações no espelho, ao longo de todos os quase 8,4 metros, chegam a menos de 1 milionésimo de polegada. Para se ter uma ideia... Ai!

Cinco mil vezes menor que a espessura de um fio de cabelo meu, em toda essa área de 8,4 metros. Um feito espetacular. É isso que nos dará a precisão que teremos.

Mas o que ganhamos com essa precisão? O TGM, para se ter uma ideia... se eu segurar uma moeda, que por acaso tenho aqui, e olhar para ela, posso ver daqui o que está escrito nela, posso ver o rosto gravado nela. Aposto que vocês que estão na primeira fila não conseguem ver. Mas se virássemos o Telescópio Gigante de Magalhães, todos os 24,4 m de diâmetro que temos neste auditório, e o apontássemos a 322 km de distância, se eu estivesse em São Paulo, poderíamos enxergar o que há nesta moeda. Esses são o poder e a resolução extraordinários desse telescópio. Se eu...

Se um astronauta estivesse na Lua, a quase 400 mil km de distância, e acendesse uma vela, uma única vela, conseguiríamos detectá-la, usando o TGM. Extraordinário.

Esta é uma imagem simulada de um aglomerado em uma galáxia próxima; "próxima" em termos astronômicos; relativamente próxima. Está a dezenas de milhões de anos-luz de distância. É assim que veríamos esse aglomerado. Vejam só aqueles quatro objetos brilhantes e vamos compará-la à imagem da câmera do Telescópio Espacial Hubble. Podemos ver detalhes distorcidos que começam a ficar visíveis. E, finalmente, vejam só que incrível: é isso que o TGM verá. Continuem olhando as imagens brilhantes. É isso que vemos em um dos mais poderosos telescópios existentes na Terra. Isso, mais uma vez, é o que veremos com o TGM. Precisão extraordinária. Então, a que pé estamos?

Já nivelamos o topo da montanha, no Chile. Retiramos o cume. Testamos e polimos o primeiro espelho. Já moldamos o segundo e o terceiro espelho. Estamos prestes a moldar o quarto espelho. Tivemos uma série de avaliações neste ano, jurados internacionais que vieram e nos avaliaram, e disseram: "Estão prontos para começar a construir". Planejamos construir esse telescópio com os primeiros quatro espelhos. Queremos pô-lo em uso logo e coletar dados científicos, aquilo que nós, astrônomos, chamamos de "primeira luz", em 2021. O telescópio estará totalmente pronto em meados da próxima década, com todos os sete espelhos.

Agora estamos prontos para ver o passado do universo, a grandes distâncias, o amanhecer cósmico. Poderemos estudar outros planetas com requinte de detalhes.

Mas, para mim, umas das coisas mais empolgantes na construção do TGM é a oportunidade de descobrir algo que desconheçamos, que sequer possamos imaginar, algo totalmente novo. Espero, com a construção dessa e de outras instalações, que muitos jovens, rapazes e moças, sejam inspirados a alcançar as estrelas.

Muito obrigada.

Bruno Giussani: Obrigado, Wendy. Fique comigo. Tenho uma pergunta para você. Você mencionou diferentes instalações. O Telescópio de Magalhães vai funcionar, mas também o ALMA e outros, no Chile e em outros lugares, inclusive no Havaí. Trata-se de cooperação e complementariedade, ou de competição? Sei que há concorrência em termos de financiamento, mas e a ciência?

Wendy Freedman: Quanto à ciência, a coisa é bem complementar. Os telescópios que estão no espaço e aqui na Terra, com diferentes capacidades de comprimento de onda, telescópios até similares, mas com diferentes instrumentos, todos eles vão analisar partes distintas das perguntas que temos. Quando descobrirmos outros planetas, poderemos testar essas observações, poderemos mensurar as atmosferas, poderemos observar o espaço com resolução bem alta. São bem complementares. Tem razão, competimos quanto ao financiamento, mas, cientificamente, a coisa é bem complementar.

BG: Wendy, muito obrigado por ter vindo ao TEDGlobal.

WF: Obrigada

 

iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista:

Comentários

Os comentários aqui postados expressam a opinião dos seus autores, responsáveis por seu teor, e não do 247

continua após o anúncio

Ao vivo na TV 247

Cortes 247