O fim do gelo no Ártico. A diminuição da calota polar vista em time-lapse

Video de animação resume o dramático encolhimento do gelo no Oceano Ártico nos últimos 27 anos. Mostra que o aquecimento global é real e seus efeitos são assustadores.

Video de animação resume o dramático encolhimento do gelo no Oceano Ártico nos últimos 27 anos. Mostra que o aquecimento global é real e seus efeitos são assustadores.
Video de animação resume o dramático encolhimento do gelo no Oceano Ártico nos últimos 27 anos. Mostra que o aquecimento global é real e seus efeitos são assustadores. (Foto: Gisele Federicce)


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Por: Luis Pellegrini

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Recentemente tivemos a confirmação: 2014 foi o ano mais quente desde que, há mais de um século, iniciaram as aferições científicas regulares das temperaturas mundiais. A situação é grave e até mesmo alarmante em todas as partes do mundo. Basta ver o que acontece neste momento aqui no Brasil, onde alguns dos mais importantes reservatórios hídricos estão a ponto de colapsar. Apesar disso, a situação na região do Polo Norte é ainda mais crítica e ameaçadora.

No vídeo-animação mais abaixo, produzido pela National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) norte-americana, vemos o progressivo encolhimento dos gelos árticos, de 1987 a novembro de 2014. Trata-se de um time-lapse realmente angustiante.

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Morsa mostra suas enormes presas.

 

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No vídeo, as diferentes cores representam a idade do gelo presente: em branco vemos o gelo mais velho (com 4 anos ou mais), importante pelo fato de ser mais espesso e potencialmente mais resistente ao aumento da temperatura durante o verão; em azul, o gelo mais recente, com menos de um ano de idade, formado no último inverno (entre 2013 e 2014). Este último gelo é o primeiro a se derreter quando chegam os meses quentes (entre abril e setembro no Hemisfério Norte).

No passado, a cada inverno, o gelo marinho preenchia quase toda a bacia ártica, e uma parte dele se derretia durante o verão. Nesses tempos, normalmente, o gelo mais fino começava a mover-se em uma corrente fria, chamada Beaufort Gyre; nessa corrente, a parte gelada que conseguia permanecer assim durante o verão, tendia no inverno a se tornar mais espessa e menos vulnerável às mudanças climáticas.

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A camada de gelo como era observada em 1980 (abaixo) e em 2012 (acima). Foto NASA por satélite

 

Diminuição progressiva e contínua

Mas, a partir dos anos 2000, segundo a NOAA, a própria Beaufort Gyre se aqueceu, perdendo boa parte do seu papel de guardiã dos gelos. Se nos anos 80 o gelo mais velho constituía cerca de 26% do total, em 2014 esse índice chegou a apenas 10%. Houve, é verdade, um pequeno aumento dos gelos entre os anos 2013 e 2014, mas nada significativo a ponto de estimular nosso otimismo: o declínio dos gelos árticos é constante e inexorável.

 

O encanto de um casal de papagaios-do-mar

 

Consequências? São várias, e todas muito preocupantes. Em primeiro lugar, teme-se que o derretimento da calota de gelo ártico libere os imensos depósitos de gás metano que se encontram no fundo do Oceano Ártico. O metano é um gás de efeito estufa de efeito vinte vezes maior do que o gás carbônico (CO2). Lançado na atmosfera, todo esse metano pode incrementar de forma exponencial o aquecimento global, elevando a temperatura média do planeta a níveis insuportáveis. Além disso, o derretimento das geleiras árticas, e da própria cobertura de gelo do norte do Canadá e da Groenlândia, lançaria nos oceanos uma gigantesca quantidade de água doce, aumentando o nível dos mares e diminuindo a salinidade deles. Neste caso, as consequências sobre a fauna e a flora marinha são imprevisíveis.

 

Um narval macho singra as águas geladas do Ártico

Vídeo 1: Idade do gelo ártico, 1987-2014

Há décadas, a maior parte da calota polar durante o inverno no Ártico era constituída de gelo duro, espesso e perene. Hoje, encontrar áreas onde ainda exista esse gelo velho é extremamente raro. Este vídeo-animação mostra a quantidade relativa de gelo durante os diferentes anos e estações de 1987 até novembro de 2014. O vídeo foi produzido pelo climate.gov team, que trabalhou com dados fornecidos pelo climatologista Mark Tschudi.

 

Vídeo 2: Maior colapso de gelo já registrado da história é de tirar o fôlego

Imagine um pedaço inteiro do distrito de Manhattan, em Nova York, ou de toda a região central de São Paulo entrando em colapso, com seus prédios desabando como fileiras de dominó. Esta é uma comparação que serve para dar uma referência humana ao devastador rompimento de blocos do glaciar Ilulissat, ocorrido há um ano, no oeste da Groenlândia, e que durou 75 minutos. Trata-se da maior partição de gelo já registrada em toda a história. As imagens foram gravadas pelos documentaristas do projeto Pesquisa Extrema no Gelo Balog, e as cenas estão no filme “Chasing Ice”, do fotógrafo James Balog.

Estima-se que a área atingida é equivalente à ponta sul de Manhattan: um pedaço em torno de 5 quilômetros de comprimento e 3,5 quilômetros de largura. Isso sem falar que a espessura do gelo que se soltou é de mais de 900 metros - 100 metros fora d'água e o restante submerso.

As espetaculares imagens e o som impressionante são de tirar o fôlego. O silêncio do deserto de gelo é, literalmente, quebrado pela queda de gigantescos nacos de gelo que são devorados pelo mar. O barulho provocado pelo ato incontrolável da natureza ao mesmo tempo provoca admiração e espanto e nos relembra como somos frágeis diante das forças do nosso planeta.

 

 

Galeria: Maravilhas do Ártico ameaçadas pelo aquecimento

Diferente do que muitos pensam, o Ártico não é uma espécie de deserto gelado. Pelo contrário, ele está cheio de vida, povoado por criaturas que souberam se adaptar às difíceis condições climáticas da região. Claro, em termos de populações vivas, a maior parte delas está no mar. Mas o Ártico hospeda também vários mamíferos e pássaros. Esta galeria de imagens mostra algumas espécies de animais do Ártico, todas elas ameaçadas pelas mudanças climáticas atualmente em curso na região.

No gelo perene do Polo Norte, no transcorrer dos milênios, essas espécies souberam construir um delicadíssimo ecossistema. Mas ele, cada vez mais, se transforma e perde sua eficácia, quase sempre por causa da intervenção do homem. Segundo recente relatório do Circumpolar Biodiversity Monitoring Programme, denominado Arctic Species Trend Index (ASTI), o número dos animais que povoam as regiões árticas aumentou globalmente cerca de 16% nos últimos 40 anos. Isso se deve sobretudo à difusão de severas leis restritivas relacionadas à caça. Apesar disso, nem todas as espécies vivem essa bonança. Algumas foram lit4eralmente dizimadas por causa do aquecimento global. Quem ascende e quem descende nesse triste boletim das extinções? Quais são as táticas de sobrevivência desses habitantes do Polo Norte? Aqui segue uma galeria com dez casos curiosos de adaptabilidade e sobrevivência.

 

1 Papagaio-do-mar ou fradinho. Entre as espécies árticas que melhor se adaptam às novas condições climáticas e cujo número continua a crescer está o papagaio-do-mar, também conhecido como fradinho (Fratercula arctica), uma ave bela e engraçada que povoa os penhascos da Groenlândia e do norte do Canadá. Um fator essencial para a sua sobrevivência é a abundância de pequenos peixes, moluscos e crustáceos. Como mostra a foto, esse pássaro consegue abocanhar vários peixinhos de uma única vez. Quando pesca, o papagaio-do-mar primeiro enche o papo para si mesmo, e depois reúne uma série de peixinhos no bico e os leva aos filhotes.

 

Bowhead whale rises to the surface of the sea. (Photo by Paul Nicklen)

 

2 Baleia da Groenlândia (Balaena mysticetus). Ela é a prova viva da importância das campanhas em defesa dos cetáceos. Com efeito, o número dessas baleias, antes seriamente ameaçadas de extinção, aumentou. Entre 1970, quando iniciaram as campanhas, e 2004, seu número cresceu regularmente de cerca 3% ao ano. Para se defender dos ataques do homem, seu único inimigo, essa baleia não lança mão apenas do seu tamanho (entre 14 e 18 metros, a segunda maior depois da baleia azul). Ela usa também a sua astúcia: quando percebe a presença de navios, permanece escondida sob a superfície das grandes placas de gelo da calota polar. Quando precisa respirar, não sai do seu refúgio mas arrebenta o gelo dando pancadas com seus grandes ossos do crânio, criando um buraco por onde consegue fazer passar o ar.

 

3 Águia-do-rabo-branco. Também se adapta bem às novas condições, e seu número cresce. Essa águia (Haliaeetus albicilla) é no entanto um rapace muito raro. Estima-se que em todo o Ártico restam apenas entre 20 e 30 mil exemplares. Na foto, uma águia-do-rabo-branco tenta agarrar um peixe, enquanto uma gaivota (Larus canus) se posiciona para tentar roubar-lhe a presa.

 

4 Raposa do Ártico (Alopex lagopus). Nos próximos anos, a existência dessa raposa estará seriamente ameaçada pela grande diminuição das populações dos lemingues, pequenos roedores árticos que constituem a sua principal fonte de alimento. Na falta de um lemingue, o exemplar da foto se contata em roer a carcaça de um cetáceo.

 

5 O caribu (Rangifer tarandus). Se, devido ao aumento da temperatura média, a população global dos animais árticos está em aumento, o mesmo não se pode dizer das espécies que vivem no extremo norte da região, nas vizinhanças do Polo Norte. Ali, desde 1970, observa-se uma queda progressiva do número de vertebrados de cerca 26%. A culpa, segundo os especialistas, é mesmo do aquecimento global, fenômeno particularmente intenso naquela área. O animal que mais sofre com isso é o caribu, cujos rebanhos já diminuíram de uma terça parte.

 

6 Urso-marrom (Ursus arctos). Menos famoso do seu primo de pelagem branca (Ursus marinus), o urso marrom também corre sério perigo. As intervenções do homem em seu meio ambiente o privou de vastas porções do seu habitat natural, confinando a quase totalidade dos exemplares restantes a um areal estéril que corresponde a apenas 2% da área original que esses ursos ocupavam. Ainda mais dramática é a situação dos ursos brancos na Baía de Hudson, Canadá. Aqui, a rapidez com que o gelo derrete devido ao aquecimento global aprisiona os últimos exemplares em porções exíguas do território, obrigando-os a longos jejuns e inclusive, como foi comprovado, a casos de canibalismo.

 

7 Lebre-do-Ártico (Lepus arcticus). O declínio de herbívoros como a lebre ártica é devido às mudanças que ocorrem na vegetação da tundra e à flutuação dos ritmos sazonais causada pelas mudanças climáticas. A chegada pontual da primavera é fundamental para este mamífero, aqui fotografado no momento em que muda a pelagem branca, adequada ao inverno, por uma bem mais escura e mimética, que no verão serve para proteger o animal contra os predadores.

 

8 Glutão ou carcaju (Gulo gulo). Mamífero da família dos mustelídeos, o glutão é um animal onívoro, embora a carne seja o principal elemento da sua dieta. Caçado sobretudo por causa da sua pele, é um animal que aprendeu que, para sobreviver, é preciso mostrar as garras. Quando sente fome, esse mamífero não hesita em atacar animais cinco vezes maiores que o seu tamanho, tais como alces, cervos e renas. Quando sobra um pouco de comida, o glutão a conserva sob a neve, depois de ter borrifado sobre os restos substâncias malcheirosas que os tornam repulsivos aos outros carnívoros.

 

Morsas descansam na banquisa polar

9 Morsa (Odobenus rosmarus). Os grandes pedaços de gelo flutuante nas proximidades do litoral ártico são o habitat preferido das morsas. Esses grandes mamíferos marinhos fazem os seus ciclos migratórios em função das variações sazonais da temperatura.  Quando no verão o gelo se retira, as morsas migram para o norte. No inverno, quando o gelo se expande, elas voltam ao sul, perfazendo entre a ida e a volta trajetos que podem chegar a três mil quilômetros.

 

10 Narval (Monodon monóceros). O narval, curioso cetáceo ártico dotado de uma lança frontal que pode chegar a três metros de comprimento, é outro animal particularmente ligado às variações da expansão e retração do gelo. A lança, que é na verdade um dente modificado característico dos machos, condena esse animal a uma fuga constante dos caçadores inuit (os antigos esquimós) que o utilizam para a produção de peças artesanais, além de comerem a sua carne. Os biólogos ainda discutem a verdadeira função da lança: parece que mais que arma de combate, trata-se simplesmente de um adereço sexual útil para atrair a atenção das fêmeas.

 

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