Nigéria: Uma estrela sobe na África. Apesar do Boko Haram

Graças a uma reavaliação do seu PIB, a Nigéria agora está à frente da África do Sul na corrida pela supremacia econômica no continente. Mas as consequências disso são, antes de tudo, políticas

Graças a uma reavaliação do seu PIB, a Nigéria agora está à frente da África do Sul na corrida pela supremacia econômica no continente. Mas as consequências disso são, antes de tudo, políticas
Graças a uma reavaliação do seu PIB, a Nigéria agora está à frente da África do Sul na corrida pela supremacia econômica no continente. Mas as consequências disso são, antes de tudo, políticas (Foto: Gisele Federicce)


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Área central de Lagos, Nigéria.

 

 

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Site: Simon Allison, Daily Maverick, Johanesburgo

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Há anos a Nigéria prometia rever a base de cálculo do seu produto interno bruto (PIB). A maioria dos países faz isso regularmente, com poucos anos de intervalo, para garantir que as suas estatísticas permanecem confiáveis. A economia evolui e os cálculos têm de se adaptar para refletir essas mudanças.

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A Nigéria, no entanto, não revia o seu modo de cálculo desde 1993, o que significa que o valor dos bens nigerianos ainda se baseava nos preços de 1990. Não só os cálculos levavam a uma sub avaliação dos setores econômicos que já existiam em 1993, como não consideravam as novas indústrias, tais como as de telecomunicações e a aviação, além da produção musical e cinematográfica (Nollywood,como é chamada a indústria nigeriana de cinema, produz hoje mais filmes do que qualquer outro país no mundo).

 

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A Mesquita Nacional de Abuja, Nigéria

 

O problema já era conhecido há muito tempo, mas nada foi feito, e a culpa sempre foi daquele misto de burocracia e ineficiência que impede a economia nigeriana de tirar completo partido do seu potencial.

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Por vezes, ter uma economia oficialmente modesta interessava à Nigéria, pelo menos no papel: quanto mais um país é oficialmente pobre, mais volumosas são as ajudas ao desenvolvimento e o alívio da dívida a que poderá aspirar. Ainda assim, o Gabinete Nacional de Estatística da Nigéria acabou por se recompor e, a 6 de abril, publicou os seus novos números.

O choque foi real e esteve à altura das expectativas. A estimativa do PIB do pais em 2013 deu um prodigioso salto de 57%, passando de 292 para 510 bilhões de dólares (368 bilhões). Tal progressão não é invulgar: quando Gana reviu os seus números, em 2010, o seu PIB aumentou 60%.

 

Moda é coisa séria para as classes mais abastadas da NIgéria. A fashion week de Lagos atrai grifes do mundo todo

 

Salto não põe dinheiro nas contas

 

A África do Sul é a vítima mais imediata desses novos cálculos. Com um PIB de 353 bilhões de dólares em 2013, perde de forma inequívoca a sua posição de maior economia da África. Essa honra cabe agora à Nigéria, embora os analistas questionem se terá algum valor real.

Bismarck Rewanc, reputado economista nigeriano, declarou à BBC que o novo PIB não foi mais do que pura “vaidade”. “A população nigeriana não irá viver melhor amanhã", sublinhou o especialista. “Este anúncio não coloca mais dinheiro nas contas bancárias nem mais comida nos estômagos. A rigor, não muda nada."

 

As praias nigerianas estão entre as mais bonitas de toda a África Ocidental

 

Decerto que, ao longo dos últimos dez anos, o crescimento econômico nigeriano foi muito rápido: cerca 7% ao ano. A África do Sul, pelo contrário, estagnou, com uma taxa média de pouco mais de 3%. Acontece, contudo, que o crescimento da Nigéria assenta quaseinteiramente nas suas gigantescas riquezas petrolíferas, das quais a população tira pouco proveito (o mesmo se poderia dizer da África do Sul e das suas riquezas mineiras, mas, apesar de tudo, a sua economia é muito mais diversificada). Seja como for, a reviravolta da hierarquia econômica africana não é desprovida de consequências.

 

Loja de um dos shoppings centers de Lagos

 

Quem, afinal, representa a África no G20?

 

Se a economia nigeriana superar a da África do Sul, colocar-se-á a questão de saber quem deve estar no G20 e nos BRICS. Num artigo sobre o assunto publicado em 2012, o professor de economia sul-africano Danny Bradlow já declarava ao Daily Maverick que daqui poderiam resultar importantes repercussões na cena diplomática. "A África do Sul faz parte do G20 [que reúne os governos das maiores economias do mundo] e dos BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), por ser a maior economia da África", dizia ele. "Se a economia nigeriana se tornar mais importante do que a da África do Sul, colocar-se-á a questão de saber quem deve estar representado no seio dessas organizações."

 

Como no Brasil, o futebol é paixão nacional na Nigéria

 

Ambos os países almejam uma posição permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas – supondo que a ONU seja algum dia reformada e que um pais africano seja convidado a sentar-se a essa nobre mesa. Presentemente, os argumentos da Nigéria, país mais populoso da África e agora, também o mais rico, tornam-se bastante mais convincentes. Os dois países estão, portanto, envolvidos numa disputa diplomática pelo titulo de superpotência de África.

 

Como no Brasil, na periferia das grandes cidades nigerianas a opulência cede lugar à extrema miséria

 

Desigualdade e pobreza

 

“Graças à revisão do seu PIB, a Nigéria galgou, de um dia para o outro, 12 lugares na classificação mundial das nações: o país ocupa agora a 21a posição em termos de economia, atrás da Polônia e da Noruega, mas à frente da Bélgica e de Taiwan, realça o jornal The Economist. “A população nigeriana no entanto continua a ser muito pobre. O PIB per capita pode ter duplicado, mas continua modesto (3000 dólares) e muito inferior ao da África do Sul (7336 dólares)”, relativiza o jornal The britânico The Guardian.

 

Os nigerianos às vezes têm estranhos animais de estimação. O da foto exibe os belos dentes da sua hiena

 

Na classificação estabelecida em função do Índice de Desenvolvimento Humano levada a cabo pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o país surge na 153a posição entre 187. Entre 2004 e 2010 a proporção de nigerianos que vivem com menos de 1 dólar por dia passou de 5% para 67%, segundo o mais recente inquérito do Gabinete Nacional de Estatística. "As desigualdades aumentaram", reconhece a ministra das Finanças, Ngoz¡ Okonjo-lweala. "Temos de trabalhar muito para melhorar as infraestruturas e a governança, lutar contra a corrupção e construir um sistema de proteção social para cuidar daqueles que estão no fundo da escala."

O irônico é que essa luta acontece nos bastidores das negociações para um lugar que ainda não existe no Conselho de Segurança; ela é flagrante nas tentativas de assumir o controle da comissão da União Africana, finalmente obtido (depois de quatro sessões de votação, em julho de 2012) pela sul-africana Nkosaza-na Dlamini-Zuma.

 

O trânsito em Abuja (na foto) e em Lagos pode ficar realmente parado nas horas de pico

 

Ao reivindicar o título de maior economia da África, a Nigéria não altera em nada a sua situação económica. Limitou-se a reorganizar os números numa folha de cálculo. Mas melhora significativamente a sua capacidade de lutar pela liderança política da África. A África do Sul tem com que se inquietar: tal como a sua supremacia econômica, a sua autoridade sobre o continente vacila.

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