Crianças superprotegidas, adultos frágeis

Muitos pais privam os filhos da possibilidade de enfrentar riscos, tanto físicos quanto emocionais. Qual é o limite sadio entre simples supervisão e controle das atividades dos filhos? Retrato dos “pais helicópteros”, e conselhos úteis para você não se tornar um deles

Muitos pais privam os filhos da possibilidade de enfrentar riscos, tanto físicos quanto emocionais. Qual é o limite sadio entre simples supervisão e controle das atividades dos filhos? Retrato dos “pais helicópteros”, e conselhos úteis para você não se tornar um deles
Muitos pais privam os filhos da possibilidade de enfrentar riscos, tanto físicos quanto emocionais. Qual é o limite sadio entre simples supervisão e controle das atividades dos filhos? Retrato dos “pais helicópteros”, e conselhos úteis para você não se tornar um deles (Foto: Gisele Federicce)


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Por Stefania Medetti, jornal La Repubblica

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Os americanos os chamam “helicopter parents”, pais helicópteros. São aqueles pais que, silenciosamente, vigiam à distância os seus filhos, quando brincam, quando interagem com os outros, quando escolhem o que irão vestir naquela manhã. Aqueles pais que, se nos olharmos sinceramente no espelho, teremos grande chance de vê-los refletidos. “Nos tornamos tão obcecados pela segurança que, já de cara, privamos nossos filhos da possibilidade de assumir riscos e de pagar pelas suas consequências, tanto a nível físico quanto emocional”, explicou a psicóloga social Hanna Rosin, autora de um artigo sobre crianças superprotegidas, recentemente publicado na prestigiosa revista The Atlantic.

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Rosin ressalta as incríveis mudanças ocorridas no decorrer da última geração: “Comportamentos considerados paranoicos nos anos Setenta, como acompanhar à escola crianças que já estão no terceiro ano fundamental, ou proibir o jogo de bola nas ruas, hoje constituem a regra. São, por sinal, considerados um sinal de responsabilidade paternal”. 

A medida da postura hiperprotetora a que se chegou pode ser lida naquele espaço reservado por excelência à liberdade que são os jogos e os folguedos infantis. Recente estudo da Universidade da Califórnia (Ucla), por exemplo, certifica que os filhos das famílias de classe média de Los Angeles passam 90% do seu tempo livre trancados em casa, empenhados em atividades como olhar televisão, jogar videogames e usar o computador. No espaço aberto, os espaços para jogos e brincadeiras reservados às crianças são seguros, edulcorados, coloridos, homogeneizados e previsíveis, e também destituídos de qualquer desafio.

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Em Wrexham, na região norte do País de Gales, o parque “The Land” é uma exceção à essa regra hoje mundial. Esse parque é um caleidoscópio de materiais que foram jogados fora, prontos para serem reciclados. “Nesse espaço, as crianças não precisam se adequar ao sentido de ordem dos adultos, mas podem modificar tudo aquilo que quiserem. Não existe um valor monetário atribuído aos materiais, e as crianças podem construir e destruir. A brincadeira que resulta disso é uma criação coletiva, uma co-criação”, explica Claire Griffiths, gerente do The Land. A instituição acaba de ser premiada entre os melhores parques de diversão do Reino Unido pela Sport and Recreation Alliance. The Land, além disso, não foi pensado de modo a separar as crianças com base na faixa etária: “Uma das maiores satisfações é ver as crianças chegarem sozinhas e desenvolverem dentro de poucos dias uma verdadeira rede de amigos”, completa Griffiths, coisa que nem sempre pode ser dita da imensa maioria dos espaços para brincadeiras nas cidades modernas, que tendem a segmentar e a separar grupos de pequenos e de grandes, e não facilitam as trocas.

 


Seis comportamentos irresistíveis

 

Essas opções que anulam os riscos não são, na realidade, destituídas de contra indicações. Segundo Ellen Sandseter, professora de educação da primeira infância no Queen Maud University College de Trondheim, na Noruega, as crianças têm uma necessidade sensorial de experimentar o perigo e a excitação que dele deriva. “Não se trata de coisas perigosas em si mesmas, mas sim de experiências que, do ponto de vista das crianças, parecem perigosas”, completa Ellen Sandeter.

Autora do ensaio “As brincadeiras de risco das crianças a partir de um ponto de vista evolutivo: O efeito antifóbico das experiências excitantes”. Sandeter evidencia no ensaio seis comportamentos “arriscados” que exercem grande fascínio sobre nossos filhos, a sua possível função e seu consequente efeito antifóbico. Por exemplo, andar depressa ajuda a desenvolver a percepção espacial e redimensiona o medo de enfrentar as próprias emoções. Os outros comportamentos irresistíveis são: enfrentar as altitudes; manipular instrumentos; estar perto de forças da natureza, como a água, o fogo ou um precipício; brincar de luta e explorar um território por conta própria.

 

 

Como escreveu o teórico holandês Johan Huizinga, “a brincadeira serve para alguma coisa que não é brincadeira” , e enfrentar um obstáculo que, do próprio ponto de vista, parece arriscado e superá-lo, permite às crianças construir coragem e incrementar o sentimento de segurança e confiança em sua própria capacidade de enfrentar os problemas. “Embora sem o querer, pais excessivamente presentes e protetores produzem crianças e adolescentes que têm muita dificuldade de perceber a si próprios e de pensar em si mesmos como pessoas autônomas, com características e limites próprios”, observa Francesca Broccoli, psicóloga e psicoterapeuta italiana.

Privar as crianças da possibilidade de enfrentar desafios e correr riscos quando brincam pode ter consequências a longo prazo: “As crianças que não puderam experimentar, conhecer a si mesmas e os seus próprios limites serão pessoas frágeis, com pouca autoestima. Recordemos, para começar, que ser sempre protegido significa ser desvalorizado e não reconhecido como adequado, capaz e competente”, prossegue Broccoli. Essa fragilidade poderá se exprimir através de comportamentos de passividade, insegurança, dependência, e também através de repetidos fracassos, raiva, atitudes desafiadoras e provocadoras, incapacidade de tolerar qualquer frustração.

 

Capa da revista The Atlantic, contendo matéria sobre crianças superprotegidas

 

Por fim, quando se passa da simples supervisão ao controle, o resultado é coisa que não faz bem nem sequer às mães. Pesquisa da University of Mary Washington, publicada no Journal of Child and Family Studies, com efeito, evidenciou como uma maternidade “intensiva” – feita de estímulos constantes e incapacidade de delegar a supervisão dos filhos – se traduza em uma sobrecarga psicológica que impacta sobre a saúde mental das mães. “A sugestão mais importante para os genitores é a de confiar nos próprios filhos, no fato que não se farão mal deliberadamente e no fato de que devem experimentar o risco para aprender a superá-lo”, conclui Griffiths.

 

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