Como superar os preconceitos. Caminhe corajosamente em direção a eles
Nossos preconceitos podem ser perigosos, até mortais; como vimos nos casos de Michael Brown em Ferguson, Missouri e Eric Garner, em Staten Island, Nova Iorque. A defensora da diversidade Verna Myers observa atentamente algumas das atitudes inconscientes que temos para com os grupos excluídos.
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Vídeo: TED – Ideas Worth Spreading
Tradução: Maricene Crus. Revisão: Gustavo Rocha
A advogada norte-americana Verna Myers faz um apelo a todas as pessoas: reconheça seus preconceitos. Depois, caminhe em direção, não para longe, dos grupos que fazem com que você se sinta desconfortável. Em uma palestra engraçada, apaixonada e importante, ela nos mostra como fazê-lo.
Verna Myers é advogada e consultora na área da diversidade, sobretudo no ambiente de trabalho. Formada em ciências jurídicas pelas Universidade Harvard, ela dirige o Verna Myers Consulting Group, uma organização que tem desenvolvido importantes ações para a quebra das barreiras raciais, étnicas, de gênero e de orientação sexual em mais de mil empresas e organizações diferentes. É autora do bestseller Moving Diversity Forward: How to Go from Well-Meaning to Well-Doing.
Myers nos encoraja a reconhecer nossos próprios preconceitos, de modo a que nos seja possível combatê-los.
Vídeo: Na janela inferior do vídeo solicite legendas em português brasileiro.
Tradução integral da palestra de Verna Myers no TED:
Eu estava numa viagem longa nesse verão e estava me divertindo muito, ouvindo o livro incrível de Isabel Wilkerson "O Calor de Outros Sóis". Ele documenta 6 milhões de negros fugindo do Sul de 1915 a 1970 buscando um refúgio de toda a brutalidade e tentando encontrar uma oportunidade melhor no Norte, e ele estava repleto de histórias sobre a resiliência e esplendor dos afro-americanos, e era também muito difícil ouvir todas as histórias dos horrores e da humildade e todas as humilhações.
Foi especialmente difícil ouvir sobre os açoitamentos e queimaduras e os linchamentos de homens negros. E eu disse: "Sabem, isso é um pouco profundo. Eu preciso de um tempo. Vou ligar o rádio." Eu o liguei e lá estava: Ferguson, Missouri, Michael Brown, um negro de 18 anos de idade, desarmado, baleado por um policial branco, caído no chão, morto, sangue escorrendo por quatro horas enquanto sua avó e criancinhas e seus vizinhos observavam horrorizados e eu pensei: aqui está novamente. Essa violência, essa brutalidade contra homens negros vem acontecendo há séculos. Quero dizer, é a mesma história. Apenas com nomes diferentes. Poderia ter sido Amadou Diallo. Poderia ter sido Sean Bell. Poderia ter sido Oscar Grant. Poderia ter sido Trayvon Martin.
Essa violência, essa brutalidade, é algo que é realmente parte da nossa psique nacional. É parte da nossa história coletiva. O que nós vamos fazer a respeito? Sabem aquela parte de nós que ainda cruza a rua, tranca as portas, agarra as bolsas, quando vê um jovem negro? Aquela parte.
Quero dizer, sei que não estamos atirando nas pessoas pelas ruas, mas estou dizendo que os mesmos estereótipos e preconceitos que estimulam aqueles exemplos de incidentes trágicos estão em nós. Nós fomos educados neles também. Eu acredito que possamos impedir esses tipos de incidentes, que esses Fergusons aconteçam, olhando para dentro e estando dispostos a mudar a nós mesmos.
Então tenho um chamado à ação para vocês. Existem três coisas que quero oferecer hoje para refletirmos como maneiras de impedir que Ferguson aconteça novamente; três coisas que eu acho que nos ajudarão a corrigir nossas imagens dos jovens negros; três coisas que eu espero não apenas irão protegê-los mas abrir o mundo para que eles possam prosperar. Vocês podem imaginar isso? Podem imaginar o nosso país incluindo os jovens negros, vendo-os como parte do nosso futuro, dando-lhes o tipo de abertura, um tipo de benevolência que damos àqueles que amamos? Quanto melhor seriam as nossas vidas? Quanto melhor seria o nosso país?
Deixem-me começar com o número um. Temos que nos livrar da negação. Parem de tentar ser boas pessoas. Precisamos de pessoas verdadeiras. Eu faço muitos trabalhos de diversidade e as pessoas vêm até mim no começo dos seminários e dizem: "Oh, Senhorita Diversidade, estamos muitos felizes por estar aqui... (Risos) mas não temos um pingo de preconceito em nosso sangue". E eu digo: "É mesmo? Porque eu faço esse trabalho todo dia e vejo todos os meus preconceitos."
Não faz muito tempo, eu estava num voo e ouvi a voz de uma pilota no sistema de alto-falante, e fiquei muito empolgada e emocionada. Eu pensei: "Mulheres, estamos arrasando. Estamos na estratosfera agora." Estava tudo bem, até que começou a ficar turbulento e instável, e eu pensei: "Espero que ela saiba pilotar." (Risos) Pois é, certo? Mas eu nem sabia que era preconceito até eu voltar o outro trecho da viagem e tem sempre um cara pilotando e é geralmente turbulento e instável e eu nunca questionei a confiança de um piloto. O piloto é bom. Agora, aqui está o problema. Se me perguntarem explicitamente, eu diria: "Uma pilota: incrível!" Mas parece que quando as coisas apertam e ficam um tanto difíceis, arriscadas, eu me apoio em um preconceito que eu nem sabia que tinha. Sabem, aviões rápidos no céu, eu quero um homem. Esse é o meu padrão. Homens são o meu padrão. Quem é o padrão de vocês? Em quem vocês confiam? De quem vocês têm medo? A quem vocês se sentem implicitamente conectados? De quem vocês fogem?
Vou contar a vocês o que descobrimos. O teste implícito de associação, o qual mede preconceito inconsciente, vocês podem fazer on-line. Cinco milhões de pessoas já o fizeram. Verificou-se que nosso padrão é o branco. Nós gostamos de pessoas brancas. Nós preferimos os brancos. O que quero dizer com isso? Quando mostram imagens de homens negros e brancos às pessoas conseguimos associar mais rapidamente aquela foto com uma palavra positiva, a pessoa branca com a palavra positiva, do que quando estamos tentando associar o positivo a um rosto negro e vice-versa. Quando vemos um rosto negro, é mais fácil para nós conectar o negro com o negativo do que é com o branco e o negativo. Setenta por cento das pessoas brancas fazendo aquele teste preferem os brancos. Cinquenta por cento de pessoas negras fazendo aquele teste preferem os brancos. Vejam, todos nós fomos contaminados pelo preconceito.
O que fazemos com o fato de que nosso cérebro associa automaticamente? Sabem, uma das coisas que vocês estão pensando provavelmente, e vocês talvez pensem: "Querem saber? Eu vou simplesmente apostar tudo na indiferença à cor. Sim, vou me comprometer com isso." Vou sugerir isso a vocês? Não. Nós já fomos ao limite tentando fazer uma diferença tentando não ver a cor. O problema nunca foi o de vermos a cor. Era o que fazíamos quando víamos a cor. É um ideal falso. E enquanto estamos ocupados fingindo não ver, não estamos conscientes das maneiras nas quais a diferença racial está mudando as possibilidades das pessoas, que as impedem de prosperar e às vezes causa a morte prematura delas.
Então, na verdade, o que os cientistas estão nos dizendo é: esqueçam. Nem pensem em indiferença à cor. Na verdade, o que eles estão sugerindo é, encarem algumas pessoas negras incríveis. (Risos) Olhem diretamente para os rostos delas e os memorizem, porque quando vocês olham para pessoas incríveis que são negras, isso ajuda a desassociar a associação que acontece automaticamente no nosso cérebro. Por que vocês acham que estou mostrando esses homens negros lindos atrás de mim? Havia tantos que tive que eliminá-los. Certo, então a coisa é: estou tentando restaurar suas associações automáticas sobre quem são homens negros. Estou tentando lembrar vocês de que os jovens negros cresceram para ser seres humanos incríveis que mudaram e melhoraram a nossa vida.
Então, esta é a questão. A outra possibilidade na ciência, está mudando temporariamente nossas suposições automáticas, mas sabemos de uma coisa que se vocês escolherem uma pessoa branca que vocês sabem que é detestável e a colocarem próxima a uma pessoa de cor, uma pessoa negra, que seja fabulosa, isso, às vezes, faz com que desassociemos também. Então pensem em Jeffrey Dahmer e Colin Powell. Simplesmente os encarem, certo? (Risos) Então são coisas assim. Vão procurar o seu preconceito. Por favor, abandonem a negação e procurem dados de divergência que provarão que, na verdade, seus antigos estereótipos estão errados.
Certo, esse é o número um: número dois, o que eu vou dizer é caminhem em direção aos jovens negros e não para longe deles. Não é o mais difícil a se fazer, mas também é uma dessas coisas que vocês têm que ter consciência e a intenção de fazer. Eu estive em uma área da Wall Street uma vez há muitos anos com uma colega minha e ela é realmente maravilhosa e ela faz trabalho de diversidade comigo e é uma mulher de cor, uma coreana. E estávamos lá fora, era tarde da noite, nos questionando onde nós iríamos, estávamos perdidas. Eu vi uma pessoa do outro lado da rua e pensei: "Oh ótimo, um cara negro." Eu estava indo em direção a ele sem ao menos pensar nisso. E ela disse: "Oh, isso é interessante." O cara do outro lado da rua, ele era um cara negro. Eu pensei: "Caras negros geralmente sabem onde eles estão indo." Não sei exatamente por que acho isso, mas é o que eu acho. Então ela disse: "Oh, você foi tipo, 'Oba, um cara negro' e eu disse 'Opa, um cara negro.'" Outra direção. Mesma necessidade, mesmo cara, mesma roupa, mesma hora, mesma rua, reação diferente. Ela disse: "Sinto-me mal. Sou consultora de diversidade. Eu fui preconceituosa. Sou uma mulher de cor. Meu Deus!" Eu disse: "Quer saber? Por favor. Nós precisamos relaxar quanto a isso. Você tem que perceber que eu tenho uma história com caras negros." (Risos) Meu pai é negro. Entende o que estou dizendo? Eu tenho um filho negro de 1,95 m. Eu fui casada com um cara negro. A minha coisa com o negro é tão ampla e tão profunda que eu posso descobrir quem aquele cara é, e ele era o meu cara negro. Ele disse: "Olá, senhoritas, eu sei onde estão indo. Eu levo vocês lá."
Preconceitos são as histórias que inventamos sobre as pessoas antes de sabermos de fato quem elas são. Mas como vamos saber quem elas são quando nos disseram para evitá-las e sentir medo delas? Então vou pedir que caminhem em direção ao seu desconforto. E não estou pedindo que vocês corram riscos loucos. Só estou dizendo, façam um inventário, ampliem os seus círculos social e profissional. Quem está no seu círculo? Quem está faltando? Quantos relacionamentos autênticos vocês têm com jovens negros, pessoas, homens, mulheres? Ou qualquer outra grande diferença de quem vocês são e como vocês se comportam, digamos? Porque, querem saber? Basta olhar ao seu redor. Deve haver alguém no trabalho, na escola, na sua casa de culto, algum lugar, existe algum jovem negro lá. E vocês são legais, dizem oi. Estou dizendo pra irem mais fundo, mais próximo e construírem relacionamentos, os tipos de amizades que realmente façam com que vocês vejam a pessoa holística e irem realmente contra os estereótipos. Conheço alguns de vocês aí, eu sei porque tenho alguns amigos brancos em particular que dirão, "Vocês não imaginam como sou desajeitado. Eu não acho que isso vai funcionar comigo. Tenho certeza que estragarei tudo." Certo, talvez, mas isso não tem a ver com perfeição e sim com conexão. E vocês não vão ficar confortáveis antes de se sentirem desconfortáveis. Quero dizer, vocês têm que fazer isso. E jovens negros, o que estou dizendo é se alguém vier ao seu encontro, de modo genuíno e autêntico, aceitem o convite. Nem todo mundo está contra vocês. Vão à procura daquelas pessoas que podem ver a sua humanidade. É a empatia e a compaixão que nasce dos relacionamentos com pessoas que são diferentes de vocês. Algo realmente poderoso e lindo acontece: vocês começam a perceber que elas são vocês, que elas são parte de vocês, que elas estão na sua família, e assim deixamos de ser espectadores e nos tornamos atores, nos tornamos defensores e nos tornamos aliados. Então abandonem o seu conforto por uma coisa maior e mais brilhante, porque é assim que vamos evitar que um outro Ferguson aconteça. É assim que criamos uma comunidade onde todos, especialmente jovens negros, podem prosperar.
Essa última coisa será mais difícil e eu sei, mas vou expressá-la mesmo assim. Quando vemos uma coisa, nós temos que ter a coragem de dizer algo, mesmo para as pessoas que amamos. Sabem, estamos em férias e será uma época quando nos sentamos em volta da mesa e nos divertimos. Muitos de nós estarão de férias, e vocês têm que ouvir as conversas ao redor da mesa. Vocês começam a dizer coisas do tipo: "A vovó é preconceituosa." (Risos) "O tio Joe é racista." E sabem, nós amamos a vovó e o tio Joe. Amamos. Sabemos que eles são "boas pessoas", mas o que eles dizem é errado. E temos que poder dizer algo, porque sabem quem mais está à mesa? As crianças estão à mesa. Nos perguntamos porque esses preconceitos não morrem e passam de geração a geração? Porque não estamos dizendo nada. Temos que estar dispostos a dizer: "Vovó, não chamamos mais as pessoas assim." "Tio Joe, não é verdade que ele merecia aquilo. Ninguém merece aquilo." E temos que estar dispostos a não proteger as nossas crianças da feiúra do racismo quando os pais negros se omitem quanto a isso, especialmente aqueles que têm filhos negros jovens.
Nós temos que dizer aos nossos queridos, nosso futuro, que temos um país fantástico, com ideais incríveis. Nós trabalhamos com muito afinco e fizemos algum progresso, mas ainda não terminamos. Ainda temos em nós essa ideia antiga sobre superioridade e isso está fazendo com que incorporemos isso ainda mais nas nossas instituições e na nossa sociedade e gerações, e está criando o desespero e disparidades e uma desvalorização devastadora dos jovens negros. Nós ainda lutamos, vocês têm que dizer a eles, vendo tanto a cor quanto o caráter de um jovem negro, mas que vocês esperam que eles, sejam parte das forças de mudança nessa sociedade que se levantarão contra a injustiça e estão dispostos, acima de tudo, a fazer uma sociedade onde jovens negros possam ser vistos por tudo que eles são.
Tantos homens negros incríveis, aqueles que são os estadistas mais incríveis que já viveram, soldados corajosos, trabalhadores diligentes e maravilhosos. Essas são as pessoas que são pregadores poderosos. Eles são cientistas incríveis e artistas e escritores. Eles são comediantes dinâmicos. Eles são vovôs corujas, filhos afetivos. Eles são pais fortes, e são jovens com sonhos próprios.
Obrigada.
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