Zona cinzenta

Os protestos dos que querem uma primavera para chamar de sua



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O preço da metáfora é a eterna vigilância. Há quem tente estabelecer elos entre o populacho que enfrenta a polícia nos EUA e os amotinados da Praça Tahrir e Homs, no Egito e Síria – e entre os gregos que vêem seu futuro econômico ser mais negro que asa de graúna e escalafobéticos que roubam tevês e arrancam janelas em Londres. O que se passa no Zuccotti Park, em Wall Street, lastreado para Los Angeles, Boston e Chicago, paga a pena ser estudado. Tecnicamente, já se chama nos EUA a tudo isso de “Protestos Rorschach”: aqueles borrões de tinta psicologizados e psicologizantes, em que cada um vê o que quer ver. O que se passa por lá é sumamente diferente daquele Joel Tornabene que, no final dos anos 60, meteu flores nas metrancas da Guarda Nacional da California, sob o governador Reagan, e inventou o “flower power” que tanto encantou os hippies. Os movimentos de hoje não são tão coloridos, ideologicamente, como o dos hippies: os manifestantes de agora são incapazes de ver subtons.

Não há nada em comum entre litigantes do oriente médio, entre os dos EUA e Europa, e entre os hippies dos 60. Vejamos o que estabelece a “Declaração da Ocupação da Cidade de Nova York”: “somos enganados pelas forças corporativas do mundo”; “as corporações buscam lucro em cima do povo” e “comandam nossos governos na base da impunidade”; as empresas “perpetuam o capitalismo local e globalmente”. Amotinados da Freedom Plaza, em Washington, demandam “apenas soluções para as crises que o mundo enfrenta”. São, nos EUA, todos postulantes de reformas em pleno regime democrático, que aliás prevê, pela primeira emenda à Constituição dos EUA, o direito a protestos públicos –algo jamais conhecido dantes na Praça Tahrir, no Egito, ou em Homs, na Síria. A diferença começa aí.

Manifestantes correlatos, amotinados pacificamente em São Paulo, chegaram a vindicar “injeções de estriquinina” em políticos corruptos. É o tipo de populacho que apóia cegamente as operações da polícia federal “republicana”, que nem saber explicar, numa linha, a diferença entre STF e STJ, digamos. São todos nacionalistas, noto, postulantes a um estado de bem-aventurança que não articula interesses claros.

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Há, no entanto, algo a nivelar os destinos dessas massas, em todo o planeta: todos são bipolares, no sentido político do termo. Dividem o mundo entre o bem e o mal. Desconhecem as benesses daquele, hoje chavão, termo que aqui e acolá repetido por celerados medianamente conscientes: a definição das chamadas “zonas cinzentas”, em que noções de mal e bem não são tão claras. Mas atacar, como pré-coerentes estilizados, os manifestantes dos EUA e do Brasil, que querem uma primavera árabe para chamar de sua, seria entrar, tecnicamente, no jogo deles.

Há uma série de boas notícias rolando no mundo, e que os manifestantes se negam a ver, porque (como notava Nietzsche, há que tomar cuidado com a força dos fracos) não faz parte desse tipo de negócio, faute-de-mieux, enxergar além da bipolaridade (no fim do governo Figueiredo nossas esquerdas foram melhores do que isso, e lentamente, abandonaram a bipolaridade, reingressando lentamente, como barnabés, no aparelho de estado...)

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O mundo está melhorando: os produtos Linux, gratuitos e coletivos, batem em qualidade o Windows; o Creative Commons, de Lawrence Lessig, põe abaixo a mídia tradicionalesca comandada pelos barões; o boom de se prender cada vez mais pessoas nos EUA está decaindo, por um único motivo: a tolerância zero não dá resultados quando a taxa de desemprego aumenta – na Califórnia, o gasto com cadeias subiu de 4% do orçamento estadual, em 1980, para 10% em 2011, a ponto de a Suprema Corte americana, em maio passado, ter definido o sistema penal americano como “cruel e inatual”, demandando que a Califórnia liberte 30 mil pessoas nos próximos dois anos.

Até os barões de mídia, que juravam ter sido decapitados pelas mídias ditas sociais, estão tendo boas notícias. Em abril passado, a publicação Paid Content apurou que 26 jornais metropolitanos dos EUA haviam mudado seu modelo de negócio para acesso pago. Mais de cem jornais nos EUA aderiram ao serviço Press+, um sistema de pagamento online montado por um ex-editor-chefe do Wall Street Journal. O grupo de mídia Media News botou dois de seus jornais no sistema de acesso por pagamento em 2010. Agora em 2011 já são 23 jornais. O povão começou a acordar para o fato de que as mídias sociais estavam dando crédito a internautas que postavam “reportagens” copiadas de grandes portais. Até os investidores de fundos de pensão voltaram globalmente a apostar nesse tipo de negócio. A empresa EPFR Global relata que até setembro de 2011 os investidores retiraram “apenas” US$ 150 bilhões desses fundos, sendo que em 2010 a retirada total foi de US$ 508 bilhões. A confiança no mercado está de volta. E até com todas as dificuldades do governo Obama, as perspectivas de que os republicanos voltem ao poder são raras. Um economista da Universidade de Yale, Ray Fair, passou a usar no início dos anos 70 indicadores econômicos como a taxa de inflação e o crescimento de lucro por habitante para predizer as intenções de voto à Presidência dos EUA. O senhor Raiy Fair fez nova pesquisa em julho de 2011: e os resultados prevêem em 2012 uma vitória de Obama com 53,4% dos votos.

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Agora vejamos na Europa: apesar de toda a crise, as empresas européias nunca estiveram tão bem. As 40 maiores companhias da França vão aumentar em 15% os seus lucros até o final de 2011, um nível só encontrado em 2008. Na Alemanha, a Associação dos Engenheiros prevê um aumento de 14% na produção industrial para chegar à casa de US$ 266 bilhões, batendo também os recordes de 2008. Na Alemanha as exportações para a China dobraram entre 2008 e 2011.

E até a violência está degringolando. Acaba de ser lançado na Europa “The better angels o four nature: why violence has declined”, de Steven Pinker, Viking Books, 802 pgs, US$ 40. A violência sempre cresceu exponencialmente. No noroeste dos Estados Unidos brancos e negros sempre mataram nas mesmas taxas na primeira metade do século XIX. Mas os homicídios cometidos por afro-americanos subiram três vezes mais do que os cometidos por brancos em Nova York em 1850 e treze vezes mais cem anos depois, em 1950. Mas o senhor Pinker agora revela o surgimento do que ele chama de “new peace”, a nova paz. Mesmo com os conflitos no Iraque, Afeganistão, Sri Lanka e Sudão, o senhor Pinker diz que há uma queda brutal nos campos de batalha. Cerca de 0,5 morto a cada grupo de cem mil combatentes a cada ano. Lembremos que na guerra da Coreia, nos anos 50, em quatro anos de duração, morreu um milhão de pessoas, e na década seguinte 1,6 milhão de mortes durante os nove anos de guerra do Vietnã. Na primeira Guerra do Golfo, em 1990 e 1991, morreram 23 mil pessoas, e na guerra entre a Etiópia e a Eritréia, entre 1998 e 2000, 50 mil almas tombaram. Até a guerra anda matando menos.

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Dados de melhorias no mundo não interessam aos manifestantes, seja no Brasil ou nos EUA: afinal é gente, em geral, coxinha de gabinete –habituada a colecionar selos, e não mandar cartas.

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