Vem aí o "Tequila Party"
Em meio s discusses sobre a questo da imigrao, polticos de ascendncia mexicana nos EUA cogitam a formao de um partido poltico at a criao de um novo pas
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247, Letícia Moreli - Vida de imigrante na América não é fácil. Em julho do ano passado, a sanção da lei SB1070 pela governadora do Arizona, a republicana Jan Brewer, por pouco não deu o direito ao governo local de prender e deportar imigrantes, mesmo aqueles em situação legal no país, que estivessem sem documentos – cláusula que acabou suspensa pela juíza federal Susan Bolton, do mesmo Arizona. O episódio, que repercutiu mundo afora, mostra que a presença estrangeira nos Estados Unidos, especialmente na fronteira com o México, virou caso de polícia. Na mira da intolerância, esteve a deputada democrata Gabrielle Giffords, sobrevivente de um tiro à queima-roupa, na cabeça, durante um ato político em Tucson, em janeiro. Outras seis vítimas do atentado não sobreviveram.
O sudoeste americano, que compreende os estados do Arizona, Texas, Califórnia, Utah, Colorado, Nevada e Novo México, está se tornando a faixa de Gaza dos Estados Unidos. Republicanos e filiados do movimento ultradireitista Tea Party engrossam o coro dos que pretendem limitar os direitos dos imigrantes de transitar livremente em território americano. Tramitam em câmaras estaduais daquela região projetos de leis rigorosos, que exigem a cassação da cidadania dos filhos de estrangeiros nascidos em solo americano, garantida pela constituição.
Imigrantes são sempre vítimas de preconceito mundo afora. No início do século passado, por exemplo, os italianos que chegavam ao Brasil eram chamados, preconceituosamente, de “carcamanos” – uma referência ao suposto hábito de alguns comerciantes da terra de Dante Alighieri de colocar a mão, ou seja, “carcar a mão” nas balanças, para cobrar mais dos fregueses. Nos Estados Unidos, que em igual período chegaram a receber 5 mil imigrantes ao dia, a história não é diferente. Os poloneses, vale lembrar, ganharam o posto ocupado pelos portugueses nas piadas dos brasileiros. Bem mais graves foram as medidas tomadas pelo governo contra chineses e japoneses: os primeiros foram barrados de 1882 a 1943, ao passo que boa parte dos nipônicos e de seus descendentes residentes nos EUA acabaram aprisionados em campos de concentração durante a Segunda Guerra Mundial – assim como no Brasil, diga-se. A bola da vez, há tempos, são os latino-americanos, maioria entre os cerca de 13 milhões de imigrantes ilegais que vivem no país.
De acordo com o americano David Fleischer, professor de Ciências Políticas da Universidade de Brasília, durante muito tempo a Casa Branca fechou os olhos para a imigração. “Na era Clinton, o PIB estava crescendo e os empresários pressionavam para ter mão de obra barata. Havia pressão do próprio governo mexicano por conta dos interesses na área de livre comércio, o NAFTA”, comenta. “Com a economia em declínio, contudo, começaram a fechar o cerco”.
Na disputa entre democratas, republicanos e do movimento Tea Party, os imigrantes começam a dar os primeiros passos para a mobilização e a ultima novidade é o Tequila Party – uma resposta bem humorada aos ultradireitistas ligados aos republicanos. Líderes hispânicos, a princípio em Nevada, estão considerando cortar seus laços com o Partido Democrata e formar um grupo independente de base. “Não sei se isso se isso vai ocorrer, mas a proposta está em debate. O objetivo é fortalecer o voto latino”, disse ao Las Vegas Sun, em novembro, Fernando Romero, presidente da organização Hispanics in Politics, o mais antigo grupo político de latino-americanos em Nevada.
Para outra parcela, a dos ‘chicanos’, a questão vai muito além do direito de ir e vir. Formados no calor dos movimentos contra preconceitos raciais e étnicos dos anos 60 e 70, sob as lideranças de César Chávez, Reius López Tijerina, Rodolfo 'Corky' Gonzáles e José Ángel Gutiérres (ver box), grupos de mexicanos separatistas se perpetuam, até os dias de hoje, em torno de um objetivo ambicioso: tomar o território do sudoeste americano perdido no pós-guerra (1846-48) e construir uma nova nação: Aztlán. A meta é das mais ambiciosas, pois a área em questão soma 1,4 milhão de quilômetros quadrados, o equivalente a 70% do território atual do México (confira mapa).
“Queremos autodeterminação para nosso povo. Enquanto os brancos, ricos e privilegiados gozam de "liberdades", a maioria dos americanos, especialmente os chicanos e os negros, sofrem com a pobreza, o desemprego, a saúde precária e a falta de moradia. A América está começando a desmoronar e é nosso objetivo estar lá quando ela ruir para construir uma nova nação”, declara Chimalli Cuetlachtli, tenente-general da Brown Beret National Organization, também conhecidos como “boinas marrons”.
Verdadeiros exércitos, estes grupos não se restringem mais aos guetos. Fazem manifestações e protestos, alguns com apoio da classe acadêmica – caso do MEChA (Movimento Estudantil Chicano de Aztlán), grupo de estudantes hispânicos que têm representação na Universidade da Califórnia. A ação se viu ampliada nos últimos anos com o uso da internet. Sites oferecem roupas e acessórios com os logotipos das facções e permitem até se filiar a elas. Difícil mesmo é encontrar um telefone de contato, pois a maioria teme perseguição da polícia. Procurado por nossa equipe de reportagem, o jornal La Voz de Aztlán se manifestou de forma lacônica: “É perigoso para nós. Estamos sendo constantemente monitorados pelo FBI e pela CIA”.
Esses militantes consideram-se descendentes de povos nativos colonizados pelos europeus. Por esta razão, referem-se ao território como “Aztlán” – terra ancestral dos astecas. “Quem deveria em princípio retomar estas terras são os índios, que estavam lá antes dos espanhóis. Estes grupos são um pouco radicais, o México perdeu esse território em guerra no século XIX. É uma causa impossível. Buscar a legalização dos imigrantes seria um caminho mais viável”, reflete o cientista político.
As políticas de imigração parecem não fazer tanta diferença para os guerrilheiros de Aztlán. “Só servem para distrair a todas as pessoas da verdadeira crise que existe nos Estados Unidos. Para nós, as desigualdades enfrentadas só serão resolvidas quando o povo chicano se organizar”, diz Xenaro Ayala, secretario geral do Partido Nacional La Raza Unida (PNLRU). “Nossa estratégia de crescimento e desenvolvimento da comunidade está se firmando. Não sabemos quanto tempo vai levar: meses, anos? Estamos determinados a não desistir da luta”, avisa Chimalli Cuetlachtli.
A história dos movimentos “chicanos”
De carona na agitação dos movimentos negros das décadas de 60 e 70, nos Estados Unidos, quatro ícones da resistência mexicana surgiram no sudoeste americano e ecoam, até os dias de hoje, nas lutas pelos direitos civis dos imigrantes. Em geral, os grupos “chicanos” sempre foram taxados de radicais, mas um dos maiores expoentes dos movimentos latinos, César Chávez, é admirado até entre não chicanos pelo caráter pacificador. Filho de um fazendeiro imigrante, Chávez ingressou na Organização de Serviços Comunidade (OSC), após a Segunda Guerra Mundial, influenciado por seu pai ativista. Fundou o Sindicato dos Trabalhadores Rurais (UTC), no sul da Califórnia, e conseguiu fazer com que as questões trabalhistas do povo mexicano ganhassem projeção internacional. Com uma luta que proclamava a não-violência, convenceu anglo-americanos e mexicanos a apoiar suas ações, enfatizando a fraternidade humana.
Embalado nas plataformas dos militantes negros e apoiado por Martin Luther King, Reies Tijerina López, um pastor protestante do Texas, fundou a Aliança Tijerina Federal de Mercedes. O movimento de apoio Tijerina foi o primeiro com implicações para os direitos civis que chamou a atenção no estado do Novo México e teve em seu DNA a preocupação com o problema da perda de território mexicano na Guerra do México (1868-1848), que se reflete nos movimentos separatistas até os dias atuais.
Mas, sem dúvida, um dos líderes mais combativos do movimento “chicano”, foi o pugilista Rodolfo "Corky" Gonzáles, que liderou a campanha "Viva Kennedy "em 1960, e se consagrou como um dos principais membros do Partido Democrata de Denver. Em 1970, Gonzáles formou o Raza Unida, partido do Colorado exclusivamente chicano. Ele acreditava que a libertação política do povo mexicano nos Estados Unidos só poderia ser feita mediante uma ação autônoma e não através de uma inscrição em qualquer uma das partes da maioria política. Apesar de sua trajetória de pugilista sublinhar uma imagem machista aos chicanos, Gonzáles ganhou notoriedade como um poeta. Seus texto “Eu sou Joaquín”, de 1967, virou um manifesto da militância mexicana.
Como uma origem semelhante a de Guevara, José Ángel Gutiérrez, nascido em 1944, em Crystal City, Texas, saiu da classe média-alta para a luta “chicana”. Na Universidade de St. Mary San Antonio, fundou a Mexican-AmericanYouth Organization (MAYO), um organização da juventude americana-mexicana de veia anti-anglosaxônica e causa voltada ao combate da pobreza e da carência na educação. Fundou o Partido de La Raza Unida, que viveu em confronto com os guardas da fronteira do estado do Texas, os Texas Rangers. Em 1971, o partido se fundiu com o La Raza Unida do Colorado, de Gonzáles e formou o Partido Nacional de La Raza Unida, enfraquecido, porém ainda existente na atualidade.
A origem da maioria dos movimentos de juventude chicana nasceu dentro das universidades. É o caso do MEChA, Movimiento Estudiantil Chicano de Aztlán, fundado em 1969, em uma conferência entusiástica realizada em Denver que anunciou o "Plano Espiritual de Aztlán". O MECha sobrevive até hoje e tem representatividade junto à Universidade da Califórnia. Muitos desses movimentos ficaram pelo caminho, outros sobrevivem na clandestinidade, vigiados pelo FBI e a CIA.
O legado aparente da luta “chicana” está nas numerosas entidades de serviço e desenvolvimento sem fins lucrativos que firmou, a exemplo do Conselho Nacional de La Raza, o Fundo Educacional e de Defesa Legal México-Americano (MALDEF), o Projeto de Educação e Registro de Eleitores do Sudoeste (SVREP) e a Associação Nacional de Funcionários Latinos Eleitos e Nomeados (NALEO).
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