A exaltação da mediocridade e da futilidade

O show do casamento foi um bom negócio para a monarquia



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A mídia adora espetáculos. Grande parte da população, no mundo todo, adora contos de fadas, desfiles militares e rituais solenes. Assim, está explicado o sucesso de público que foi a transmissão do casamento do príncipe com a plebeia, em Londres. Há dias que a imprensa vem preparando o clima para o casamento, como se fosse realmente um acontecimento importante para o mundo e como se a rainha da Inglaterra não fosse apenas uma rainha da Inglaterra. Manchetes ridículas, textos vazios, programas televisivos no nível de Caras até mesmos nos melhores canais. Aliás, parecia que a imprensa fez uma grande força para ser um pouco Caras.

Reis, rainhas, príncipes, princesas, duques, marqueses e barões são excrescências no mundo moderno. Monarquias deveriam ter ficado no século 19. Seus ritos e solenidades beiram o ridículo e lembram que nobres, ricos e privilegiados devem manter sempre distância em relação ao povo. Quanto mais solene o ritual, mais distância da plebe. Mas o príncipe está se casando com uma plebeia, dizem, embasbacados, os antigos e novos analistas de futilidades. Sinal dos tempos, realmente. E, afinal, a plebeia tem bastante dinheiro e vai saber se comportar.

Na badalada monarquia britânica, homens têm preferência sobre mulheres na sucessão real. Mulheres são inferiores, pois. Católicos não podem ser reis ou rainhas, nem se casar com eles. Exemplo de tolerância religiosa em um país que, anacronicamente, tem religião oficial. Déspotas, torturadores e assassinos são convidados de honra, desde que sejam reis. Vigoram o luxo e o esbanjamento, pelo jeito aprovados pela maioria dos súditos apesar da grave crise econômica e do alto desemprego. São os resquícios da espoliação colonial, do passado de exploração, opressão e assassinatos nos cinco continentes e ali mesmo ao lado, na Irlanda.

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Mas o povo gosta de assistir a casamentos, ainda mais se for de um príncipe. O povo gosta de reis e rainhas, príncipes e princesas. Gosta de ver soldados marchando e cavalgando, gosta de bandas. Adora ver celebridades, mesmo que de longe, apertado num cercadinho com sujeitos armados e mal-encarados, de terno e óculos escuros, olhando feio como se todos fossem terroristas em potencial. E a imprensa e as televisões justificam a baixada de nível alegando que têm de atender a essas expectativas, têm de mostrar esse show no mundo todo.

A monarquia britânica tem de se manter para garantir seus negócios e seus privilégios. A rainha não tem poder de verdade, mas ajuda a compor um sistema de poder. É a cara da Inglaterra, uma atração turística que ajuda a economia do país. Festas como o casamento de sexta-feira ajudam a defender o trono diante dos aventureiros republicanos e a arrecadar milhões de libras com o grande espetáculo. A monarquia britânica hoje é uma marca – que andava desgastada – e um bom negócio. O casamento foi uma estratégica mercadológica bem-sucedida.

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O casamento real mostra como a futilidade e a mediocridade se impõem até mesmo em um país considerado avançado e moderno, e se espalham pelo mundo com a ajuda de uma imprensa tão fútil e medíocre quanto.

Show em Roma também

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O papa e o Vaticano tudo podem em seus domínios. O pragmático e conservador Bento 16 está preocupado com desgastes da Igreja Católica e precisando se promover. Então também preparou seu espetáculo com pompas e rituais: a beatificação, domingo, a toque de caixa, do papa João Paulo 2º.

Geralmente esse processo, prévio à santificação, é longo e cuidadoso. Mas o Vaticano já atribui um milagre ao ex-papa e acelerou os trâmites, mesmo sob críticas de alguns religiosos preocupados.

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Casamento em Londres, beatificação em Roma. No fim, tudo é show, tudo é negócio.

Mordomia com falsa economia

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O Senado anunciou que vai alugar automóveis para os 81 senadores e alguns diretores, em vez de comprá-los. Alardeia economia, o que é verdade, pois os custos com a compra e a manutenção dos veículos seriam maiores.

Só que o problema não é esse. O problema é que senadores não devem ter carros oficiais de luxo, com chapas verdes e amarelas, à disposição 24 horas por dia. Nos dias que passam em Brasília – dois a três por semana – os senadores podem perfeitamente circular de táxi ou manter carros próprios ou alugados por eles mesmos, com motoristas ou não. A maioria deles tem recursos mais do que suficientes para arcar com esses custos. Lícitos ou ilícitos, mas têm dinheiro para isso.

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As alegações de que são autoridades e coisas assim refletem a visão elitista da política, a tradição dos privilégios e das mordomias. Carros oficiais, como existem no Brasil para funcionários até de terceiro e quarto escalões, são próprios de países subdesenvolvidos econômica, política e moralmente.

Embora os táxis sejam caros em Brasília, suas excelências não gastariam tanto assim com eles. E os R$ 360 mil por mês – R$ 4,320 milhões por ano – que presumivelmente gastarão com os carros alugados (será muito mais, claro) poderiam ser muito mais bem aplicados em ambulâncias em regiões carentes ou transporte escolar para escolas públicas.

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Falta de argumento

O professor Ives Gandra Martins alega que o voto em lista fechada é inconstitucional porque viola o artigo da Constituição que diz que todo poder emana do povo. O raciocínio não é digno de um grande jurista: se o eleitor não vota no candidato, mas na lista de candidatos do partido, não está escolhendo seu representante. Por esse raciocínio, na Alemanha – um dos países em que existe o voto em lista fechada – o povo não exerce seu poder.

A lista fechada pode não ser a melhor solução, mas discussão sobre a reforma política merece um nível melhor do que esse.

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