Paulo Moreira Leite ataca síndrome de Regina Duarte
Ex-vice-presidente da Imprensa Oficial na gestão de José Serra no governo de São Paulo, jornalista ataca medo das elites diante da vitória de Fernando Haddad em São Paulo

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247 - O jornalista Paulo Moreira Leite aponta em artigo publicado nesta terça-feira 23 uma "postura conservadora contra Haddad", que "retoma os velhos fantasmas do perigo vermelho, tão primitivos como tantas mitologias de quem saiu colonizado pelos anos de Guerra Fria". Leia o artigo na íntegra abaixo:
PAVOR ARISTOCRÁTICO NA RETA FINAL, por Paulo Moreira Leite
A iminência de uma derrota histórica na cidade que consideravam sua reserva de mercado têm levado alguns observadores a fazer um trabalho vergonhoso em defesa da candidatura de José Serra à prefeitura de São Paulo.
Em vez de defendê-lo, o que seria natural na reta final da eleição, eles procuram levantar o fantasma da ameaça de um avanço da hegemonia do PT no país inteiro.
Essa postura conservadora contra Haddad retoma os velhos fantasmas do perigo vermelho, tão primitivos como tantas mitologias de quem saiu colonizado pelos anos de Guerra Fria. Reflete um medo aristocrático de quem imaginava que tinha transformado São Paulo em seu quintal eleitoral e agora se vê sem respostas para as grandes parcelas da população.
Depois de criticar o PT pelos Céus de Marta Suplicy, a campanha tucana fala em Céus do Serra. Depois de criticar o bilhete único, o PSDB aderiu a ele. Criticou Haddad pelo bilhete único mensal, mas agora lançou sua própria versão do mesmo bilhete.
Levantar o fantasma de um perigo difuso e ameaçador é um dos mais conhecidos truques da comunicação moderna. Revela desprezo pelo conhecimento e pela inteligência do eleitor, procurando convencer a população com argumentos inconscientes, de natureza emocional.
A postura pode ser resumida assim: quando não dá mais para falar em bolo nem em brioches, como fez Maria Antonieta diante da plebe rude, vamos para lágrimas e o sentimentalismo.
O pensamento aristocrático e conservador do século XIX, quando a aristocracia descobriu que o voto popular poderia produzir resultados desagradáveis e inesperados, foi construído assim. Pensadores como Gustave Le Bon afirmavam, literalmente, que a multidão “ou não conseguia raciocinar, ou só conseguia racionar de forma errada.”
O truque principal, nesse comportamento, é evitar referências claras e diretas. Nunca se diz: perigo de que? Por que?
Grita-se: “eu tenho medo”, como fez Regina Duarte, em 2002.
A dificuldade é que, em sua passagem pelo poder federal os tucanos não deixaram nenhuma recordação duradoura na defesa dos mais pobres e dos assalariados em geral. Foi por isso que perderam três eleições consecutivas, sem jamais exibir concorrentes competitivos.
Em 2002, quando o governo de FHC chegou ao fim, sua popularidade era negativa. A inflação passara dos dois dígitos, o desemprego havia disparado, a economia estava num abismo financeiro e é claro que, já então, culpava-se o perigo vermelho por isso.
Quanto aos métodos de governo, não sejamos ingênuos nem desmemoriados. Se você não quer usar a palavra aparelhamento, poderia falar, então, em engaiolamento tucano.
É um sistema realmente eficiente, já que, em quatro anos, promoveu:
a) mudanças nas regras eleitorais estabelecidas pela Constituição;
b) um esquema conhecido como mensalão, matriz dos demais;
c) um procurador geral da República dos tempos de FHC era conhecido como “engavetador”geral da República.
Embora goste de lembrar que o PT votou contra o Plano Real assinado por Itamar Franco, o PSDB prefere esquecer que, ao retornar ao governo de Minas Gerais, o ex-presidente rompeu com FHC.
Foi para tentar derrotar Itamar, político muito popular no Estado, que O PSDB INVENTOU O MENSALÃO DE MARCOS VALÉRIO, COLOCANDO DE PÉ UM ESQUEMA QUE ARRECADOU MAIS DE R$ 200 MILHÕES PARA AS AGÊNCIAS LIGADAS AO ESQUEMA. Nem assim o esquema funcionou e, como acontece nas democracias, venceu o candidato que era melhor de voto.
Mesmo derrotado – a democracia tem disso, né, gente? – o PSDB empurrou a dívida do esquema com a barriga, com ajuda de verbas liberadas – olha a coincidência ! – pelo mesmo cofre do Visanet. Quando Aécio recuperou o governo de Minas, Valério voltou a ser premiado com novos recursos, informa Lucas Figueiredo, no livro O Operador. Conforme demonstrou a CPI dos Correios, dirigida por aliados do PSDB, HAVIA FARTA DISTRIBUIÇÃO DE RECURSOS PÚBLICOS NA CAMPANHA TUCANA.
Num lance de peculiar ousadia, foram retirados R$ 27 milhões da própria Secretaria da Fazenda do Estado.
A verdade é que o mensalão tucano foi feito com tanta competência – ou seria melhor empregar o termo periculosidade? – que jamais foi descoberto. Até surgiram denúncias, mas eles nunca foram investigados.
Chegou-se ao mensalão tucano por causa do braço petista de Marcos Valério. Se não fosse por ele, nem saberíamos que teria existido.
Isso é que engaiolamento, vamos concordar. Funciona mesmo depois que o PSDB deixou o poder. Enquanto o Supremo condena o mensalão petista com argumentos deduzidos e não demonstrados, os tucanos seguem no pão de queijo. Ninguém sabe, sequer, quantos serão julgados. Nem quando.
Agora vamos reconhecer: Fernando Haddad assumiu a liderança folgada nas pesquisas como um bom candidato deve fazer. Veio do zero, literalmente, e ganhou eleitores na medida em que tornou-se conhecido.
O apoio de Lula não é importante, apenas, porque lhe garante um bom patamar de votos. Essa é uma visão eleitoreira da política. Esse apoio mostra que é um candidato com origem e história e isso é importante. Dá uma referência ao eleitor.
Num país onde os sábios da década passada adoravam resmungar com frases feitas sobre a falta de partidos “legítimos”, com “história”, com “programa,”etc, é difícil negar que o PT fez sua parte. Você pode até achar uma coisa detestável. Mas tem de admitir que NÃO É HADDAD, COMO DILMA JÁ MOSTROU EM 2010, QUEM TEM PROBLEMAS COM A PRÓPRIA HISTÓRIA.
E isso, na construção de uma democracia, é um bom começo. Falta, agora, a outra parte. Caso as urnas confirmem o que dizem as pesquisas de intenção de voto, a vitória de Haddad só irá demonstrar a dificuldade da oposição em mostrar que poderia fazer um governo melhor.
O debate político é este. O resto é propaganda.
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