Merval: Campos e Alckmin começam a recuar

Para colunista do Globo, governador de Pernambuco usou palavras mais ambíguas do que de costume ao falar de encontro com Dilma, sinalizando recuo em plano de voo solo; quanto ao governo de São Paulo, ao frear de apoio para Aécio Neves candidato, demonstra falta de confiança em sua força para fazer reformas que pretende

Merval: Campos e Alckmin começam a recuar
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247 – O colunista do Globo, Merval Pereira vê sinais de recuo na estratégia de Eduardo Campos (PSB) e de Geraldo Alckmin (PSDB) diante da corrida à presidência de 2014. Leia o artigo:

A linguagem dos políticos

Pesquisando sobre a linguagem dos políticos, tema sobre o qual escreveria na coluna que se segue, encontrei a seguinte definição do escritor inglês George Orwell: "A linguagem política destina-se a fazer com que a mentira soe como verdade, e o crime se torne respeitável, bem como a imprimir ao vento uma aparência de solidez." É uma visão cética da atividade política, que não corresponde exatamente à minha, mas dá bem a medida de como os políticos, não só os brasileiros e não de agora, são vistos pela opinião pública.

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Os casos que analisarei aconteceram nos últimos dias e não revelam tão graves distorções de caráter dos envolvidos, mas de qualquer maneira são exemplos saídos do forno de como se deve ter cautela com a linguagem dos políticos. A presidente Dilma foi a Serra Talhada para pela primeira vez encontrar-se oficialmente com o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, tido e havido como seu provável adversário em 2014, em seu território político. No entendimento generalizado, a presidente mandou um recado para seu quase ex-aliado, dizendo que é impossível governar sem uma coalizão forte, mas que precisava de parceiros comprometidos com o projeto de governo. Pois ontem Campos garantiu que não entendeu a frase como um recado indireto e foi peremptório: "A presidente Dilma não é mulher de mandar recados, e nem eu sou homem de receber recados. Ela não é dada a esse tipo de conversa, e nem eu".

Parece uma resposta altiva, de quem não se deixa emparedar nem mesmo pela presidente. Na verdade, porém, é absolutamente necessário para Campos fingir que não entendeu o recado dado, pois o entendimento o obrigaria a tomar uma decisão agora, sair do governo, entregando todos os cargos, ou desistir de sua provável candidatura.

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Essa última hipótese, aliás, era motivo de especulação ontem em Brasília. Não foram poucos os que viram na fala de Campos sinais de que ele está começando a recuar de seu projeto de voo solo. Não que ele tenha admitido isso, mas usou palavras mais ambíguas do que tem usado e, sobretudo, adiou para abril de 2014 a decisão oficial, quando havia dito que em setembro deste ano ele se decidiria, para dar aos companheiros de partido tempo suficiente para se organizarem, seja qual for a decisão.

Um recuo, a esta altura do campeonato, seria ruim para a oposição, pois fortaleceria a base aliada, mas seria pior ainda para o jovem Eduardo Campos. Indicaria que ele avaliou como insuficientes seus apoios para enfrentar o favoritismo de Dilma.

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Mas, sobretudo, seria uma demonstração de fraqueza diante do PT e do PMDB que colocaria o PSB em situação mais frágil ainda na coalizão. Também os tucanos andam usando as palavras de maneira a não esclarecer o quadro político. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, achava que o senador Aécio Neves não deveria ser o presidente do PSDB, concordando com o ex-governador José Serra. Na reunião do partido na segunda-feira, ele acabou se convencendo de que seria bom para Aécio presidir a legenda, assim poderia viajar pelo país para organizar o partido, ouvir as famosas bases partidárias.

Tudo isso para quê? Para tornar-se um candidato à Presidência mais forte, está subentendido. Mas ontem, talvez temendo ter ido além do que deveria, Alckmin fez questão de ressaltar que o fato de apoiar Aécio para presidente do PSDB não significa necessariamente lançá-lo como candidato à Presidência da República. É claro que não, embora seja improvável que levem Aécio a realizar trabalho de reestruturação partidária para que ele desemboque em outra candidatura. E se Aécio não é o candidato putativo dos tucanos, que força terá ele para fazer as reformas que pretende? O comentário de Alckmin indica que ele ainda tem dificuldades para apoiar integralmente a candidatura Aécio à Presidência. Passos importantes foram dados nessa direção, e nem Aécio quer ser anunciado candidato agora.

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Mas certos comentários revelam mais pelo que não dizem, e é essa a marca da linguagem dos políticos. Patrick Charaudeau, professor na Universidade de Paris-Nord (Paris 13), uma das maiores autoridades mundiais em análise do discurso, compara o discurso político a um jogo de máscaras. "Toda palavra pronunciada deve ser tomada ao mesmo tempo pelo que ela diz e não diz. Jamais deve ser entendida ao pé da letra, numa transparência ingênua, mas como resultado de uma estratégia cujo enunciador nem sempre é soberano".

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