Kátia Abreu sai em defesa de Policarpo

Senadora do PSD classifica tentativa de convocar o diretor da sucursal da Veja em Brasília de "fato banal, sem transcendência, não fosse o denso simbolismo de que se reveste"

Kátia Abreu sai em defesa de Policarpo
Kátia Abreu sai em defesa de Policarpo (Foto: José Cruz/Agência Senado)


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247 - A senadora Kátia Abreu (PSD-TO) criticou, em artigo publicado na edição deste domingo do jornal O Globo, a tentativa de alguns parlamentares de convocar o diretor da sucursal da Veja em Brasília, Policarpo Júnior, para depor na CPI do Cachoeira. O jornalista é acusado de compactuar com as atividades do bicheiro Carlinhos Cachoeira, investigado pela CPI.

Leia o artigo da senadora:

Imprensa cassada

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Atentativa de convocar um repórter da revista "Veja" para depor na CPI que investiga as relações do contraventor Carlos Cachoeira com agentes do Estado e da iniciativa privada seria um fato banal, sem transcendência, não fosse o denso simbolismo de que se reveste.

O jornalista, como qualquer outro profissional, é um cidadão comum, sujeito às leis de seu país. No exercício de seu ofício, as ilegalidades potenciais estão capituladas no Código Penal: infâmia, injúria e difamação - crimes contra a honra. O repórter Policarpo Junior, da "Veja", não é acusado de nenhuma delas. De que o acusam? De ter, no exercício de sua profissão, ouvido o contraventor Cachoeira. Acusaram-no inicialmente de ter tido com ele 200 conversas, mas a Polícia Federal diz que foram apenas duas. O problema, porém, não é de números.

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O jornalista é, nos termos da Constituição, soberano em relação às fontes que elege. Está lá, no inciso XIV, artigo 5: "É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional." Não é casual que o constituinte tenha inserido esse dispositivo no capítulo dos Direitos e Garantias Fundamentais, cláusula pétrea da Constituição - e, portanto, não suscetível de emenda. Sem esse sigilo, não há informação - e, sem ela, não há liberdade de imprensa, nem democracia. Simples assim. Sem imprensa livre, o Congresso Nacional deixa de ter sentido. Transforma-se num teatro de marionetes, de ínfima categoria. Não vale nada. Já vimos este filme: a democracia morre no fim.

Daí o sentido emblemático - perigosamente emblemático - dessa convocação. Não importa quem seja o jornalista ou o órgão para o qual trabalha. O grave está em tentar constrangê-lo pelo crime de ter exercido seu ofício nos termos da lei.

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A simples suposição de que aí possa estar um delito estabelece um dano institucional de extrema gravidade. Um dano contra a democracia. Quando se constrange a liberdade de imprensa, não é apenas o jornalismo que sai perdendo: é a sociedade em seu conjunto - é o próprio princípio civilizatório. Alguns membros da CPI - e é preciso que se diga que são só alguns - questionam a legitimidade da fonte eleita pelo repórter investigativo Policarpo Junior. Querem criar o princípio da tutela moral da fonte, algo inédito desde Adão.

Não vejo legitimidade em nenhuma instituição da República - Congresso, Judiciário ou Executivo - exercer essa tutela. O jornalista não trabalha para o Estado. No exercício de seu oficio, Ruy Barbosa o definia como "os olhos e os ouvidos da sociedade". E o jornalista investigativo é mais isto: um detetive da sociedade, pois que se dedica, sem salvaguardas, a esclarecer questões de interesse público, ocultas por inconfessáveis interesses privados.

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O jornalista vai aonde está a informação. Muitas vezes, está no inferno. Não há problemas em conversar com o demônio; o problema está em saber o que se fará com a informação. No caso específico, Policarpo Junior publicou o que obteve. Não prestou serviços, nem deu contrapartida ao informante - que, inclusive, em uma das gravações da Polícia Federal, queixa-se disso a um cúmplice.

Volto então a perguntar: que crime cometeu? Se não injuriou, caluniou ou difamou, nem fez do que apurou instrumento de chantagem ou extorsão, a tentativa de convocá-lo não passa de um expediente oblíquo de intimidação, dos que sonham em promover o "controle social da mídia", eufemismo de uma velha e conhecida senhora: a censura.

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Quando, ao tempo do regime militar, foi editado o AI-5, a primeira vítima foi a imprensa. O Congresso foi mantido em sua fachada, mas perdeu caráter e substância. Sem imprensa livre, não tinha (e não tem) significação. Quando o presidente Geisel, em 1977, suspendeu a censura à imprensa, o jornalismo livre - ainda que não plenamente - revitalizou o Congresso, a política e a sociedade, impondo ao regime militar a revogação do AI-5.

O que se pretende agora é o oposto: uma viagem de volta ao passado sombrio. Temo que, se a CPI vier a aprovar essa despropositada convocação, estará colocando o Brasil numa rota obscurantista em que já trafegam alguns de nossos vizinhos. Thomas Jefferson disse certa vez que "se tivesse que decidir se devemos ter governo sem jornais ou jornais sem governo, não hesitaria um só instante em preferir o último". Espero que a CPI não faça a opção oposta.

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KÁTIA ABREU é senadora (PSD-TO).

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