Folha mantém duas visões sobre o estupro

Enquanto o jornal protesta contra a violência contra a mulher na Índia, Uol, do mesmo grupo empresarial, continua exibindo cenas de mulheres sendo violentadas com a faca no pescoço

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247 - No dia 16 de dezembro, uma jovem de 23 anos foi estuprada num ônibus por seis homens na Índia e depois jogada para fora do veículo. O fato, chocante, desencadeou uma série de protestos no país, mas o governo, incapaz de fazer frente à onda de violência, impôs um toque de recolher às mulheres. Este é o tema do artigo da jornalista Patrícia Campos Mello, repórter especial da Folha, mas o Uol, portal de notícias do mesmo grupo, continua exibindo livremente cenas de mulheres sendo violentadas no seu canal "Uol Sexo", onde qualquer pessoa pode ter acesso a cenas de violência inédita, num país onde mulheres são agredidas todos os dias (o vídeo faz parte da série Violadas). Abaixo, o artigo de Patrícia Campos Mello:

Estupro "merecido"

Foi em 16 de dezembro que começou o pesadelo de uma universitária de 23 anos e seu amigo, em Nova Déli, na Índia. Os dois pegaram um ônibus que circulava na rota normal, mas que, na realidade, era ocupado por seis homens que queriam fazer um "passeio". Os seis estupraram repetidas vezes a estudante, que depois foi espancada com seu amigo, com barras de ferro e outras armas. Os dois foram assaltados e jogados para fora do ônibus em movimento, nus.

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A estudante está internada em estado crítico, com ferimentos nos órgãos genitais e no intestino. O crime desencadeou uma onda de protestos em Déli, considerada a capital indiana do estupro. Não fosse o clamor popular, seria baixíssima a probabilidade de os estupradores serem condenados.

Em 2011, houve 24.206 estupros notificados na Índia, mas em apenas 26% dos casos os acusados foram condenados, segundo o Escritório Nacional de Registros de Crimes.

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O número real de estupros certamente é subestimado. A maioria das vítimas nunca denuncia o crime às autoridades. Mulheres estupradas são alvo de enorme preconceito -e raramente conseguem se casar na Índia. Estudos apontam que apenas 1 em cada 50 casos de estupro são notificados.

Quando as vítimas finalmente tomam coragem e denunciam, enfrentam uma polícia misógina. Os policiais indianos afirmam que as vítimas de estupro "mereceram, porque provocaram". Dizem isso, literalmente.

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A revista indiana "Tehelka" filmou secretamente entrevistas com 30 investigadores em delegacias de Déli e arredores, em abril deste ano. Dezessete dos 30 investigadores afirmaram repetidamente que a maioria das acusações de estupro eram falsas, que as mulheres "convidavam" ao estupro ao usar roupas provocantes e que muitas queriam extorquir os acusados.

"Nenhum dos estupros em Déli acontece sem que a mulher provoque", disse um policial. "Elas bebem, usam roupas provocantes e ficam flertando", afirmou outro. "As que denunciam querem ganhar dinheiro, porque as vítimas reais de estupro, mulheres honestas, nunca teriam coragem de denunciar", disse um investigador.

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Com essa predisposição, não surpreende que a maioria das investigações de estupro sejam falhas. Para muitos, essa visão de mundo sexista não é privilégio dos policiais: está encravada em boa parte da sociedade indiana.

Em abril, depois do estupro de uma mulher que trabalhava em um bar, autoridades de uma cidade próxima a Déli seguiram nessa narrativa de responsabilizar as vítimas. Impuseram um toque de recolher para mulheres que trabalham em shoppings e bares após as 20h.

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PATRÍCIA CAMPOS MELLO é repórter especial da Folha.

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