Economist aponta Bolsonaro como o grande mentiroso e denuncia risco de golpe

Reportagem de capa da revista britânica diz que Bolsonaro está preparando um clima para tentar um golpe no país, duvidando do resultado da eleição

Bolsonaro
Bolsonaro (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino | Reprodução)


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247 - A revista britânica The Economist afirma em sua matéria de capa da edição desta semana que Jair Bolsonaro (PL) vem fazendo uso do mecanismo adotado pelo ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump ao mentir para questionar a higidez do sistema eleitoral brasileiro e incitar uma tentativa de golpe caso seja derrotado no pleito de outubro. "Ele parece estar lançando as bases retóricas para denunciar a fraude eleitoral e negar o veredicto dos eleitores", ressalta o semanário . 

“Uma razão para se preocupar é que Bolsonaro possa emprestar uma página da cartilha sem princípios de Trump, até porque ele já fez isso antes. Ele semeia a divisão: o outro lado não é apenas errado, mas mau. Ele descarta as críticas como 'notícias falsas'. Seus instintos são tão autoritários quanto os de Trump: ele fica nostálgico sobre os dias do regime militar no Brasil. Um de seus filhos, que também é um de seus conselheiros mais próximos, aplaudiu abertamente os manifestantes do Capitólio. Bolsonaro foi um dos últimos líderes mundiais a aceitar que Biden havia vencido”, destaca a reportagem intitulada “The man who would be Trump” [O homem que queria ser Trump, em tradução livre].

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“Para realizar essa façanha improvável, ele aprendeu truques com outro forasteiro desbocado e amplamente subestimado. O mais importante deles foi o uso habilidoso e mentiroso das mídias sociais. Ele continua sendo o mestre incontestável do Brasil nisso e, assim, convenceu seus partidários de duas coisas. Primeiro, que se ele perder, é prova de que o voto foi injusto. Segundo, que uma vitória de seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, entregaria o Brasil ao diabo”, ressalta um outro trecho da reportagem . 

“Isso não faz sentido. Lula é um esquerdista pragmático e foi um presidente bastante bem-sucedido entre 2003 e 2010. Impulsionado pelo boom das commodities, ele presidiu o aumento da renda e uma grande expansão do estado de bem-estar social”, diz o texto mais à frente. 

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A reportagem observa ainda, que “o Exército está profundamente enraizado no governo e fez perguntas sobre o sistema de votação. O país está fervilhando de conversas sobre um possível golpe. Provavelmente não vai acontecer, mas algum tipo de insurreição pode. Bolsonaro incita rotineiramente a violência”.

“Os seguidores de Bolsonaro estão mais bem armados do que nunca: desde que ele tomou escritório e brechas ampliadas no controle de armas, o número de armas em mãos privadas dobrou para 2 milhões. Se o tribunal eleitoral do Brasil anunciar que Lula venceu, bolsonaristas armados podem atacar o tribunal”, analisa o semanário britânico. 

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“Quando Trump perdeu, por outro lado, ele disse a seus principais apoiadores que eles haviam sido roubados e transformou essa Grande Mentira em um grito de guerra. Ela une seu movimento e lhe dá um estrangulamento sobre o Partido Republicano: dificilmente alguém que nega isso pode ganhar uma primária republicana. A mesma Grande Mentira pode fazer de Bolsonaro o político de oposição mais influente do Brasil”, diz um outro trecho do texto.

A reportagem termina afirmando que “o melhor resultado seria Bolsonaro perder por uma margem tão ampla que ele não poderia alegar plausivelmente ter vencido, seja no primeiro turno em 2 de outubro, ou (mais provavelmente) em um segundo turno em 30 de outubro. Serão algumas semanas tensas e perigosas. Outros países deveriam apoiar publicamente a democracia brasileira e, discretamente, deixar claro para os militares brasileiros que qualquer coisa parecida com um golpe faria do Brasil um pária. Os eleitores brasileiros devem resistir à atração de um populista sem vergonha. Eles, e seu país, merecem melhor”.

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Confira a íntegra do texto publicado na Economist, traduzido por César Locatelli:

O homem que se tornaria Trump

Ganhe ou perca, Jair Bolsonaro representa uma ameaça à democracia brasileira

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Todos os sinais são de que ele vai perder a eleição e dizer que ganhou

por The Economist

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Joe Biden estava falando dos Estados Unidos quando advertiu, em 1º de setembro, que "a democracia não consegue sobreviver quando um lado acredita que há apenas dois resultados para uma eleição: ou eles ganham ou as eleições foram fraudadas". Ele poderia muito bem estar se referindo ao Brasil.

No próximo mês o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, enfrenta uma eleição em que todas as pesquisas dizem que ele perderá. Ele diz que aceitará o resultado se for “limpo e transparente”, o que certamente será. O sistema de votação eletrônica do Brasil é bem administrado e difícil de ser adulterado. Mas aqui reside o problema. O Sr. Bolsonaro continua a dizer que as sondagens estão erradas e que ele está a caminho da vitória. Ele continua a insinuar, também, que a eleição poderia, de alguma forma, ser fraudada para prejudicá-lo. Ele não oferece provas credíveis, mas muitos dos seus apoiadores acreditam nele. Ele parece estar lançando as bases retóricas para pregar que houve fraude eleitoral e não reconhecer o veredicto dos eleitores. Os brasileiros temem que ele possa incitar uma insurreição, talvez como a que sofreu os Estados Unidos quando uma multidão de apoiadores de Donald Trump invadiu o Capitólio em 6 de janeiro de 2021 - ou talvez até pior.

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Uma razão para se preocupar que o Sr. Bolsonaro possa pedir emprestada uma página do manual sem princípios do Sr. Trump é que ele já o fez muitas vezes antes. Ele semeia a divisão: o outro lado não é meramente errado, mas mau. Ele rejeita as críticas como "notícias falsas". Seus instintos são tão autoritários quanto os do Sr. Trump: ele se torna nostálgico ao relembrar os dias do governo militar no Brasil. Um de seus filhos, que também é um de seus conselheiros mais próximos, aplaudiu abertamente os manifestantes do Capitólio. O Sr. Bolsonaro foi um dos últimos líderes mundiais a aceitar que o Sr. Biden havia vencido.

O Sr. Bolsonaro, anteriormente um impertinente congressista de boca suja, foi eleito presidente em 2018 em uma onda de fúria anti-establishment. Para realizar essa façanha improvável, ele havia aprendido truques de outro azarão de boca suja e amplamente subestimado. O mais importante desses truques foi o uso indevido e desonesto, porém hábil, das mídias sociais. Ele continua, neste quesito, a ser o mestre incontestável do Brasil e, assim, convenceu seus apoiadores de duas coisas. Primeiro, que sua derrota será a prova de que a votação foi ilegítima. Segundo, que uma vitória para seu principal adversário, Luiz Inácio Lula da Silva, entregaria o Brasil ao demônio. Na realidade paralela que o Sr. Bolsonaro construiu, o presidente Lula fecharia as igrejas brasileiras, transformaria o país em um narco-estado e incentivaria os meninos a usarem vestidos.

Isso é um disparate. Lula é um esquerdista pragmático e foi um presidente bastante bem-sucedido entre 2003 e 2010. Impulsionado por um boom de commodities, ele presidiu o aumento dos rendimentos e uma grande expansão do estado de bem-estar. O boom entrou em colapso depois que ele deixou o cargo, e sua sucessora e protegida, Dilma Rousseff, foi cassada em meio a um vasto escândalo de corrupção que remonta a anos atrás. O próprio Lula foi considerado culpado de aceitar subornos, embora suas condenações tenham sido posteriormente descartadas e ele negue irregularidades. Em suma, ele está longe de ser o candidato ideal, mas está perfeitamente dentro do domínio do normal - e é um defensor da democracia.

O Sr. Bolsonaro, por seu instinto, não é. Ele pode operar dentro de um sistema democrático, mas ele está constantemente à procura de maneiras de escapar de suas restrições. E a preocupação é que o sistema que restringe suas ações é menos robusto do que o que restringiu o Sr. Trump. É inconcebível que as Forças Armadas norte-americanas sejam cúmplices de um golpe, mas o último regime militar do Brasil só terminou em 1985. O exército está profundamente enraizado no governo e fez perguntas sobre o sistema de votação. Há um burburinho no país sobre um possível golpe.

Provavelmente não vai acontecer, mas algum tipo de insurreição pode acontecer. Rotineiramente, o Sr. Bolsonaro instiga a violência. (É difícil interpretar de outro modo frases como "Vamos metralhar... apoiadores do Partido dos Trabalhadores.”) Mais de 45 políticos foram assassinados nos primeiros seis meses de 2022. Os seguidores do Sr. Bolsonaro estão melhor armados do que nunca: desde que assumiu o cargo e ampliou as brechas nos controles de armas, o número de armas em mãos privadas dobrou para 2 milhões. Se o tribunal eleitoral do Brasil anunciar que Lula venceu, bolsonaristas armados poderão atacar o tribunal. A questão, então, é que lado tomariam as forças policiais militares, que deveriam manter a ordem e que são compostas por 400 mil integrantes. Eles têm uma atitude agressivamente beligerante e gostam do Sr. Bolsonaro, que propôs uma lei que protege policiais que matam suspeitos. Alguns podem se provar mais leais a ele do que à constituição brasileira. Se houver caos nas ruas, o Sr. Bolsonaro pode invocar poderes de emergência para adiar a entrega do poder.

Desse modo, ele representa uma ameaça tão grande para a maior democracia da América Latina quanto para a maior floresta tropical do mundo. (Em seu mandato, o corte e a queima da Amazônia avançaram 70% mais rápido do que antes, porque ele não faz quase nada para pará-la). E aconteça o que acontecer, ele e o seu movimento não vão desaparecer. Ele aprendeu com o Sr. Trump como arrancar influência e poder das garras da derrota.

Quando candidatos normais perdem eleições, seus partidos tendem a descartá-los em troca de alguém novo. Quando o Sr. Trump perdeu, em contraste, ele disse a seus apoiadores principais que eles haviam sido roubados e transformou essa Grande Mentira em um grito de guerra. O que une seu movimento e lhe dá completo poder sobre o Partido Republicano: dificilmente alguém que renegue isso pode ganhar uma primária republicana. A mesma Grande Mentira poderia fazer do Sr. Bolsonaro o político de oposição mais influente do Brasil. Sua base - evangélicos, proprietários de armas e agricultores que se sentem super-regulados e vulneráveis às invasões de terra - pode ficar com ele, convencidos de que ele é o presidente legítimo do Brasil. Seus apoiadores no Congresso e nos estados podem dificultar a capacidade de governar de Lula. É possível que o Brasil se torne cada vez mais dividido.

Nada a perder a não ser as suas motosserras

O melhor resultado seria o Sr. Bolsonaro perder por uma margem tão ampla que ele não possa plausivelmente alegar ter vencido, seja no primeiro turno em 2 de outubro, ou (mais provável) em um segundo turno em 30 de outubro. Serão semanas tensas e perigosas. Outros países devem apoiar publicamente a democracia brasileira e deixar claro aos militares brasileiros que qualquer coisa que se assemelhe a um golpe faria do Brasil um pária. Os eleitores brasileiros devem resistir à atração de um populista desavergonhado. Eles, e o seu país, merecem coisa melhor.

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