Grupo indígena isolado é identificado na Amazônia e já corre risco de extinção

O Brasil é o país onde há mais isolados, e apenas um deles vive fora da Floresta Amazônica, os Avá-Canoeiro, que ocupam porções de Tocantins e Goiás



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Brasil de Fato - Uma expedição da Fundação Nacional do Índio (Funai) identificou um grupo de indígenas isolados, até então desconhecidos, no sul do estado do Amazonas. Segundo estudiosos, o grupo é formado por dezenas de indivíduos que habitam uma área de mata no município de Lábrea (AM), próximo ao rio Purus.

A informação foi repassada em setembro de 2021 para a Coordenação Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (GIIRC), vinculada à sede da Funai em Brasília, mas até hoje, cinco meses depois, o órgão não tomou as medidas necessárias à proteção do grupo.

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Na avaliação de indigenistas ouvidos pelo Brasil de Fato, a ausência de medidas de proteção ao grupo indígena se torna ainda mais preocupante devido à pandemia de covid-19 e aos altos índices de desmatamento na região, que vêm batendo recordes. 

Indígenas isolados são aqueles que se refugiaram em áreas remotas e não mantêm contato regular ou significativo com a sociedade dos colonizadores. Contudo, especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato garantem que a população é diferente de outras em isolamento voluntário que habitam regiões próximas.

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O grupo deixou à mostra vestígios materiais que comprovam a ocupação do território nos últimos anos. 

Informações sobre isolados são tratadas como sigilosas pela Funai e pelos indigenistas, pois a divulgação de detalhes pode estimular a atuação de criminosos ambientais.

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"Funai se recusa a protegê-los"

Embora considerada um marco na história dos povos originários brasileiros, a revelação causou preocupação a organizações ligadas à questão indígena. 

Além da pandemia, o motivo é a conduta do governo Jair Bolsonaro (PL), que responde pela acusação de genocídio de povos originários no Tribunal Penal Internacional de Haia.

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Como já ocorreu no passado, o contato tem o potencial de dizimar essas populações, cujos sistemas imunológicos são mais suscetíveis a doenças infectocontagiosas. 

“A Funai deixou de cumprir seu dever constitucional de todas as formas possíveis. Na região, a cobertura vacinal contra a covid-19 está abaixo de 30%, e há incidência de malária. Então, só por isso, já deveriam ter sido tomadas atitudes mais enérgicas”.

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A crítica é do indigenista Leonardo Lenin Santos, integrante do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (Opi).

A existência do grupo, segundo ele, foi confirmada em setembro de 2021 durante expedição de uma equipe descentralizada da Funai responsável pelos trabalhos com os isolados e de recente contato. 

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“Mas até agora não houve nenhuma alteração na rotina burocrática da Funai. Eles simplesmente sentaram em cima dessa informação e não fizeram nada. É inédito, eu nunca vi isso”, afirma.

Exploração de recursos naturais

É urgente suspender, conforme Santos, a exploração de recursos naturais, a criação de novas propriedades rurais e a expansão das propriedades já existentes na região.

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O poder de fazer isso é da Funai, por meio da emissão de uma portaria chamada “restrição de uso”, cujo objetivo é impedir invasões, garantindo a sobrevivência dos indígenas até a demarcação do território. 

O mecanismo legal ainda não foi aplicado para a terra ocupada pelo grupo, que segue sem qualquer proteção do Estado e em risco de extinção. 

A preocupação se acentua por conta da proximidade dos isolados com ribeirinhos da Reserva Extrativista (Resex) Médio Purus, o que aumenta o risco de contágio. 

O gerente de povos isolados da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Luciano Pohl, ressalta a urgência de se intensificar a presença de equipes de saúde e realizar o diagnóstico de doenças na população do entorno. 

“Tem que vacinar todo mundo e fazer um cordão para que elas fiquem saudáveis. Se, por um desastre, acontecer um encontro, eles não vão se contaminar com uma doença qualquer que pode acabar com o povo”, afirma Pohl. 

Alvos preferenciais 

O caso da Terra Indígena (TI) Ituna Itatá, no Pará, onde há presença de isolados, demonstra como esses grupos são vítimas preferenciais dos desmatadores. 

Em setembro e outubro do ano passado, a devastação na área cresceu mais de 1.800% em comparação com o mesmo período de 2020.  

Na última sexta-feira (28), a Justiça Federal determinou que a Funai renovasse em 48 horas a restrição de uso do território, localizado nos municípios de Altamira e Senador José Porfírio.

Até a publicação desta reportagem, a ordem judicial não havia sido cumprida, e a área continuava sob a mira de grileiros. 

Localização de novos grupos é rara

A descoberta histórica no sul do estado do Amazonas demonstra que a Floresta Amazônica ainda abriga povos bem sucedidos na recusa de conviver com a sociedade formada pelos colonizadores. 

Mas a ideia de que eles passaram ilesos pelos últimos cinco séculos não é correta. 

Muitos tiveram experiências traumáticas de contato com não indígenas, segundo o Instituto Socioambiental (ISA).

Ao serem massacrados pela violência ou por doenças trazidas pela colonização, decidiram se refugiar em áreas remotas como forma de resistência.  

Os marcos legais brasileiros e internacionais garantem o direito desses grupos de permanecerem refugiados. Por isso, sua identificação é realizada, principalmente, por meio da identificação de indícios na mata ou depoimentos de testemunhas. 

O Brasil é o país onde há mais isolados, e apenas um deles vive fora da Floresta Amazônica, os Avá-Canoeiro, que ocupam porções de Tocantins e Goiás. 

115 grupos isolados

A Funai registra oficialmente a existência de 115 grupos isolados, sendo que 28 deles tiveram a identificação confirmada e os outros estão em investigação.

Segundo Luciano Pohl, da Coiab, é usual que esses registros sejam atualizados com informações coletadas durante expedições. Eventualmente, grupos em investigação são confirmados.

Já a adição de mais um povo a essa lista, como deve ocorrer a partir da nova descoberta no sul do Amazonas, é bem mais raro.

“Podemos ver que nem todo mundo precisa aceitar esse modo em que a gente vive. O deles é um modo alternativo, viável ainda hoje. Para quem não acredita que isso é possível, está aí um belo exemplo”, destaca Pohl.

Outro lado

A Funai recebeu os questionamentos da reportagem, mas não enviou respostas até a publicação desta matéria. Caso haja retorno, o texto será atualizado.  

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