"As máquinas vão raspar a pele da Terra e feri-la", diz líder ianomâmi Davi Kopenawa, sobre marco temporal

Kopenawa disse que os garimpeiros ilegais, encorajados pela retórica de Bolsonaro, estão invadindo as terras ancestrais de seu povo em números crescentes e estão usando armas automáticas para intimidar os ianomâmis

Davi Kopenawa
Davi Kopenawa (Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil)


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Por Amanda Perobelli e Anthony Boadle (Reuters) - O líder ianomâmi Davi Kopenawa teme que o julgamento do chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas possa piorar um avanço de garimpeiros encorajado pelo presidente Jair Bolsonaro.

"As máquinas vão raspar a pele da Terra e feri-la", disse ele à Reuters em Brasília, onde milhares de indígenas se reuniram na semana passada para acompanhar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF).

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Kopenawa disse que os garimpeiros ilegais, encorajados pela retórica de Bolsonaro, estão invadindo as terras ancestrais de seu povo em números crescentes e estão usando armas automáticas para intimidar os ianomâmis.

No passado, garimpeiros levaram gripe e malária, que mataram centenas de ianomâmis, mas hoje o perigo é a disseminação da Covid-19, que matou nove indígenas de seu povo até agora.

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Na quarta-feira, o STF discutirá o chamado marco temporal para a demarcação de terras indígenas. A tese, se vencedora, introduziria uma espécie de linha de corte para as demarcações.

Qualquer área somente seria passível de demarcação se ficar comprovado que os índios estavam lá até a promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Do contrário, não haveria esse direito.

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A decisão afetará 230 reivindicações de terras pendentes, muitas das quais fundamentais na luta contra o desmatamento na Amazônia. Uma derrota para os povos indígenas no tribunal abriria um precedente para a reversão dos direitos indígenas, em linha com o defendido por Bolsonaro e representantes do agronegócio.

"Nossa terra indígena está homologada e registrada e assinada pelo governo federal em 1992, mas eles querem mexer e reduzir o tamanho porque Bolsonaro diz que é muito grande e tem pouco índio", disse o líder ianomâmi, de 66 anos.

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Os cerca de 29 mil ianomâmis vivem em 360 aldeias distribuídas ao longo dos 96.650 quilômetros quadrados de sua reserva.

Porta-voz dos ianomâmis de renome internacional, Kopenawa é autor de "A Queda do Céu", um relato poético de sua iniciação como um xamã, seus primeiros encontros com forasteiros e um apelo para salvar a cultura de seu povo e a floresta tropical.

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“Bolsonaro quer explorar e permitir o garimpo e mineração, tirar madeira, criar boi, plantar soja. Mas o povo ianomâmi não quer isso”, disse Kopenawa.

A mineração significaria derrubar árvores para abrir estradas e levar maquinário pesado para "raspar a terra para fazer buracos e extrair pedras preciosas, ouro, diamantes, cassiterita, nióbio e urânio".

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Bolsonaro afirma repetidamente que os indígenas representam menos de 1% dos brasileiros e vivem em mais de 13% do território do país, acumulando riquezas minerais que precisam ser exploradas.

Críticos afirmam que os esforços de Bolsonaro para legalizar a mineração em terras protegidas têm incentivado o avanço de garimpeiros ilegais, que invadem a reserva ianomâmi em barcos a motor que sobem os rios ou em aviões que pousam em pistas clandestinas na floresta.

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Uma onda de invasões na década de 1980 foi marcada por garimpeiros oferecendo facões, redes, roupas, sabão e até armas e bebidas alcoólicas para fazer amizade com os ianomâmis, disse Kopenawa. Eles perseguiram as mulheres e espalharam doenças mortais, como gripe e malária.

Hoje o perigo é a disseminação da Covid-19, disse ele. Após críticas internacionais de que os indígenas do Brasil foram deixados à mercê do vírus, o governo começou a vacinar as comunidades, e 84% dos ianomâmis que deveriam receber a primeira dose foram vacinados.

Um inimigo igualmente perigoso é o mercúrio usado pelos garimpeiros para separar o ouro da terra. O metal tóxico está poluindo rios e envenenando os peixes dos quais os ianomâmis e outros indígenas dependem para se alimentar.

"A terra fica ferida por anos e anos com o mercúrio, e não tem remédio para curar a terra", disse Kopenawa, que reclama que o governo pouco ou nada fez para expulsar os garimpeiros, apesar de uma ordem do STF para proteger os indígenas.

“Eles querem acabar com a gente e tomar nossa terra. Temos que continuar lutando para deixar a terra para nossos netos, para que gerações futuras possam continuar com nossos costumes, nossa língua, nosso canto”, disse.

O Palácio do Planalto não respondeu a um pedido de comentário.

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