Marcelo D'Salete: impossível compreender o Brasil sem passar pelas vivências negras
Quadrinista relatou trajetória, refletiu sobre racismo e diáspora negra, explicando como esses elementos se manifestam em sua obra; veja vídeo na íntegra
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Opera Mundi - No programa SUB40 desta quinta-feira (11/11), o jornalista e fundador de Opera Mundi, Breno Altman, entrevistou o quadrinista Marcelo D’Salete, autor de Angola Janga (Editora Veneta), obra ganhadora do Prêmio Jabuti de 2018 na categoria História em Quadrinhos.
Angola Janga, título que vem de um idioma banto de região angolana, significa “pequena Angola” ou “minha Angola” (em tradução livre), e diz respeito à tentativa de recriar a Angola no Brasil com o Quilombo dos Palmares, mas com pessoas de outros povos africanos e até indígenas.
“É uma história fantástica, pela qual me apaixonei, e uma história que nós conhecemos hoje em grande parte graças ao movimento negro. Percebi que era possível explorar muito a história de Palmares e essa foi a minha tentativa. Queria colocar essa história de existência e resistência negra diaspórica como contraponto à história do Brasil que a gente conhece, dialogando com diferentes formas de luta contra a opressão, individuais e coletivas”, discorreu o quadrinista.
O movimento e a luta negra, histórica e atual, é tema recorrente nas obras de D’Salete. Cumbe também fala sobre histórias de resistência no interior de Pernambuco durante o Brasil colonial. Já Encruzilhada e Noite Luz fazem recortes mais recentes e urbanos da experiência negra, a partir da periferia.
“Quero mostrar que não compreendemos o Brasil sem passar pela vivência e as narrativas negras, sem pensar sobre a experiência da população pobre, negra e marginalizada que hoje sabemos que passa fome. Sem compreender o que essas pessoas estão vivendo, ficamos apartados do Brasil real e profundo”, defendeu.
Para contar suas histórias, D’Salete aposta por uma estética em preto e branco, mas revelou que pretende desenvolver projetos mais coloridos. Inspirado por quadrinistas como Laerte e Peter Cooper, o autor contou que outra grande fonte de inspiração é o hip hop.
“Ele sintetiza uma voz de demanda e resistência da periferia de forma muito contundente. Me deu instrumentos para pensar na minha arte. Percebi que havia um universo de referências negras que até então eu não tinha tido contato nos quadrinhos. O hip hop virou a chave de como eu poderia falar da discriminação e do racismo nos quadrinhos, queria trazer às HQs a potência do rap”, contou.
Movimento negro e a esquerda
Ainda que sua produção artística se dialogue com o movimento negro, D’Salete afirmou que já não é mais um militante tão ativo quanto foi durante sua época estudantil, principalmente quando formava parte de um cursinho público que o ensinou a ver a sociedade de outro modo, os "preconceitos que sofria, como contextualizar isso na nossa história e o que fazer contra essa engrenagem”.
Ele reforçou que suas obras são fruto do diálogo que teve com a militância negra orgânica e com o conhecimento acadêmico ao qual teve acesso. O autor ainda celebrou que atualmente as demandas do movimento negro já não são reconhecidas apenas pela academia, mas estão chegando à militância de esquerda e estudantil de forma mais generalizada, “por mais que muito ainda tenha que ser aprendido”.
Ele citou como resultado as políticas afirmativas que foram implementadas durante os governos petistas, como o sistema de cotas e o Bolsa Família.
“Estamos vendo que essas conquistas estão sendo cortadas e vai ser uma cicatriz enorme. Então não tenho dúvida do tipo de política que vou apoiar nas eleições do ano que vem. Não sei qual candidato. Procurarei candidatos com pautas de combate ao racismo e combate à pobreza, o que não será nenhum de direita”, ponderou D’Salete em referência ao pleito de 2022 no país.
O quadrinista ressaltou a importância de Lula para a história do Brasil e não descartou a relevância de sua candidatura no combate ao atual governo e o grupo político que o apoia, “mas gostaria de ver outras possibilidades para a esquerda”.
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