Jones Manoel: o liberalismo foi fundado na exclusão social
Em entrevista à TV 247, o historiador marxista Jones Manoel relata como se tornou comunista, rebate os ataques que sofreu após ser elogiado por Caetano Veloso e explica por que defende com veemência pensadores como Domenico Losurdo e Frantz Fanon, que propõem a crítica ao liberalismo e ao colonialismo
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247 - Na última terça-feira (08/09), o historiador, professor e autor marxista Jones Manoel concedeu uma entrevista à TV 247. Nela, ele tratou sobre diversos temas, entre eles os recentes ataques da imprensa tradicional contra ele, as contradições do discurso liberal internacional e nacionalmente e o papel da esquerda radical no cenário atual.
Após ter sido citado por Caetano Veloso durante um programa de TV apresentado por Pedro Bial, Jones vem passando por uma investida massiva por parte das tradicionais bastiões do discurso liberal.Tendo lido e assistido o conteúdo de Jones, ele diz ter se tornado menos “liberalóide”, se sentindo assim mais “evoluído intelectualmente.”
Amanda Audi, do The Intercept, chamou Jones de “treteiro das redes sociais”, colocando em dúvida até mesmo sua “capacidade de responder um monte de pergunta no #RodaViva.” Guga Chacra, da GloboNews, em tom condescendente e paternalista, disse em seu Twitter: “Oi, liberal não é assassino. Nem os liberais no sentido econômico, como se usa no Brasil e normalmente associado à direita, e tampouco liberais no sentido político e social, como se usa nos EUA e normalmente associado à esquerda. Assassino é quem mata. Avisem o stalinista.
Na entrevista, Jones enquadra esses ataques à falta de democracia nos meios de comunicação no Brasil. Ele diz: “No Brasil, não existe um grande debate de verdade nos meios de mídia de crítica ao liberalismo. Isso é banido no debate brasileiro.”
“Figuras como eu, que tem uma postura abertamente anti-liberal, são raras, mas estão começando a crescer. E eles estão com medo, porque qual é a ideia deles? A ideia deles é fazer do Brasil um Estados Unidos, que tem o Partido Democrata e o Partido Republicano. Então eles querem fazer com que a direita seja Bolsonaro e a esquerda seja Tabata Amaral. Eles querem banir o radicalismo de esquerda justamente por isso.”
Mas qual é exatamente essa crítica ao liberalismo?
Jones explica:
“O discurso simplesmente não bate. O discurso do Brasil como um país democrático, como o país do estado de direito, o país da liberdade, o país da igualdade de oportunidades… Esse discurso não batia com a minha realidade. Quando eu encontrei o marxismo, eu consegui ter uma explicação do porquê que essas coisas acontecem, como elas começaram a acontecer e como elas podem ser transformadas.”
Assim, ele desenvolve a crítica revisionista ao liberalismo, através do filósofo marxista italiano Domenico Losurdo:
“Existe um debate muito difundido na cultura brasileira há décadas de que aqui o liberalismo foi uma ‘ideia fora do lugar,’ porque aqui os liberais defendiam a escravidão. Essa ideia parte do pressuposto de que o liberalismo na Europa ocidental e nos Estados Unidos não defendia a escravidão, e que aqui o liberalismo brasileiro seria um liberalismo estranho, anômalo, que defende a escravidão.”
“O que Domenico Losurdo mostra é que na história real do liberalismo, ele nunca foi uma ideologia ou projeto político universalista. Ele sempre teve as suas cláusulas de exclusão, e não se aplicava a negros, a povos colonizados, as mulheres e à classe trabalhadora de maneira mais geral. Então o liberalismo é a defesa da liberdade, da democracia, do estado direito, mas somente dentro da comunidade dos brancos proprietários.”
“Então, o liberalismo do Brasil que defendia a escravidão não é fora da curva. O liberalismo inglês defendia a escravidão também.”
Assim, apesar da clara diferença histórica, é necessário que enxerguemos o discurso liberal atual, que visa excluir a esquerda radical do debate político (assim também excluindo minorias raciais), como uma extensão da lógica exclusivista inerente ao liberalismo.
Uma das táticas de exclusão mais comuns executadas pelos liberais, segundo Jones, é a equiparação do comunismo e suas vertentes, como o estalinismo, ao fascismo.
Para ele, é necessário contrariamos a narrativa hegemônica e exaltarmos os avanços ocasionados pelos regimes comunistas ao longo da história:
“É o mesmo fenômeno o fim do analfabetismo na Rússia, a maior criação já vista até então de universidades e escolas técnicas, a promoção de ciência e tecnologia e de cultura, o fim das relações servis que ainda subsidiam, a promoção de vários operários para professores universitários, cientistas, engenheiros, diretores de fábrica, o processo de emancipação relativo da mulher que entra no mercado de trabalho, o combate ao racismo, ao colonialismo, ao antissemitismo, o apoio à guerra civil espanhola contra o fascismo, o apoio aos movimentos de libertação na África e na Ásia, e é também parte do estalinismo o Gulag, a repressão, os Processos de Moscou e a proibição do aborto.”
“O estalinismo é um processo contraditório, o que se explica por um contexto geopolítico e histórico da Rússia, pela decisão dos protagonistas políticos. Então reduzir o estalinismo a simples terror e repressão é uma análise que ou é liberal, ou então é uma análise de certas correntes marxistas que são interessadas porque perderam a disputa no século XX que é moralista e reducionista.”
A falta de profundidade nos debates políticos no Brasil, para Jones, é uma das grandes tragédias dos dias atuais.
Assista a entrevista completa no canal da TV 247:
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