Expedição independente no gasoduto Nord Stream descobre um vestígio que escapou aos investigadores oficiais
Próximo ao local das explosões, descobrimos uma bota de mergulho usada pelos mergulhadores da Marinha dos EUA. Como foi que isto escapou aos investigadores suecos?
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Artigo de Jeffrey Brodsky* originalmente publicado no website The Grayzone. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247
No final da tarde do dia 24 de maio de 2023, eu estava a bordo de um pequeno navio chamado Baltic Explorer. Com o sol ainda bem alto no céu do Mar Báltico, nosso navio estava ancorado a 31 milhas náuticas da costa da Dinamarca e diretamente acima do gasoduto rompido Nord Stream 2, na zona econômica exclusiva da Suécia.
Durante vários minutos, eu observei uma filmagem de vídeo ao vivo de um drone submarino que mostrava imagens jamais vistas antes do rompimento do gasoduto. De repente, um objeto estranho apareceu na tela. Era uma bota de mergulhador preta e laranja.
O The Grayzone identificou um modelo que se parece muito com esta bota é que é usada tanto pela Marinha dos EUA quanto por mergulhadores comerciais. Mergulhadores da Marinha ucraniana também têm sido vistos usando botas similares.
Nós também soubemos que a presença da bota havia sido reportada previamente aos investigadores, no entanto, eles não a recolheram nem divulgaram a existência da mesma.
Uma nova pista no fundo do Mar Báltico
O que ocorreu em 26 de setembro de 2023 estilhaçou a atmosfera plácida que geralmente prevalece no Mar Báiltico. Naquele dia, enquanto a guerra na Ucrânia se aprofundava, quatro explosões romperam os gasodutos Nord Stream 1 e 2 que custaram US$ 23 bilhões e conduziam gás natural da Rússia para a Europa – energia barata que foi crítica para manter a base industrial da Alemanha.
O Nord Stream 1 e o Nord Stream 2 consistem em dois tubos cada um. Três deles foram rompidos. Uma linha do Nord Stream 2 permanece intacta.
A Suécia, a Dinamarca e a Alemanha realizaram investigações, mas, com exceção de uma avaliação inicial sueca de que as explosões provavelmente foram causadas por uma “sabotagem grosseira”, as suas descobertas ainda não foram tornadas públicas.
Agora, mais de oito meses depois, uma nova pista foi revelada em um dos mistérios geopolíticos mais urgentes do século.
A bota avistada em nossa expedição tem uma semelhança impressionante àquelas usadas por mergulhadores da Marinha dos EUA.Os mergulhadores da Marinha ucraniana treinados pelos EUA também foram vistos usando o mesmo modelo de bota, ou uma que é virtualmente idêntica. No entanto, deve-se assinalar que botas de aparência similar também parecem ser comercialmente disponíveis.
Será que isso dá uma pista sobre a identidade dos perpetradores do ataque ao Nord Stream? Obviamente, são necessárias investigações adicionais sobre a origem da bota, mas a sua localização e a sua marca parecem ser significativas.
No final de maio, o engenheiro sueco Erik Andersson conseguiu ter acesso aos locais das explosões de ambos os gasodutos 1 e 2 do Nord Stream, tanto nas zonas econômicas exclusivas suecas quanto nas dinamarquesas. Durante a nossa expedição aos locais das explosões, o The Grayzone obteve imagens e vídeos de sonar e de drones submarinos que jamais foram vistas antes pelo público.
As autoridades marítimas suecas e dinamarquesas foram notificadas sobre a expedição. Como uma medida cautelar, o organizador da expedição registrou uma solicitação junto à Autoridade de Defesa Sueca de permissão para publicar as imagens de alta resolução e jamais dantes vistas do sonar da expedição.
A bota foi avistada aproximadamente a cinco metros do pequeno vazamento do gasoduto Nord Stream 2, na zona econômica exclusiva sueca. Isto ocorreu alguns minutos antes das 19 horas de 24 de maio de 2023, quando o drone submarino da nossa expedição a avistou.
Desconhece-se por quanto tempo a bota ficou exposta ao fundo do mar (como visto na Figura 2). Andersson, o organizador da expedição, acredita que é possível que a bota estivesse previamente coberta por sedimentos ou lama, que foram movidos por correntes submarinas ou pelas explosões. De outra maneira, não está claro como os investigadores não poderiam tê-la visto.
A bota se assemelha muito à sobrebota de mergulhador de marca Thor, produzida pela Northern Diver, uma empresa britânica cujos produtos são manufaturados na China.
“Isto parece ser uma sobrebota Thor”, declarou Neil Tordoff, diretor de vendas militares e comerciais da empresa Northern Diver, depois de ver a foto da bota enviada pelo The Grayzone. “Não posso ter 100% de certeza”.
Tordoff disse que Northern Diver não fabrica mais esta bota devido a interrupções na produção causadas pela pandemia de Covid-19.
“Se for a bota Thor, ela foi usada e ainda é usada por mergulhadores na indústria de petróleo e gás. Ela faz parte de uma roupa de mergulho seco que normalmente seria usada em águas contaminadas, para manter o mergulhador seguro”, Tordoff explicou.
“Este item é usado no mundo inteiro”, ele adicionou.
O dono da bota pode ter sido um mergulhador que a perdeu enquanto estava colocando as bombas. Alternativamente, a bota pode pertencer a um mergulhador que foi chamado à cena do crime para recuperar uma carga que não explodiu e que seria usada na linha intacta do Nord Stream 2 – uma teoria proposta por Seymour Hersh. Ou talvez tenha pertencido a um mergulhador comercial.
O organizador da expedição, Andersson, contatou a empresa Nord Stream 2 AG (NS2 AG) para perguntar sobre a bota. Um representante da empresa confirmou a presença do objeto.
“Eu tive uma longa conversa [com a NS2 AG em 30 de maio]”, explicou Andersson. Eles “negam claramente que tenha havido qualquer mergulho para a construção ou manutenção do gasoduto naquela área”.
A NS2 AG também disse à Andersson que a empresa havia “descoberto a bota em fevereiro e que havia reportado o fato aos investigadores suecos”.
O submarino de salvamento HMS Belos e um navio de mergulho da Marinha sueca vasculharam o local dos vazamentos em outubro de 2022. O navio ficou estacionado por mais de oito horas em dois dias separados, no início e no final de outubro, sobre o local onde a bota foi avistada.
Por que os investigadores suecos negligenciaram de coletar a bota, ou até mesmo de mencioná-la em qualquer uma das suas declarações públicas? Até o momento da publicação, o The Grayzone não havia recebido resposta alguma a um e-mail pedindo esclarecimentos deles.
Uma fonte em contato com o The Grayzone falou com um mergulhador do navio Belos, o qual negou que a bota tivesse sido vestida por qualquer um dos seus mergulhadores. O mergulhador disse que é possível que quem vestiu a bota não tenha atentado para a ausência desta.Um mergulhador do navio Belos que esteve envolvido na investigação sueca e representantes da empresa NS2 AG afirmam que não desempenharam qualquer papel na aparição da bota.
Quem bombardeou o gasoduto Nord Stream?
Neste mês de fevereiro, o veterano jornalista investigativo Seymour Hersh citou “uma fonte com conhecimento direto do planejamento operacional” sobre uma operação clandestina conduzida pela CIA em parceria com a Noruega, um estado parceiro-chave da OTAN, para destruir os gasodutos Nord Stream. Um punhado de auto-descritas fontes abertas pesquisadores de inteligência (OSINT – open-source intelligence) alegam haver “desmascarado” as revelações da reportagem de Hersh, porém, desde então, tornou-se aparente que algumas das alegações inicialmente feitas pelos pesquisadores OSINT podem ter sido exageradas.
O jornal sueco Expressen reportou em maio de 2023 que a relevância dos navios russos avistados tinha sido “descartada” e “não é mais considerada de interesse pelos investigadores alemães”. Segundo o Expressen, “as posições destes navios foram mapeadas e a conclusão deve ser que eles não estavam em lugar algum de onde pudessem executar este feito”.
Por ora, os investigadores alemães parecem estar focalizados no Andromeda, um iate privado que eles suspeitam que tenha sido alugado por uma pequena equipe de militantes pró-Ucrânia para transportar explosivos até os gasodutos Nord Stream.
Através da nossa expedição até os locais do ataque aos gasodutos Nord Stream, o The Grayzone obteve imagens e vídeos que jamais foram vistos antes pelo público. As imagens do sonar e os vídeos e imagens do drone submarino podem dar uma visão sobre a quantidade de explosivos usada na sabotagem e a sua colocação.
Por ora, nós ficamos nos perguntando por que os investigadores suecos ainda devem demonstrar publicamente qualquer interesse numa bota encontrada próximo ao local da explosão do Nord Stream. Resta saber se este item pode oferecer uma pista sobre a identidade dos perpetradores do ataque.
*Os artigos de Jeffrey Brodsky têm sido publicados no Jacobin, Discourse, In These Times, La Vanguardia (in Spanish and Catalan), El País and The Copperfield Review, entre outros. Ele pode ser encontrado no Twitter: @JeffreyBrodsky5
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