Marco Fernandes: política de 'covid zero' evitou colapso da China

Historiador estabelecido em Xangai diz que sistema público de saúde não suportaria contaminação descontrolada e governo optou por política socialista para preservar vidas

Lockdown contra a Covid-19 em Xangai, China. 28/03/2022
Lockdown contra a Covid-19 em Xangai, China. 28/03/2022 (Foto: REUTERS/Aly Song)


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Opera Mundi - Falando de Xangai, onde mora, o historiador, doutor em Psicologia e pesquisador do Instituto Tricontinental, Marco Fernandes afirmou, em entrevista ao jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS ENTREVISTA, nesta sexta-feira (15/07), que a China escolheu perder trilhões de dólares em vez de vidas humanas para a covid-19. 

Com a política chamada de "Covid Zero Dinâmica", diz, o governo evitou o colapso do sistema de saúde pública em um país com 1,4 bilhão de habitantes. O número oficial de mortos é de 5.226 desde janeiro de 2020, e, citando uma projeção da revista Nature, Fernandes destaca que 1,6 milhão de chineses teriam morrido sem uma política de controle da pandemia. "O que a China está fazendo é ciência”, defende.

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Para o também editor do boletim eletrônico Notícias da China, o país colocou as pessoas à frente da economia ao optar por aplicar mais de 11 bilhões de testes de covid na população, monitorar cada passo dos cidadãos por um aplicativo chamado Código de Saúde, isolar pessoas infectadas em centros de quarentena espalhados por todo o território e decretar lockdowns localizados ou mais amplos, como os que aconteceram em Pequim e Xangai neste ano, diante de novos surtos do coronavírus.

“O governo diz que coloca a vida das pessoas em primeiro lugar. A economia vai sofrer? É o que chamamos de socialismo, não tem outro nome. Perdeu trilhões de dólares, mas evitou uma tragédia”, avalia.

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Fernandes afirma que o novo surto em Xangai foi fruto de um grande equívoco da administração da cidade, que tentou flexibilizar a política de Covid Zero, perdeu o controle da situação e demorou dois meses de lockdown para retornar à situação anterior. 

"A China tomou uns gols e virou o jogo de novo, mas não acabou”, resume, lembrando no entanto que a letalidade permanece baixa devido à vacinação, com uma faixa etária média de 85 anos entre os mortos em Xangai. Em termos econômicos, a China “sofreu a pancada, mas já está dando o troco”, com pacotes de incentivo, alívio fiscal, estímulo para infraestrutura e construção de novas ferrovias.

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O baque não implicou uma mudança de estratégia ou maior intervenção por parte do governo do presidente Xi Jinping na economia: “Algumas mudanças que aconteceram nos dois últimos anos estão mais relacionadas ao maior controle de alguns setores privados, como as big techs e a educação privada. Essa linha de regular o crescimento inconsequente do capital deve aumentar com a reeleição do presidente no ano que vem”.

Marco Fernandes é historiador, doutor em Psicologia e pesquisador do Instituto Tricontinental
Marco Fernandes é historiador, doutor em Psicologia e pesquisador do Instituto Tricontinental(Photo: Reprodução)Reprodução

Segundo o pesquisador, a guerra na Ucrânia tem promovido uma aceleração de tendências geopolíticas que já vinham acontecendo nos últimos anos, com reflexos na aliança entre Rússia-China e na política de expansão em relação ao Sul Global. “Se Lula voltar ao governo, os BRICS terão uma grande renovação, e é nisso que a China está apostando”, afirma, referindo-se ao afastamento do Brasil na cooperação com Rússia, Índia, China e África do Sul sob Jair Bolsonaro. “Esse governo nefasto que está aí não está preocupado com isso, mas, Lula voltando, é consenso que precisamos reindustrializar o país, e a China vem dando sinais de que está aberta a isso. A Argentina, por exemplo, tem feito acordos com a China no setor energético, com transferência tecnológica", acrescenta.

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A reindustrialização do Brasil e da América Latina significaria uma virada nas relações comerciais com a China. "Soja, petróleo, carne e minério de ferro são 89% da nossa pauta de exportação para a China. Isso não tem futuro. É bom para o agronegócio e para as mineradoras, não para o Brasil”, diagnostica. 

Marco Fernandes relata ainda uma revalorização do legado da experiência comunista de Mao Tsé-Tung entre a juventude chinesa, que se conecta ao crescimento da rejeição às políticas estadunidenses no país. “O relatório recente de um dos think tanks mais influentes, ligado ao Ministério das Relações Exteriores, diz que a China tem que desistir de qualquer tipo de reconciliação com os Estados Unidos e, mais, precisa se preparar para uma eventual guerra, após 30 a 40 anos de trégua", aponta, dizendo ainda que, segundo o documento, o país tem que desistir de "romance com os Estados Unidos, para garantir sua estratégia de crescimento econômico”. 

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A rejeição tende ao consenso, afirma. "Teve rave aqui para comemorar a morte do (ex-primeiro-ministro japonês) Shinzo Abe, sempre associado como o cara que fez a política dos Estados Unidos contra a China na região."

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