Marcio Pochmann: Europa e Estados Unidos não têm mais nada a dizer ao Brasil
Receituário neoliberal do 'museu' europeu e do 'hospício' norte-americano não se aplica à realidade brasileira, afirma economista
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Opera Mundi - O neoliberalismo desenvolvido a partir da Europa e dos Estados Unidos constitui uma ferramenta que não tem mais nada a dizer ao Brasil, na opinião do economista e pesquisador Marcio Pochmann.
“A Europa cada vez mais se assemelha a um museu do passado. E os Estados Unidos, a uma espécie de hospício numa disputa sanguinária sem saída nem perspectiva”, sentenciou ele em entrevista ao jornalista Haroldo Ceravolo Sereza, no programa 20 MINUTOS desta terça-feira (20/09).
Formulado para bloquear o deslocamento da centralidade econômica mundial dos Estados Unidos para o Oriente, o neoliberalismo conduziu o Brasil cada vez mais à posição de país periférico e dependente da exportação de produtos primários, segundo o ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Em contraponto, os países asiáticos que não adotaram o receituário do capitalismo neoliberal são os que produziram melhores resultados nas últimas quatro décadas.
Pochmann classifica os primeiros governos petistas como um ensaio “possível, ousado e corajoso” em meio a uma "unipolaridade mundial sustentada pelos Estados Unidos", um contexto que não existe mais hoje em dia.
“Decorridos 20 anos, temos hoje um mundo que não é unipolar, com uma pluralidade e centralidade diferente. Há uma importância inegável da China, da Rússia e de diversos países asiáticos”, afirma. O experimentalismo que marcou o primeiro período petista pode ser superado rumo à consolidação de uma nova realidade para o Brasil num eventual terceiro governo Lula, defende.
O economista traça paralelos entre o momento brasileiro atual e os desafios enfrentados no passado pelos presidentes Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek: “Lula é um homem vinculado à era industrial, um operário. Na sua maturidade política, pode abrir um caminho para o novo, para além do experimentalismo e do ensaio feito com êxito, coragem e ousadia, que lhe permite estar liderando sua sexta campanha como candidato a presidente da República”.
Ex-presidente da Fundação Perseu Abramo, o economista afirma que o momento atual guarda características em comum com o ciclo político de instabilidade entre a deposição do Estado Novo, em 1945, e a morte de Getúlio, em 1954: “não estamos mais vivendo o ciclo político da Nova República, consolidado na Constituição de 1988. A eleição de 2014 interrompe esse ciclo, porque uma parte dos partidos que apoiaram o candidato derrotado não aceitou o resultado e levou a eleição para um terceiro turno”.
O engajamento popular conquistado por Getúlio e Juscelino será necessário para a governabilidade de Lula, já que mais uma vez não há garantias de que o atual governante aceitará o resultado no caso de derrota.
Reindustrialização brasileira
O grupo político alinhado ao capitalismo rentista, que prevalece no poder desde 2016, conduz à estagnação e ao esgotamento do neoliberalismo à brasileira, na avaliação de Pochmann.
Para ele, o planeta se "redivide" hoje em dois grandes blocos de países: de um lado os que produzem e exportam bens digitais e de outro os consumidores, que não produzem internamente e portanto são importadores de bens e serviços digitais.
“Infelizmente o Brasil e a América Latina estão nesse segundo bloco. Essa equação não dá um país, a não ser na gestão moral da pobreza, na administração e a postergação do caos, que é o que temos visto ultimamente”, critica.
Pochmann discute os modelos de reindustrialização que o Brasil deveria perseguir num contexto pós-capitalista, a partir da reorientação da financeirização neoliberal para atividades produtivas. Um conceito ampliado de industrialização liderada pelo Estado deveria contemplar áreas novas de avanço, relacionadas à Amazônia, ao Oceano Atlântico e ao espaço sideral.
À parte as possibilidades industriais apontadas para o futuro, a reindustrialização deveria se dar a partir do fortalecimento de setores que já são fortes no país. “O Brasil é uma potência agropecuária, mas vulnerável pela dependência de produtos estrangeiros como fertilizantes, sementes e maquinários. É uma área que o Brasil poderia internalizar e tem tecnologia para isso”, exemplifica.
Defensor de uma “cesta básica digital” à maneira da cesta básica de alimentos conquistada pelos trabalhadores brasileiros dos anos 1930 e 1940, Pochmann problematiza a debilidade gerada pelo rebaixamento generalizado das relações de trabalho: “infelizmente, assistimos à dissolução da relação salarial e a uma ascensão da relação débito-crédito. O centro passou a ser o dinheiro. As pessoas sabem qual é o débito da vida, quanto custa viver por um mês, e vão atrás de crédito, que pode até ser emprego assalariado, mas está cada vez mais distante de atender às necessidades”.
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