Marcia Tiburi: o fascismo estava no governo e é natural que tenha se fortalecido

Filósofa, professora e escritora, se Lula for eleito, deve fazer “um governo buscando uma democracia radical, com a participação ativa de todos os setores da sociedade”

(Foto: Divulgação)


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Por Marilza De Melo Foucher, para o 247

Apresentação:

Marcia Tiburi é professora de Filosofia contemporânea, pesquisadora, escritora, artista e ativista. Sua pesquisa se situa no campo da filosofia social e política. Como escritora, já publicou seis romances, um livro de poesias e um conto vinculado a uma obra visual. Seu último livro foi publicado na França: “Sous mes pieds, mon corp” - Nossa Editions. Nos últimos anos, Marcia Tiburi  retomou seu trabalho com as artes visuais reunindo sua obra teórica, literária e visual. A artista militante expõe atualmente seus trabalhos na Prefeitura Municipal de Paris (Bairro 10) - desde 15 de agosto até 30 de outubro de 2022. Ela reúne artes visuais, seu trabalho como pesquisadora e literatura estimula a reflexão sobre a crise da democracia no Brasil.

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Ativista de esquerda, no Brasil foi filiada ao PSOL de 2013 a 2017. Em agosto de 2018, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores - onde está até hoje - e disputou o governo do Estado do Rio de Janeiro. No mesmo ano, sofreu perseguição política e várias ameaças de morte que a obrigaram a deixar o Brasil. Hoje é professora visitante do LLCP (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Lógicas Contemporâneas da Filosofia), apoiado pelo programa “Pause”, que lhe outorga uma bolsa de “Artiste Protection Fund do IIE”.

Entrevista

O termo fascismo e seus derivados antifascismo e neofascismo continuam a sacudir o debate público internacional. A situação talvez do Brasil seja mais complexa e dramática dada uma engrenagem que se opera entre o fascismo e o fundamentalismo religioso.

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Figuras desprezíveis da extrema direita e fundamentalistas foram eleitas e reeleitas, tais como Damares Alves, Ricardo Salles, Hamilton Mourão, Sergio Moro, Deltan Dallagnol, Mario Frias, Eduardo Pazuello, Magno Malta entre outros.  Uma sinistra composição conservadora no senado e na Câmara dos Deputados. O que revela esse resultado? Você como filósofa e grande estudiosa do neofascismo, como explica o avanço surpreendente da extrema direita segundo os resultados deste primeiro turno das eleições no Brasil?

Na verdade, não é um avanço surpreendente. O fascismo estava no governo e é natural que tenha se fortalecido através do uso da máquina pública. Nada foi feito contra o fascismo, salvo pontualmente abordado por uma mídia de esquerda que, infelizmente, ainda é muito pequena e por grupos de intelectuais engajados.

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Os movimentos sociais vêm intensificando sua participação nos partidos, o que é muito promissor do ponto de vista da necessária unidade das lutas, mas não são movimentos que trabalham especificamente contra o fascismo. A mídia brasileira continua golpista, a religião neopentecostal avança sem escrúpulos no seu projeto de poder. Alguns estudiosos vêm chamando de “cristofascismo” a esse fenômeno. E pouca coisa tem sido feito contra isso. Há resistência, mas ela não está articulada em torno dessa questão. O próximo governo de Lula terá que se organizar contra isso se quiser sobreviver. 

Alguns ativistas progressistas pedem resistência e intensificação da luta contra o fascismo. Mas se não entendermos a causa dessa expansão, não poderemos oferecer alternativas válidas. A indignação suscitada pelo avanço da extrema direita fascista e do fundamentalismo religioso no Brasil não deve afastar qualquer debate de ideias. Antes dizíamos que a extrema direita tinha saído do armário no Brasil, hoje ela se encontra enraizada. Qual é a alternativa para se opor a esta dinâmica da extrema direita? 

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Eu fui a primeira pessoa a dar nome ao fenômeno do fascismo no Brasil publicamente com meu livro “Como conversar com um fascista”. E, justamente porque, para mim, não era difícil associar o que eu havia estudado com o que começou a surgir em 2013, logo que tivemos as jornadas do mês de junho. Desde o começo de 2014 todos os elementos que convergem ao fascismo eram visíveis, o populismo, a construção do inimigo, o discurso de ódio contra as minorias, a xenofobia, o conservadorismo, o nacionalismo demonstrado no uso da camisa verde e amarela da seleção. Vários artistas e outras pessoas famosas começaram a apoiar a tendência dominante. 

Para fazer frente ao avanço da extrema direita, a democracia precisa ser preservada legalmente. O judiciário tem que garantir a Constituição, coisa que não tem acontecido desde o Golpe de 2016. 

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Precisamos também ter um governo democrático, por mais básico que ele seja. A laicidade do estado tem que ser mantida. Um projeto de educação e cultura antifascista precisa ser implantado, junto com uma regulamentação da mídia para a democracia. Toda a mistificação deve ser contida. Sem a definição desses limites não haverá democracia. O governo de Lula terá que se ocupar disso. 

Como uma pessoa próxima de Lula, que orientação você daria ao ex-presidente se sua vitória se confirmar?

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Que ele faça um governo buscando uma democracia radical, com a participação ativa de todos os setores da sociedade e de todos os grupos e movimentos democráticos. Que esse governo seja feminista, antirracista e anticolonial. E, sobretudo, que ele garanta uma perspectiva ecológica para o Brasil, como país responsável pela Floresta Amazônica e todos os outros biomas ameaçados em nosso país. 

Querendo ou não o Brasil será cobrado no futuro pelo que acontecer à floresta e ao planeta, considerando os efeitos devastadores no clima que o seu desaparecimento em curso já está causando. 

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No meio disso tudo, promover uma cultura de diálogo contra a barbárie e a mistificação, bem como contra a destruição da natureza, se tornam urgentes.

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