Jandyra Uehara: sindicatos devem se aproximar dos precarizados e das lutas populares

Sindicalismo brasileiro deixou de ser anticapitalista e precisa abandonar políticas de conciliação de classes, diz dirigente licenciada da CUT; veja vídeo na íntegra

Jandyra Uehara Alves
Jandyra Uehara Alves (Foto: Divulgação / Twitter @JandyraUeharaPT)


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Opera Mundi - A sindicalista Jandyra Uehara apontou diretrizes para a reconstrução do movimento sindical brasileiro que, segundo ela, destruído pela extrema direita e pelo neofascismo, em conversa com o jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS desta segunda-feira (22/08). 

Em seu diagnóstico, o distanciamento das centrais sindicais em relação a organizações associativas menores, a trabalhadores terceirizados, precarizados e informais deve ser revertido para que o movimento como um todo supere o neoliberalismo e volte a se centrar na luta anticapitalista. 

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“O grande problema é que os processos de disputa político-ideológica foram colocados absolutamente em segundo plano. Deixamos de ser anticapitalistas”, sintetiza, apontando a contradição entre o processo de lutas trabalhistas e políticas conciliadoras de classes.

"Fizemos muita luta imediata, mas não pelos interesses históricos da classe trabalhadora”, acrescenta, referindo-se ao ciclo dos governos petistas, quando o sindicalismo ao mesmo tempo conquistou avanços salariais acima da inflação e foi acusado de ter sido cooptado pelo governo.

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Ex-presidente do Sindicato dos Funcionários Públicos de Diadema (Sindema) e dirigente licenciada da Central Única de Trabalhadores (CUT) para concorrer a deputada estadual por São Paulo, Uehara cita um exemplo de reaproximação do sindicalismo à realidade trabalhista no país: a CUT em Sergipe se empenha em incorporar associações de pescadores ou catadores de mangaba, entre outras, imersas no mundo do trabalho como ele é hoje, mas que não tinham representação sindical. 

“Quando incorpora a economia solidária, o cooperativismo e o trabalho associativo, a CUT traz setores importantíssimos da classe trabalhadora para a organização sindical. Esse até pouco tempo era um problema controverso dentro da central, e isso a gente já superou”, relata. 

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No caso de setores terceirizados e precarizados, como o dos trabalhadores de aplicativos, os obstáculos são multiplicados: “O neoliberalismo colocou na cabeça de parte da classe trabalhadora que são todos empreendedores, cada um tem que ser patrão de si mesmo e carteira assinada não tem nada a ver. Há os entregadores antifascistas e outras organizações mais avançadas, mas vários grupos vão dizer que não, que querem ser patrões deles mesmos, empreendedores”.  

A despolitização reverbera o afastamento sindical das lutas práticas em setores públicos como saúde e educação: “Isso é tão grave que as reformas de ensino médio são feitas para inculcar na cabeça da juventude a ideia do ‘privilégio da servidão’, como diz o professor Ricardo Antunes”. À precarização, somam-se a superexploração do trabalho e a supressão radical de direitos trabalhistas.

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Na relação com o poder público, Uehara repele a compreensão de que os governos petistas tenham feito arrefecer a luta sindical e verbaliza o que se espera de um eventual terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva nesse setor: “O que objetivamente o governo tem que fazer para o fortalecimento do movimento sindical começa pela revogação da reforma trabalhista, na qual não existe aspecto positivo”. 

O mesmo se aplica à terceirização sem limites, segundo ela irmã siamesa da reforma trabalhista no sentido de operar a precarização total do trabalho. “Nem a reforma trabalhista nem a lei da terceirização são Propostas de Emenda Constitucional, portanto em tese são legalmente fáceis de revogar. Politicamente, sabemos que vamos precisar de uma grande mobilização e muita força social para conseguir revogar essas duas aberrações”, reconhece.

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No setor industrial, a mecanização desidratou e fragmentou a classe operária, debilitando fortemente a mobilização sindical, o que Uehara materializa em números: “A Volkswagen chegou a ter 40 mil trabalhadores diretos na fábrica, no final da década de 1980. Hoje são 7.500 diretos, mais uns 5.000 terceirizados, que não são representados pelo sindicato principal, o sindicato dos metalúrgicos”. 

Altman apontou que, segundo o IBGE, a taxa de sindicalização dos trabalhadores brasileiros chegou a um auge de 21,5% em 1992 e caiu para 12,5% em 2019, e também que o número de sindicatos no cresceu de modo inversamente proporcional à proporção de sindicalizados, chegando a aproximadamente 10 mil sindicatos no país. 

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Lógica semelhante à da indústria se aplica em setores diversos, seja pelo domínio das Organizações Sociais (OS) que terceirizam gestão e mão de obra na área da saúde ou pelos regimes de freelance, micro-empreendedorismo individual e trabalho intermitente hegemônicos entre trabalhadores de cultura e comunicação, entre outros. “Foi a forma que encontraram para dar uma formalização ao trabalho, mas é um engodo. Pior que ela, só a informalidade total.”

A debilidade crescente do movimento sindical achata e limita a qualidade das lutas trabalhistas possíveis: “Temos níveis de desemprego violentos e gritantes e, ao mesmo tempo, quem trabalha está sendo super-explorado com jornadas intensas. E não temos na nossa pauta a redução de jornada de trabalho sem redução de salário”. Uehara acrescenta que atualmente, segundo o Dieese, a luta da maior parte daqueles que entram em greve (a maioria no setor privado) não se dá por reajuste de salários, mas pela regularização de salários atrasados. Progressivamente, o novo sindicalismo apregoado pela CUT em sua origem vai dando lugar ao chamado sindicalismo de resultados. 

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A sindicalista reconhece, nesse processo, a acomodação por parte das centrais e especificamente da CUT: “Ela vai representar, por sua própria estrutura, um setor cada vez mais minoritário da classe trabalhadora, de forma muito engessada e sem autonomia”. A fragmentação e o nível baixo de sindicalização se interconectam com a despolitização sindical generalizada, solidificando um problema duplo, tanto organizativo quanto político. “Temos que atacar as duas frentes. Precisamos trabalhar as pautas unitárias classistas, mas isso é impossível de acontecer com uma política de conciliação de classes”, conclui.

De volta aos modos de luta utilizados nestes anos 2000 e à crítica à atuação sindical brasileira no período, Jandyra Uehara reitera a necessidade de reverter a restrição cada vez maior da luta trabalhista aos aspectos econômicos e às reivindicações imediatas. “Esse é o grande problema que a gente vai sentir depois do golpe de 2016. Com o ascenso da extrema direita e do neofascismo, os setores da classe trabalhadora foram capturados também. É uma questão de politização. De conjunto, as esquerdas e o movimento sindical em particular deixaram isso em absoluto segundo plano.”

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