Eduardo Costa Pinto: burguesia brasileira quer transformar Lula na terceira via

Após golpe de 2016, taxa de lucro explodiu sem que o país crescesse, provocando miséria; ex-presidente enfrentará resistência se tentar corrigir essa distorção, diz economista

Eduardo Costa Pinto e Lula
Eduardo Costa Pinto e Lula (Foto: Reprodução)


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Opera Mundi - O economista Eduardo Costa Pinto prevê, para um eventual terceiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a resistência da megaburguesia brasileira em reverter o aumento brutal de suas taxas de lucro. 

Em 2010, as empresas privadas não-financeiras lucravam cerca de 15% sobre o patrimônio líquido, cifra que ficou negativa em 2015 e explodiu para 26% em 2022. Essa oscilação é crucial para explicar o golpe de Estado em Dilma Rousseff em 2016, segundo o economista, o que tende a se repetir se Lula tentar estancar o processo que eleva os lucros de modo totalmente desvinculado do crescimento econômico do Brasil. 

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“Esses que estão falando de golpe agora são bolsonaristas, mas uma parte enorme, mesmo da burguesia esclarecida, toparia e topou 2016. E se mexer no lucro deles como está agora vai ter confusão. Não há como sustentar uma taxa de lucro desse padrão atual sem deixar o povo na miséria absoluta”, afirma, em entrevista ao jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS desta sexta-feira (19/08).

Costa Pinto projeta que, diante das chances reduzidas de Jair Bolsonaro vencer a eleição, os setores burgueses tentarão transformar Lula numa nova terceira via, inviabilizada nas candidaturas que restaram. “Acho que Lula não virará terceira via, porque acabou de sair da cadeia e sabe que se não tiver apoio da massa ele volta de novo”, opina.

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Para ele, a burguesia local perdeu qualquer verniz cosmopolita e progressista de 2016 para cá e retrocede aos moldes da República Velha anterior à Revolução de 1930, intensificando seu DNA escravocrata, antirreformista e autoritário. “Estamos falando de acumulação primitiva e pilhagem. Não há como reverter isso sem um significativo aumento de gastos e investimentos públicos em infraestrutura”, argumenta. 

O professor de economia política na UFRJ vê nas falas atuais do ex-presidente Lula as promessas de recobrar as potencialidades da Petrobras (que, de acordo com sua contabilidade, poderia recolher de volta R$ 150 bilhões hoje escoados para o capital privado), rever a reforma trabalhista (o que “mexe na burguesia inteira”), aumentar o investimento público (retirando o teto de gastos), colocar os pobres de volta no orçamento e inserir os ricos no Imposto de Renda. 

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Mesmo com essas medidas, que o economista classifica como de "social-democracia tímida" e “nada revolucionárias”, é imprevisível a reação dos setores que lucram com a derrocada econômica do país.

Diferentemente do primeiro governo Lula, iniciado em 2003, não haveria condições materiais para se repetir agora a política conciliatória que marcou o primeiro ciclo petista no poder. “Evidentemente Lula gostaria de fazer mudanças conciliando, mas, com essas taxas de lucro da megaburguesia, qual o sentido lógico de esse pessoal da grana ceder?”, indaga. "Só se Lula conseguir reativar a economia relativamente rápido, para que esse pessoal passe a ter lucro com crescimento econômico.”

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Na leitura de Costa Pinto, Lula tentará promover a guinada, por identificação sincera com os mais pobres e até mesmo pela ambição de entrar para a história como maior que Getúlio Vargas.

“Se vai conseguir não sei, mas acho que tentará, por sua trajetória, sua idade e o que viveu nos últimos anos. Lula entendeu que não adianta puxar o saco da galera, porque jogam ele na cadeia. Não foi a Lava Jato, foi a burguesia brasileira que fez isso”, afirmou. Diante de setores militares, bolsonaristas, classe média e grande imprensa, será um governo de conflito permanente, em sua avaliação.

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Ele lamenta que a relação capital-trabalho no Brasil se restrinja historicamente à luta salarial, característica que se agudizou do momento do golpe para cá. “A partir de 2010, não houve investimento, mas sim subsídio. O que o subsídio garantiu foi que as taxas de lucro não caíssem tão rápido. Só que os salários continuaram subindo, e a luta de classes no Brasil acontece a partir da relação salarial, dado o grande precariado”, afirma.

O professor interpreta a tentativa de Dilma de continuar o ensaio desenvolvimentista de Lula, com estímulos à indústria e às empresas não-financeiras: “Na eleição de 2014, uma parte da burguesia estava desembarcando do PT. O discurso da campanha de Dilma foi de ampliação da questão social e salarial, e a burguesia ficou de cabelo em pé com aquilo”. Ele interpreta a inflexão que levou ao golpe: “2015 foi o pior dos mundos, porque era o aumento do conflito entre capital e trabalho, com os dois lados perdendo. Caía o salário, mas o lucro caía mais que o salário”. 

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A hesitação burguesa naquele momento se desfez com a sinalização de Michel Temer, no documento Ponte para o Futuro, de que mudaria o padrão de acumulação do capitalismo brasileiro. 

Temer iniciava ali a dissolução da Constituição de 1988, abrindo caminho para a reconstituição do “capitalismo escravocrata” para uma classe dominante dependente do Estado e desejosa de lucrar sem precisar se movimentar produtivamente. Paralelamente aos terremotos políticos, a rentabilidade do empresariado financeiro segue estável e intocada, seja em períodos de desenvolvimento econômico ou de crise.

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A reforma trabalhista de Temer instalou a extração da mais-valia absoluta, nas palavras do economista, impulsionada pela queda salarial e pelo aumento do desemprego. O processo se aprofunda continuamente: "A receita de vendas das empresas da megaburguesia está crescendo, e elas estão engolindo as pequenas e médias empresas. No caso dos serviços, é uma parceria entre aspas, porque as grandes empresas de venda colocam as menores dentro de seu site. A pequena e média empresa é quase um operário ali dentro, como pessoa jurídica, sem receber nada.” Altman lembrou que a jornada de trabalho volta a padrões do século 18 ou 19, ampliada em níveis ilimitados na precariedade de categorias como a dos trabalhadores de aplicativo.

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