Cyda Moreno: “Giovanna Ewbank não pode virar símbolo da luta contra o racismo”

Em entrevista à TV 247, a atriz, produtora e diretora de teatro analisou a violência racial sofrida por Titi e Bless, filhos do casal de atores.

Cyda Moreno, Giovana Ewbank, Bruno Gagliasso e filhos
Cyda Moreno, Giovana Ewbank, Bruno Gagliasso e filhos (Foto: Reprodução)


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247 - O caso de racismo envolvendo os filhos da atriz Giovanna Ewbank e do ator Bruno Gagliasso repercutiu na mídia e trouxe à tona um debate com relação à reação da atriz, que agrediu verbal e fisicamente a mulher que cometeu crime racial contra os seus filhos, e suscitou um questionamento. Se fosse uma mulher preta a ter a mesma atitude de Giovanna na defesa de seus filhos, teria atraído a mesma empatia e solidariedade? 

A atriz Cyda Moreno lembrou, em participação no programa Um Tom de resistência, na TV 247, o processo de adoção das duas crianças e destacou a vulnerabilidade social da população afrodescendente como o principal motivo de muitas crianças pretas terem de ser submetidas a esses processos. “Apesar da forma como são tratadas e cuidadas com todo amor e carinho, eu não posso deixar de questionar, por exemplo, o porquê de essas crianças precisarem ser adotadas. Para nós, enquanto pessoas pretas, isso não deixa de ser um fator muito triste. Principalmente, quando pensamos na miserabilidade de várias pessoas da nossa etnia, que são obrigadas a abrir mão dos filhos por questões estruturais, por racismo, por miséria e por não darem conta de criar os seus filhos. Não é uma decisão fácil para um pai ou uma mãe, porém, fome e a miséria, muitas vezes, leva a mãe a adotar essa medida. Que bom que, não tendo outra forma de acolhida para essas crianças, elas foram adotadas pela Giovanna e pelo Bruno.”

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Sobre a reação de Giovanna, Cyda entende que foi uma atitude normal de uma mãe na defesa de seus filhos. “Quando eu vi as palavras que a mulher proferiu àquelas crianças, a dois inocentes, no primeiro lugar que eu me coloquei foi no de mãe. Mãe é mãe, independentemente da cor, do status ou do privilégio. Se a mãe é movida por amor, esse ímpeto na defesa dos seus filhos diante de um ataque como esse, está no sangue, está na alma. E ela não mediu, em momento nenhum, as consequências da sua reação. Até porque, na condição de privilegiada, ela não sofreria represálias. É um casal empoderado, que tem dinheiro e grande visibilidade. Fenotipicamente falando, a Giovanna é uma mulher branca, de olhos azuis , que está no lugar que a sociedade entende como as pessoas que tem direito de fala”. Cyda Moreno também ressaltou a consciência que Giovanna Ewbank tem do seu privilégio como mulher branca, no depoimento que ela postou nas redes sociais sobre o caso. “Eu acompanhei a fundo o caso, vi o depoimento do casal e o tempo todo eu vi uma mãe, inclusive, consciente do seu privilégio. E isso é importante, porque abre uma brecha para que uma mulher preta também tenha direito ao seu lugar de fala, tendo a mesma reação que ela teve quando for defender os seus filhos do racismo”.

Apesar de enaltecer a importância da reação de Giovanna como mãe, e a sua consciência social em admitir os privilégios da branquitude, Cyda reconhece que se uma mulher preta agisse da mesma forma, não despertaria tanta empatia e solidariedade. “Isso é um fato. O que acontece com nós mulheres negras, é o que Foucault chamou de “dobrar o delito”, que é quando estamos no lugar de vítimas, e a sociedade vai em busca de fatos que minimizem e desconsiderem o nosso lugar enquanto vítimas. Apesar de estarmos conquistando mais espaços na sociedade, o racismo estrutural ainda nos coloca em condição de inferioridade. Isso faz com que esse “dobrar o delito” se torne mais forte do que a ação que foi praticada contra nós. E é óbvio que se fosse eu, uma mulher preta, defendendo os meus dois filhos, eu não iria passar de uma mulher exagerada, barraqueira e agressiva. Na escola, por exemplo, quantas mães de crianças pretas que estudam em colégios particulares, de classe média, não passaram por uma situação de os filhos reclamarem de racismo praticado por colegas, e quando elas procuraram a direção da escola foram recebidas com espanto? Porque nós mulheres pretas sempre fomos vistas como ‘barraqueiras’ e, em momento algum, somos vistas nesse lugar onde a sociedade viu a Giovanna”.

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A diretora de teatro ainda questionou o título de “leoa” recebido por Ewbank e a ideia de transformá-la em um símbolo na luta antirracista após o episódio. “A sociedade defendeu o seu gesto, assim como eu também defendi. Mas o caso só tomou maiores proporções porque foi com a Giovanna Ewbank. Poder ser que se fosse uma atriz preta e com a mesma visibilidade, o caso também repercutisse. Porém, se fosse com mulheres comuns do nosso dia a dia, que amam aos seus filhos tão quanto qualquer outra mãe, talvez fossem até presas por terem agredido a uma mulher branca. Eu acho triste tentarem fazer dela um símbolo na luta contra o racismo. E a nossa história enquanto mães e mulheres pretas, há séculos fazendo de tudo para defender os nossos filhos? Temos que ter um cuidado com isso. A Giovanna Ewbank não pode virar um símbolo na luta contra o racismo e ou de uma mãe ‘leoa’, porque eu também sou. Porque se não, sempre se inverterão os fatos e nós sempre iremos precisar de uma pessoa branca falando por nós para que a nossa fala seja validada”.

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