Novo plano de negócios da Petrobrás prioriza pagamento de dividendos em vez de investimentos
No fim de outubro, o Conselho de Administração da empresa aprovou o pagamento antecipado de R$ 31,8 bilhões (cerca de US$ 6 bilhões) aos acionistas
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Brasil de Fato - O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou, neste domingo (5) ao site Poder360, que a Petrobras irá anunciar a diminuição nos preços dos combustíveis a partir desta semana.
Nesta segunda-feira (6), no entanto, a empresa publicou uma nota informando que “não antecipa decisões de reajuste e reforça que não há nenhuma decisão tomada por seu Grupo Executivo de Mercado e Preços (GEMP) que ainda não tenha sido anunciada ao mercado”.
Segundo o presidente da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Otto Alencar (PSD-BA), em 2021 a Petrobras aumentou 11 vezes os preços da gasolina e 9 vezes os do diesel.
Neste ano, a gasolina subiu 74%, e o diesel, 64,7%. Em outubro deste ano a gasolina atingiu um valor 40% maior do que o registrado no mesmo mês de 2020, de acordo com a Ticket Log.
Se a política de preços da estatal seguir pelo mesmo movimento capitaneado nos últimos meses, o anúncio de redução dos valores de Jair Bolsonaro será visto, mais uma vez, como uma promessa ao vento, o que não seria uma surpresa.
No fim de novembro, a Petrobras publicou o novo Plano Estratégico de Negócios e Gestão (PNG). Na avaliação da Federação Única dos Petroleiros (FUP), o planejamento, que é atualizado anualmente, prioriza o pagamento dos dividendos aos acionistas e a exportação de óleo cru, em detrimento de investimentos em áreas estratégicas para a estatal, como a construção de refinarias.
“É um plano muito aquém dos desafios que estão colocados para empresa. É um plano que privilegia a distribuição de dividendos para acionistas. Como a maior parte das ações está na mão do setor privado, principalmente de acionistas estrangeiros, o plano privilegia tirar recursos da companhia para colocar na mão dos acionistas estrangeiros”, afirma o economista Henrique Jäger, pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e ex-presidente da Fundação Petrobras de Seguridade Social (Petros).
No fim de outubro, o Conselho de Administração da empresa aprovou o pagamento antecipado de R$ 31,8 bilhões (cerca de US$ 6 bilhões) aos acionistas.
O valor se soma ao primeiro pagamento antecipado deste ano, de R$ 31,6 bilhões, anunciado em agosto deste ano, totalizando R$ 63,4 bilhões (cerca de US$ 12 bilhões) antecipados aos acionistas, relativos ao exercício de 2021. A União, que possui a maior parte das ações (28,67%), ficará com a maior parte
A Petrobras “não vinha fazendo investimentos altos porque vinha pagando dívida, mas já estava apontando para pagar mais dividendos. Em 2021, vai pagar mais de R$ 60 bilhões de dividendos. Com esse plano, a empresa está contando que vai manter um pagamento altíssimo nos próximos cinco anos”.
O preço do combustível é uma escolha política
João Antônio de Moraes, petroleiro, dirigente do Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP), ex-coordenador da FUP e coordenador da Plataforma Operária e Camponesa da Água e Energia (Pocae), explica que a legislação estabelece que a estatal precisa pagar pelo menos 25% dos resultados, o que tradicionalmente, antes do governo Bolsonaro, ocorria uma vez por ano. “Fechou o balanço uma vez por ano, em dezembro, paga os dividendos no ano seguinte.”
Na gestão do capitão reformado, inaugurou-se a prática de pagar mais de uma vez ao ano. “Eu estou na Petrobras desde 1984 e não me lembro de nenhum momento em que a empresa antecipou o pagamento de dividendos. Em toda a história que eu conheço só pagou acionistas depois do balanço publicado. É uma prática inaugurada por Bolsonaro e Paulo Guedes [ministro da Economia]”, afirma Moraes.
Trata-se de “uma escolha de priorizar pagar acionista no curto prazo. Mais do que um uma intenção, existe um plano estratégico nesse sentido”. Moraes reafirma o que dizem os outros especialistas: “As ações que o governo Bolsonaro vem tomando priorizam os acionistas estrangeiros e os especuladores. São acionistas que querem usufruir dos resultados da empresa no curto prazo, sem se preocupar inclusive com a longevidade da Petrobras”.
Soma-se a isso a escolha pelo Preço por Paridade de Importação (PPI), que leva em consideração a cotação do barril de petróleo em dólar para formar o preço no mercado nacional.
“O preço dos combustíveis no Brasil sempre levou em conta os custos de produção da Petrobras e de outras empresas que atuam no mercado de combustíveis. A partir de 2016, passou a se ter a prática do chamado PPI, e os preços não levaram mais em consideração os custos, mas o preço no mercado Internacional, apesar de serem produzidos aqui.”
Para Moraes, o resultado da prioridade dada aos acionistas e de políticas como o PPI é o aumento do preço dos combustíveis. “Por que que a gasolina está tão cara? Por que o gás de cozinha está tão caro? Por que que o diesel está tão caro? Porque Bolsonaro resolveu tirar do povo para pagar especulador. O preço do combustível é uma decisão política.”
E os investimentos?
Neste novo plano, a previsão de pagamento de dividendos é maior do que a previsão dos investimentos, segundo Jäger. “Em vez de aumentar os investimentos para gerar mais empregos, e o Brasil crescer melhor para fazer frente aos desafios e acontecimentos no mercado interno e na companhia, está apontando que vai pagar mais dividendos do que fazer investimentos”, afirma.
Dos investimentos, a maior parte será destinada à área de exploração e produção (E&P). Para o aumento da capacidade de refino serão US$ 2,6 bilhões (R$ 14,5 bilhões, pela cotação atual).
Nessa seara, um aporte importante para finalização da construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, conhecida como RNEST. A refinaria aparece no plano de venda de ativos da estatal. O fato de não estar concluída, no entanto, pesou nas negociações, o que levou à empresa, por ora, a recuar no processo de venda.
“A maior parte dos investimentos vai se se concentrar na RNEST. Tem um déficit muito alto na região Nordeste. Então tinha um espaço para crescer o refino na região, que eles não estão se propondo a fazer, a não ser a RNEST, mas que será basicamente pra exportar”, explica o pesquisador do Ineep, caso o governo federal não prossiga com a venda da refinaria.
Nesse sentido, Jäger explica que a estratégia da Petrobras é concentrar as atividades de refino na região Sudeste.
“O tom dele [do plano] é consolidar a estratégia da Petrobras nos últimos anos de se retirar de praticamente todos os estados do Brasil, concentrar suas atividades no eixo Rio-São Paulo, principalmente na produção de petróleo do pré-sal para exportação, e com isso gerar uma receita para pagar os altos dividendos para os acionistas internacionais.”
Na mesma linha, Deyvid Bacelar, coordenador geral da FUP e ex-conselheiro de Administração da Petrobrás, afirma que “os projetos estão concentrados na integração das Bacias do Sudeste (Reduc e GasLub). No caso da RNEST, fica a indagação: sinalizaram a volta do investimento porque não apareceram compradores para a refinaria? Resta saber se a Petrobrás vai investir para permanecer com o ativo ou se vai investir para agregar valor e tentar vender novamente a unidade”.
A área de refino é estratégica para uma empresa que oferece um produto essencial para a sociedade, que são os combustíveis. Isso porque gera empregos, agrega valor ao produto, tornando-se uma atividade mais lucrativa, e faz com que o Brasil deixe de depender da produção de combustíveis de outros países, logo, da volatilidade do dólar.
De acordo com Bacelar, “há iniciativas inovadoras para a produção de BioQAV, BioBunker, mas nada para os combustíveis mais utilizados no mercado interno. Onde estão os investimentos para o processo de transição energética, para os renováveis, dos quais a direção da Petrobrás vem se desfazendo, indo na contramão da tendência mundial? Onde estão os investimentos em novas tecnologias, que gerem energias mais limpas?”, questiona em nota publicada pela FUP.
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