Filme sobre o DOI-Codi é lançado com a indagação: por que Doria não quer preservar a memória dos torturados?

O prédio ainda não se tornou um memorial de verdade por resistência do governo de São Paulo

(Foto: NEXO FILMES / Camilo Tavares)


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Por Paulo Henrique Arantes, para o 247 - Defensores de Direitos Humanos, Núcleo Memória à frente, lançam nesta sexta-feira (29), às 18h, em live que pode ser acompanhada via @nucleodepreservacaodamemoriapolitica, o documentário “O Dia em que a Justiça Entrou no DOI-Codi”, de Camilo Tavares. Os leitores do Brasil 247 já podem assistir ao filme, de 17 minutos, clicando neste link. Participarão da live nomes como Paulo Vannuchi, ex-ministro dos Direitos Humanos, Ariel de Castro Alves, presidente do grupo Tortura Nunca Mais, Eugênia Gonzaga, procuradora da República que presidiu a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, Rogério Sottili, diretor do Instituto Vladimir Herzog, e Marcelo Araújo, superintendente do Instituto Moreira Salles, além de Maurice Politi, diretor do Núcleo Memória, e do próprio Camilo Tavares.

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O DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna), que tornou a Rua Tutoia 921, na Zona Sul paulistana, o endereço mais tenebroso da ditadura civil-militar que subjugou o país por 21 anos, foi tombado pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo) em 2014, o que é muito pouco em termos de preservação da História. O prédio ainda não se tornou um memorial de verdade porque o Governo João Doria não quer. 

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As cenas de “O Dia em que a Justiça Entrou no DOI-Codi” foram gravadas em 9 de setembro último, quando realizou-se uma audiência pública dentro das dependências da antiga casa do terror, onde 7 mil brasileiros foram presos e torturados e onde 54 morreram nas sessões de tortura comandas pelo coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Uma ação civil pública, proposta pelo promotor Eduardo Valério, pede que o prédio do antigo DOI-Codi passe a ser de responsabilidade da Secretaria da Cultura, e não mais da Secretaria de Segurança Pública.

Da audiência pública, por decisão do juiz José Eduardo Cordeiro Rocha, da 14ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, resultou que o prédio não poderá ter outro destino a não ser o de constituir um memorial e que o Governo do Estado teria, a partir daquela data, 90 dias para apresentar um projeto com tal finalidade. 

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O jornalista Ivan Seixas foi torturado ali em 1971, aos 16 anos, junto com seu pai, Joaquim Alencar de Seixas. Ambos eram militantes de organizações clandestinas contra a ditadura. Ele viu o pai morrer sob tortura. Coordenador da Comissão da Verdade “Rubens Paiva”, Seixas foi o proponente do tombamento do antigo prédio do DOI-Codi e está no filme de Camilo Tavares ao lado de várias outras pessoas martirizadas naquelas salas pouco iluminadas.

“Voltar àquele lugar é como tomar o território do inimigo”, disse Ivan Seixas ao Brasil 247. Na audiência de 9 de setembro último, ele ouviu um delegado defender que o imóvel  seja transformado numa espécie de academia de Polícia. “Só se for para ensinar tortura”, retrucou na hora, em dura ironia. 

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Mas por que o Governo do Estado resiste a transferir as instalações para a Cultura, já que hoje o prédio é apenas parcialmente ocupado por uma delegacia? Para Seixas, “por falta de vontade política dos tucanos”. 

Segundo o promotor Eduardo Valério, que não está mais à frente da ação por ter mudado de área no âmbito do Ministério Público do Estado de São Paulo, o argumento do governo é que a própria Pasta da Cultura não quer essa responsabilidade, por falta de recursos e outras desculpas do gênero. Na audiência pública, representantes da Procuradoria da Fazenda chegaram ao ridículo de argumentar que a criação de um memorial no local poria em risco a vida dos visitantes, já que havia “presos perigosos” na delegacia local – esqueceram de que não há presos custodiados no local desde 2003, quando a carceragem da 36ª DP foi desativada.

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“O prédio foi tombado em 2014 e houve compromisso do então governador, Geraldo Alckmin, de transferi-lo para a Secretaria da Cultura. Alckmin não cumpriu a promessa e Doria não demonstra vontade política para tanto”, afirma Maurice Politi, também ele um sobrevivente dos horrores do coronel Ustra. “Doria contrapõe-se a Jair Bolsonaro por ter sofrido na carne com a ditadura, mas neste caso não está fazendo nada”, aponta.

O pai de João Doria, João Agripino Doria, teve o mandato de deputado federal cassado pelo regime militar em 1964 e exilou-se com a família em Paris.

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O filme de Camilo Tavares, produzido pela Nexo Filmes, mostra os quatro prédios que compõem o complexo da Tutoia, seus corredores, salas e porões sendo visitados por gente que, não faz tanto tempo, sofreu ali dentro coisas indescritíveis. Os olhos do diretor, autor do premiado documentário “O Dia que Durou 21 Anos”, são sensíveis, como toda a sua obra é. Sensibilidade de quem sabe o que filma: Camilo é filho do grande jornalista Flávio Tavares, outro dos personagens da História brasileira que, talvez pela coragem, talvez pela inteligência, foram perseguidos pelos militares.

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