Com livro de Lu Xun, Editora Unicamp inicia série Clássicos da Literatura Chinesa

Parceria da Unicamp com o Instituto Confúcio facilita o acesso direto aos textos originais e integrais da literatura da China, que até então seguiam restritos a especialistas



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Por Hélio de Mendonça Rocha, na China Radio International

Uma das maiores contribuições de um povo à cultura mundial, a literatura chinesa ainda é um tanto desconhecida no Brasil. Embora alguns conceitos e aspectos dos escritos chineses cheguem ao país sul-americano por meio de obras filosóficas ou de outros elementos da cultura oriental, o acesso direto aos textos originais e integrais da literatura da China seguem restritos a especialistas. É para solucionar essa situação, e ao mesmo tempo investir neste importante produto do mercado editorial, que a Editora Unicamp lança, neste segundo semestre de 2021, a série Clássicos da Literatura Chinesa.

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Vinculada à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior do estado de São Paulo, a editora desenvolveu o projeto em parceria com o Instituto Confúcio, a principal entidade de cooperação cultural entre a China e outros países do mundo. Com o suporte dos especialistas da sede do Instituto em Campinas, a Unicamp selecionou obras e buscou uma tradutora para criar uma edição bilíngue, capaz de ser utilizada para estudos do mandarim por brasileiros interessados em chinês e vice-versa.

Para a primeira publicação, foi escolhido o livro de contos autobiográficos “Flores matinais colhidas ao entardecer”, daquele que é considerado o pai da literatura moderna chinesa: Lu Xun. A obra traça um retrato crítico e intimista da visão do autor sobre um período de extremas transformações na cultura e sociedade chinesas: a infância vivida na transição da última dinastia imperial, Qing, para as muitas mudanças ocorridas na China durante o século XX. Lu Xun ficou conhecido como um grande entusiasta das reformas na escrita chinesa, tornando-a acessível às camadas populares, sendo considerado um importante intelectual e revolucionário.

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Segundo o diretor do Instituto Confúcio de Campinas, Bruno de Conti, a publicação preenche uma lacuna que já era incômoda, principalmente num cenário econômico e cultural de integração crescente entre Brasil e China. Os planos são ousados: lançamento de um livro por ano, sempre em edições nas duas línguas. “As próximas publicações, acordadas com a editora, são um livro de mitos e lendas antigos e outro com poesias, sendo pelo menos uma referente a cada dinastia da história imperial chinesa”, antecipa o diretor.

Conti revela que cogita-se a possibilidade de publicar até mesmo um dos chamados “quatro romances clássicos da literatura chinesa”: “Romance dos Três Reinos”, de Luo Guanzhong; “À Beira d’água”, de Shi Nai'an; “Peregrinação ao Oeste”, de Wu Cheng’en, e “Sonho do Pavilhão Vermelho”, de Cao Xueqin. Em prosa, os quatro têm, cada um, mais de duas mil páginas nas traduções atualmente publicadas em inglês. “O desafio, neste caso, seria a extensão, que demandaria tempo e investimento. Mas não está descartado. Poderíamos, inclusive, publicar apenas trechos, sem comprometer o conteúdo, mas o ideal é trabalharmos com os textos integrais.”

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Enigmas e armadilhas da tradução do ideograma para o alfabeto latino

Para tradução das obras, foi selecionada uma profissional chinesa radicada no Brasil, Yu Pin Feng. Ela diz que um dos principais desafios de traduzir escritos do mandarim para o português está na adaptação de palavras e, sobretudo, metáforas, algumas existentes apenas no ideograma. “O mais difícil ao traduzir Lu Xun foi colocar a sua ironia e seu tom sarcástico de crítica à sociedade. A tradução não é uma transposição de uma língua para outra, simplesmente. Tem que recriar o mesmo ambiente para o leitor, em outro idioma.”

Por vezes, Lu Xun recorre a um ideograma para ilustrar uma situação, dizendo que, por exemplo, a personagem A-Chang dormia com os braços e pernas abertos, de maneira a formar o caractere “da”, que em chinês tem a forma parecida com uma pessoa de braços abertos. “Nesse caso, tive de usar o ideograma diretamente, e colocar a explicação entre parênteses. Há uma perda na fluidez e na imagem originais, em que o ‘da’ aparece no processo natural da leitura. Porém, fica preservada a mensagem.”

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Yu também ressalta as dificuldades em retratar as críticas e referências culturais de Lu Xun, que, no caso da leitura por um chinês, são facilmente assimiladas porque este já aprendeu, na escola e no saber popular, o pano de fundo da obra. No caso dos brasileiros, a adaptação possível foi o uso frequente de notas de rodapé, explicando momentos históricos, autores, artistas, estudiosos, movimentos políticos e elementos culturais referidos por Lu Xun. “Torna-se uma leitura fragmentada, diferente da experiência mais contínua que têm os chineses. O estrangeiro vai ler e pesquisar outras coisas, ao mesmo tempo. Eu tentei evitar as notas algumas vezes, mas não tem como fugir.”

A tradutora lembra, por fim, o papel importante do escritor como pensador e idealizador de uma China popular, através da linguagem. “Sua atividade pela reforma da linguagem, muito referida no texto, é fundamental para entender a China moderna. Lu Xun lutou por uma escrita chinesa em linguagem mais acessível, para que a leitura fosse algo universal e o conhecimento fosse instrumento de libertação.”

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