Alô, alô, Ana de Hollanda

Uma reforma na lei do direito autoral poderá recolocar a música brasileira num lugar de real destaque no mundo, com toda sua diversidade



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Com a chegada da era digital no mundo da música, têm sido intensas nos últimos anos as discussões acerca dos novos rumos do mercado fonográfico brasileiro. Um contexto conturbado, onde grandes gravadoras travam uma guerra, já perdida, contra a pirataria e novos artistas criam modelos de negócios que reinventam de forma consistente os caminhos para levar sua produção até seu público.

Nos moldes antigos do mercado, uma grande gravadora cuidava da carreira de um artista desde a construção da sua imagem até a chegada dos seus discos para o grande público, usando de uma força enorme do capital nos espaços midiáticos do rádio e da tevê. Era um período onde artistas tinham o “direito” de se comportar como verdadeiros imbecis e ainda teriam agentes (babás) para limpar sua bagunça. Além disso, a música deixara de ser o mais importante dentro do processo, pois consideráveis acordos financeiros norteavam por completo a programação das FMs e dos programas de tevê do país. O rádio passou de servir ao que o público queria ouvir para dizer o que o público deveria ouvir. Nasciam aí os primeiros artistas brasileiros fabricados, através da prática desleal do “jabá”, nome dado às generosas propinas que eram (e ainda são, porém em bem menor proporção) pagas para as emissoras de rádio.

O advento da internet deixaria grandes nomes da música perdidos no tempo e traria à tona outros que, no antigo modelo, jamais poderiam mostrar seu trabalho. As gravadoras começam a, literalmente, quebrar. Pois os discos não vendiam mais da mesma forma, tendo em vista que qualquer pessoa pode baixá-los na web. Mas o que parecia ser o fim, na verdade, tornar-se-ia um recomeço democrático em que o produto (a música) voltaria a ser o mais importante, já que cada vez mais as gravadoras dispunham de menos poder para bancar os tão falados “jabás”.

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No mundo plural e democrático da internet, único veículo de comunicação em que muitos falam para muitos, os novos artistas, sedentos por um espaço no show business, começaram a disponibilizar sua obra (discos e singles) gratuitamente para download nos seus sites, blogs e redes sociais. Esta ação, aparentemente pequena, viria a demonstrar o poder de fogo dessa nova forma de fazer música. Nomes como Mombojó, Móveis Coloniais de Acaju e O Teatro Mágico, dentre outros, conseguiram conquistar fãs por todas as partes do país, e começaram a fazer bem sucedidas turnês sem nunca terem aparecido em grandes programas de televisão ou ter tocado suas canções em FMs.

Antenados com as novas possibilidades do mercado, alguns artistas de renome, que buscavam sobreviver em meio ao caos das gravadoras, vislumbraram na internet outras possibilidades. Como é o exemplo de cantores como Lobão, Leoni, Tribo de Jah e Humberto Gessinger, que têm lançado livros, disponibilizado canções gratuitas para download e conversado diretamente com seu público em redes sociais, quebrando o tradicional distanciamento entre público e artistas famosos.

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Direitos Autorais

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – ECAD, responsável por arrecadar e repassar os direitos autorais, não oferece nenhuma transparência nos seus processos, sendo alvo de reclamações de músicos, produtores e casas de shows.

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Durante o governo Lula, o Ministério da Cultura travou uma discussão com produtores e artistas acerca da reforma da Lei de Direito Autoral, tendo preparado o projeto para ser votado no poder parlamentar. Porém, com a nomeação de Ana de Hollanda para o MinC, os artistas ouviram da ministra que a proposta somente seria enviada após a análise de sua nova equipe. A notícia causou grande rebuliço no meio artístico, diante da recente nomeação de Márcia Regina Barbosa, que teria sido indicada por Hildebrando Pontes Neto, ex-presidente do Conselho Nacional de Direito Autoral (CNDA), órgão que regulou o setor entre 1973 e 1990, até ser extinto. Após deixar o governo, ele vem advogando em mais de cem processos para o ECAD, que sempre foi contrário à reforma.

Recentemente, uma comissão de renomados músicos, que incluía Roberto Frejat, Leoni e Ivan Lins, dentre outros nomes, solicitou uma audiência com Ana de Hollanda para entregar à ministra uma série de reivindicações, que podem ser conferidas na íntegra na carta intitulada Terceira Via Para o Direito Autoral, publicada no site www.brasilmusica.com.br. Lá você pode ver os nomes dos músicos que assinam a proposta e também pode colocar sua assinatura digital em concordância com a carta.

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Uma proposta que chama a atenção na carta é a remuneração dos artistas que têm suas canções baixadas pela internet, buscando uma alternativa em que a conta não seja cobrada do internauta que realiza o download, descriminalizando aqueles que compartilham esses conteúdos na rede.

Diante de tantas controvérsias e discussões desafinadas, uma única coisa é certa: a propriedade intelectual não é respeitada no Brasil; que o diga Fauzi Beydoun, da banda Tribo de Jah: com 14 discos gravados, dois DVDs e muitas canções tocando em rádios, bares e eventos de todo o país, e pelo número de shows que realizamos a cada mês, o que recebo de Direito Autoral é irrisório. Com certeza há algo errado na maneira como esses recursos são geridos – lamenta o vocalista.

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Com a força criativa dos novos artistas, a disposição de nomes consagrados da nossa música e o potencial tecnológico do nosso país, temos a oportunidade de criar um dos sistemas de preservação da propriedade intelectual dos mais modernos do mundo. Espero, então, que a guerra de egos e os interesses individuais de poderosos, porém poucos, que atuam nesse mercado e não querem sua modernização, não nos impeça de dar esse importante passo rumo ao futuro. Passo este que poderá recolocar a música brasileira num lugar de real destaque no mundo, e não apenas ser uma falácia “bossa nova” em que nem a minha avó vê mais novidade e que não representa de forma plena a diversidade musical e cultural do nosso Brasil.

Khalil Gibran é cantor e compositor

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www.twitter.com/khalilgoch

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