A gênese do rock de Brasília
Documentrio de Vladimir Carvalho ser exibido hoje pela primeira vez na capital. Diretor afirma que o trabalho completa sua trilogia sobre a cidade. Assista ao trailer
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Documentário de Vladimir Carvalho será exibido hoje pela primeira vez na capital. Diretor afirma que o trabalho completa sua trilogia sobre a cidadeLúcio Flávio_especial para o Brasília247 – Vladimir Carvalho ainda não tinha formatado toda a informação na cabeça. Mas seu documentário Rock Brasília – Era de Ouro começou a nascer, mesmo que inconscientemente, naquele fatídico show da Legião Urbana, no finado estádio Mané Garrincha, onde milhares de fãs promoveram a maior quebradeira depois da interrupção abrupta da apresentação. O filme abre hoje a 44ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro.
"Fiquei 24 anos mexendo e remexendo nessas fitas, sabia que tinha um material valioso nas mãos e que felizmente estava intacto", recorda. "Praticamente gravei o show inteiro, sobretudo os momentos mais dramáticos, inclusive depois, na enfermaria, com aquela confusão toda", detalha o experiente documentarista.
A data não poderia ser mais emblemática – 18 de junho de 1988. Muitos entusiastas do bom e velho rock 'n' roll, talvez norteados pela alegria e magia do momento, nem se deram conta. Mas, no mesmo dia, Sir Paul McCartney assoprava 46 velinhas e, no entanto, o trem que naquela noite parecia levar milhares de pessoas para a Disney desembarcaria em Auschwitz. A imagem apocalíptica seria criada pelo próprio Renato Russo, tempos depois. E Vladimir Carvalho pegou carona nesse passeio do terror.
"Olhando para o passado descobri que, por uma série de fatores, pela dimensão que o rock de Brasília tomou, pela própria morte do Renato Russo, aquele momento tinha entrado para a história", conta o velho conterrâneo de guerra Vladimir, que novamente participa do mais emblemático e importante festival de cinema brasileiro.
Um evento, aliás, que tem a cara do cineasta e se confunde com a própria trajetória desse paraibano de Itabaiana, desde 1970 radicado em Brasília. A última vez que Vladimir Carvalho participou do festival foi há cinco anos, em 2006, com o documentário O Engenho de Zé Lins, vencedor do prêmio especial do júri e melhor montagem. Mesmo assim, ele garante, a responsabilidade é grande, embora não esteja na mostra competitiva. Será a primeira exibição em Brasília do filme.
"É a prova de fogo e é o que tenho para oferecer, vivenciei a cidade por este viés, o da cultura; falando desses meninos do rock estou falando de Brasília mais uma vez, com isso fecho uma trilogia sobre Brasília", revela, referindo-se aos filmes Conterrâneos Velhos de Guerra (1991) e Barra 68 (2000). O primeiro, a saga sobre a construção da cidade. O segundo, a invasão dos militares na UnB.
"Não é um musical", explica Vladimir, que começou a se interessar pelas guitarras durante as aulas de Cinema que dava na UnB, quando pedia aos alunos que trouxessem suas impressões da realidade da cidade. "Queria que eles entrassem em contato com o panorama da cidade, com o que estava acontecendo, e fizessem um registro em forma de linguagem cinematográfica. Recebi relatórios interessantes sobre a cena musical que estava se criando", lembra.
E não só isso. De repente, aqueles meninos todos, a maioria filhos de amigos seus que moravam em quadras próximas à sua, eram protagonistas de um fenômeno singular na cena musical da cidade. Assim como o próprio Vladimir, ainda não sabiam, mas estavam dando os primeiros passos do rock brasiliense, forjando identidade bem particular do movimento, completamente diferente do que estava acontecendo em outras praças do País, como São Paulo e Rio de Janeiro.
"O filme refaz o caminho da turma da Colina, é a história deles, o que eram e o que se tornaram. Uma turma que começou com um pouco mais que um brinquedo nas mãos, as guitarras, e aos poucos foi perdendo a inocência", conta. "O rock de Brasília nasceu entre a diplomacia e a pós-graduação, o que é bem típico de Brasília, como a flor do cerrado, uma espécie de enclave musical, nesse panorama dos anos 80, o tipo de coisa que só podia dar por aqui", observa o diretor, que norteia sua narrativa documental clássica a partir da trajetória de três bandas eixos do rock de Brasília: Plebe Rude, Capital Inicial e... Legião Urbana.
São os integrantes desses três grupos, como Dinho Ouro-Preto, Phillipe Seabra e os legionários Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, além de pessoas envolvidas diretamente com o movimento, como os produtores do primeiro disco da Legião Urbana, José Emílio Rondeau e Mayrton Bahia, os irmãos Herbert e Hermano Vianna, que dão voz e movimento ao filme de mais de 140 minutos. No centro de tudo, por meio de imagens de arquivo e depoimentos emocionados, a figura quase paternal de Renato Russo, espécie de guru intelectual e sentimental da turma.
"Era um sujeito que tinha uma cultura incrível, lia os filósofos, conhecia os sonetos de Shakespeare no original e um letrista excepcional", destaca Vladimir. "Era uma referência e essa característica diferente que ele tinha deu um diferencial diante de todas as outras bandas", analisa.
Aclamado no badalado Festival de Paulínia, em julho, e uma das atrações do Festival de Cinema do Rio, que começa em 6 de outubro, Rock Brasília – Era de Ouro já tem data marcada para entrar em circuito comercial: 21 de outubro. Serão 30 cópias lançadas, num primeiro momento, em seis praças: São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Belo Horizonte e Brasília.
Das primeiras imagens até o produto final se passaram 26 anos, uma longa espera, quase uma odisseia contra o tempo. Odisseia essa também desbravada pelos meninos do rock de Brasília. "Eles foram uns vitoriosos, foram além das fronteiras, são exemplos, assim como muitos, do que deu certo em Brasília", resume.
Rock Brasília – Era de Ouro. Exibição na abertura da 44ª edição do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro. A partir das 20h30, na Sala Villa-Lobos do Teatro Nacional.
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