Thomaz Bastos: “Nunca fiz tráfico de influência”

Em entrevista, o homem que, até ontem, era ministro da Justiça diz que hoje se sente à vontade fazendo a defesa do contraventor Carlos Cachoeira; “Eu não alieno meu direito de advogar para ninguém, só à minha consciência”, diz o advogado que recebe R$ 15 milhões pela causa do bicheiro

Thomaz Bastos: “Nunca fiz tráfico de influência”
Thomaz Bastos: “Nunca fiz tráfico de influência” (Foto: Sérgio Lima/Folhapress)


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247 – O advogado Marcio Thomaz Bastos hoje se vê na delicada posição de um homem que tem, a toda hora, que prestar explicações sobre seus atos. Até ontem, ele era ministro da Justiça. Hoje, advoga para o maior contraventor do País, que, nesta semana, fez de palhaços os parlamentares que fazem parte da CPI sobre Carlos Cachoeira.

O primeiro a vocalizar a estranheza com os movimentos do ex-ministro foi o músico (e também advogado) Alceu Valença. Em sua página no Facebook, o cantor pernambucano indagou sobre o decoro de um homem público que se dispõe a receber R$ 15 milhões de um bicheiro. Dinheiro de origem provavelmente ilícita. E que o orienta a se calar na CPI para não produzir provas contra si.

Acostumado a elogios e rapapés, Marcio Thomaz Bastos está incomodado com os danos que o caso Cachoeira pode causar a sua imagem. Nesta semana, ele falou à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, e agora a Claudio Dantas Sequeira e Izabelle Torres, da Istoé. Nesta entrevista, disse que nunca fez tráfico de influência. “Fui advogado durante 45 anos, passei quatro anos no Ministério da Justiça, do qual saí há seis anos, e voltei a advogar. Sempre dentro do mesmo padrão ético que tinha antes”, afirmou à Istoé.

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Bastos disse ainda que todos os cidadãos têm direito à defesa, que existe a presunção de inocência e que só aliena seu direito de advogar à própria consciência. Mas será que Alceu Valença não tem razão? Pode o homem que, até ontem, encarnava a lei se tornar hoje o conselheiro de R$ 15 milhões do crime organizado?

Leia, abaixo, a reportagem da revista Istoé:

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Na última semana, o ex-ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos protagonizou dois episódios capazes de gerar sérias controvérsias no mundo político e jurídico do País. Em um, exerceu pressão pública sobre o Supremo Tribunal Federal. Em outro, o mais visível e polêmico deles, colocou-se como um obstáculo para o trabalho que o Congresso Nacional pretendia realizar. Em ambos os casos, não praticou ilegalidades ao contrapor-se a dois poderes da República. Mas suas ações também não podiam ser vistas como meros atos rotineiros de um advogado criminalista. As atitudes do ex-ministro da Justiça estavam imbuídas de uma inegável e estrondosa conotação política. Márcio Thomaz Bastos e a maioria de seus clientes sabe que ele ainda é um homem poderoso, com influência sobre partidos, parlamentares e tribunais. Nos últimos anos, ele foi conselheiro de dois presidentes da República e deu suporte jurídico a vários integrantes da PT. Além disso, teve papel decisivo na nomeação de sete dos 11 atuais ministros do STF. 

No caso mais emblemático, Márcio Thomaz Bastos, por vezes, parecia zombar do Congresso e dois contribuintes. Ele se postou ao lado do bicheiro Carlinhos Cachoeira durante audiência na CPI que investiga o esquema de corrupção e lavagem de dinheiro montado pelo contraventor. Orientou seu cliente a ficar calado, para evitar produzir provas contra si mesmo, e com isso provocou a ira de deputados e senadores, que viam no depoimento uma esperança de avançar nas investigações. É indiscutível o direito constitucional de qualquer réu à plena defesa, independentemente da acusação ou malfeito que tenha cometido. Ninguém é obrigado a produzir provas contra si mesmo. Também é dever do advogado defender um acusado perante a Justiça, até mesmo quando este não dispõe de recursos. No entanto, a CPI é norteada por um processo muito mais político do que jurídico. E, como era sabido por todos os parlamentares presentes, Thomaz Bastos não permaneceu durante toda a sessão acomodado ao lado de um contraventor somente como um grande criminalista. Ele era o retrato de um ineditismo: pela primeira vez na história do Congresso, um ex-servidor público que ocupou a mais alta esfera do Judiciário nacional, dava cobertura e amparo ante os holofotes a um bicheiro, notório criminoso, que já se provou pernicioso ao erário. “Espero nunca mais encontrar o ex-ministro numa situação como essa”, disse o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ).

Na mesma semana, Thomaz Bastos apareceu junto a outros nove advogados de réus do mensalão como signatário de um documento em que se dizem preocupados com a onda de cobranças contra o Supremo Tribunal Federal no caso. Temem que o julgamento seja inundado por seu caráter político e se transforme num “juízo de exceção” e assim sugerem à corte um rito com limite de sessões semanais. O fato de ter, em alguns casos, indicado, em outros, ajudado a escolher a maioria dos atuais membros da Suprema corte não parece constranger o ex-ministro. “Fui advogado por 45 anos consecutivos, passei quatro anos no Ministério da Justiça, do qual saí há seis anos”, disse Thomaz Bastos à ISTOÉ.

O ex-ministro também negou que tenha entrado no caso Cachoeira por orientação política e não fala em honorários – embora circule a informação de que teria cobrado R$ 15 milhões, em três prestações mensais, para defender o contraventor. A Polícia Federal e membros da CPI suspeitam da origem dos recursos de Carlinhos Cachoeira. O líder do PPS, Rubens Bueno, chegou a questionar, durante sessão da CPI em que estava Thomaz Bastos, de onde vinha o dinheiro para custear a defesa, pois, segundo a Receita, os rendimentos oficiais do bicheiro não chegariam a R$ 200 mil.

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Não é de hoje que Thomaz Bastos se vê envolvido em casos rumorosos. Ficou famoso seu auxílio, ainda como ministro, na defesa do então ministro da Fazenda, Antônio Palocci, no escândalo da violação do sigilo do caseiro Francenildo. Bastos também assessorou a montagem da defesa de Delúbio Soares e Zé Dirceu no caso do mensalão. Até hoje, Thomaz Bastos é consultado por Lula, que, quando presidente, o chamava ao Palácio do Planalto até cinco vezes por dia. O advogado também deu suporte jurídico à campanha de Dilma Rousseff à Presidência. Pela ligação com o PT e Lula, Tomaz Bastos consolidou na esfera política uma ampla e complexa rede de influências. Todas as indicações para a cúpula do Judiciário, desde 2003, são atribuídas ao ex-ministro, ainda que indiretamente. Quando Joaquim Barbosa foi indicado para o Supremo, Thomaz Bastos ligou para ele em Los Angeles, avisando-o. O mesmo ocorreu com Dias Toffoli, advogado do PT, que foi para o STF com as bênçãos do ex-ministro. Toda essa influência no Judiciário alimenta especulações de que os nomeados não teriam plena autonomia. A mesma impressão ocorre dentro da Polícia Federal, órgão turbinado na gestão de Bastos. A equipe de advogados coordenada por ele agora procura falhas processuais e erros que possam ter sido cometidos pela PF na Operação Monte Carlo, que prendeu Cachoeira. Para o líder do PSOL na Câmara, Chico Alencar (RJ), não dá para ignorar essa contradição. “É lamentável que isso esteja sendo feito e orquestrado por quem chefiou a Polícia Federal e sabe como poucos como ela funciona”, diz Alencar.

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