PML: prisão de Battisti é afronta à soberania

"Prisão de Cesare Battisti durou poucas horas mas mostrou uma situação absurda: juiza de primeira instância mandou prender refugiado cuja presença no Brasil foi definida por um presidente da República", diz Paulo Moreira Leite, diretor do 247 em Brasília; "não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular", afirma; ele lembra, ainda, que o advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal, e que, entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello

"Prisão de Cesare Battisti durou poucas horas mas mostrou uma situação absurda: juiza de primeira instância mandou prender refugiado cuja presença no Brasil foi definida por um presidente da República", diz Paulo Moreira Leite, diretor do 247 em Brasília; "não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular", afirma; ele lembra, ainda, que o advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal, e que, entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello
"Prisão de Cesare Battisti durou poucas horas mas mostrou uma situação absurda: juiza de primeira instância mandou prender refugiado cuja presença no Brasil foi definida por um presidente da República", diz Paulo Moreira Leite, diretor do 247 em Brasília; "não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular", afirma; ele lembra, ainda, que o advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal, e que, entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello (Foto: Valter Lima)


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Por Paulo Moreira Leite

A prisão de Cesare Battisti desafiou uma decisão presidencial.

“Será que o Brasil ficou de ponta cabeça e não me avisaram?”, perguntou um dos maiores juristas brasileiros, ao ser informado do fato.

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Preso na tarde de quinta-feira, Battisti foi solto no fim da noite do mesmo dia. Mas um episódio dessa natureza, envolvendo um personagem que em 2010 foi alvo de uma disputa política ácida entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Supremo Tribunal Federal e a oposição, merece alguns minutos de reflexão. Será que o Brasil se encontra de cabeça para baixo?

Battisti encontra-se legalmente no Brasil por decisão de um presidente Republica.No último dia de seu governo, valendo-se de uma prerrogativa que a lei assegura ao presidente da República, Lula rejeitou o pedido de extradição do governo da Itália, onde Battisti havia sido condenado por quatro assassinatos ocorridos na década de 1970, no auge das organizações terroristas.

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Parecia um caso resolvido, do ponto de vista político e jurídico até que, dias atrás, o Ministério Publico entrou com uma ação pedindo que Battisti fosse deportado. A juiza Adversi Rates, da 20a. Vara Federal de Brasília, acolheu o pedido, determinando a prisão até que fosse enviado para a Itália. No despacho, a juíza contestou diretamente a competência de um presidente da República para decidir o destino de Battisti. Escreveu que ele encontra-se em “situação irregular” no país. Como conta a repórter Natuza Nery, da Folha de S. Paulo, acrescentou que “por ser criminoso condenado em seu país de origem por crime doloso, não tem o direito de aqui permanecer, e portanto, não faz jus à obtenção nem de visto nem de permanência.” Lendo o despacho de Sua Excelência, conclui-se que a presença de Battisti não só era uma decisão complexa e polêmica, que dividiu opiniões em seu devido momento — mas ilegal.

Não tenho a menor condição de fazer uma crítica jurídica a essa afirmação. Mas há aspectos políticos óbvios.
Cabe perguntar quem tem o direito — legal — de definir a permanência de qualquer pessoa — terrorista italiano, traficante colombiano, ditador sul-americano — no país. Não é uma questão secundária nem se pode dizer que o país nunca pensou a respeito.

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Em 2010, Lula só decidiu que Battisti iria permanecer no Brasil após uma decisão Supremo Tribunal Federal. Os ministros, em maioria, eram favoráveis à extradição de Battisti. Mas admitiram que a palavra final nessa matéria cabe ao Executivo. Foi apoiado nessa visão, da mais alta corte do país, que Lula decidiu a favor de Battisti. Não foi um gesto solitário, nem uma decisão irrefletida. Tampouco se pode imaginar que Lula tivesse cometido uma espécie de atropelo institucional com a decisão.

Na verdade, Lula tomou uma decisão coerente com a tradição democrática da diplomacia brasileira.

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Até ditadores, como Alfredo Stroessner, do Paraguai, permaneceram no Brasil quando o país vizinho se democratizou — e sucessivos governos paraguaios se empenharam para que fosse extraditado. Trazido ao país de contrabando, o senador boliviano Roger Pinto só pode permanecer no Brasil nessas circunstâncias. Ele também é acusado de crimes horrendos em seu país de origem.

Apesar disso, a sentença de Adersi diz que ele deve ser deportado. Há diferenças entre extradição e deportação claro. Mas no fundo, estamos falando de responder a um pedido do governo da Italia, onde Battisti pode cumprir pena de prisão perpétua — que não existe no Brasil.

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Graças a um recurso apresentando ao Tribunal, Battisti foi solto em poucas horas. A decisão lembrou o óbvio: não cabia a primeira instancia revogar uma decisão tomada em patamares superiores.

É curioso que tenha sido preciso lembrar uma verdade tão banal dos meios jurídicos. Até porque não estamos falando de um caso desconhecido.

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O advogado da permanência de Battisti no Brasil era Luiz Roberto Barroso, hoje ministro no Supremo Tribunal Federal. Entre os documentos favoráveis à causa, encontra-se um parecer do professor Celso Bandeira de Mello.

Mestre que se tornou nome de edifício na Pontifícia Universidade Católica em São Paulo, Bandeira de Mello argumentou que Battisti foi julgado e condenado num ambiente que não lhe deu pleno direito de defesa. Um dos fatos notáveis do processo é que as principais acusações contra Battisti foram produzidas por antigos colegas da organização Proletários Armados do Comunismo sob um regime de delação premiada.

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Em sua sentença, derrubada no Tribunal, a juíza Adersi respondeu a uma ação do Ministério Público, instituição que enfrenta um problema com o governo italiano. Até agora não conseguiu convencer as autoridades daquele país a lhe entregar um troféu político precioso: a extradição de Henrique Pizzolatto, condenado na Ação Penal 470, que fugiu para a Itália. Assim que Pizzolato foi localizado e preso na Italia, não faltaram comentários para lembrar que a permanecia de Battisti no Brasil poderia ser um obstáculo no pedido de extradição. É mais uma pergunta do caso: será razoável alterar uma decisão do governo brasileiro na esperança de se obter uma retribuição do governo italiano?

No mundo da Guerra Fria, a troca de prisioneiros — na verdade, espiões — era uma prática permanente do jogo político internacional. Berlim era o endereço predileto para esse tipo de evento, pelo menos nos filmes de espionagem. Levar essa hipótese a sério, no Brasil de 2015, implica em admitir que a Justiça pode ser manipulada para atender a finalidades políticas, o que é inaceitável.

Cada um pode especular a vontade. Mas não é todo dia que uma juíza de primeira instancia contraria uma decisão de um presidente da República, expressão máxima da soberania popular. “Será que o Brasil ficou de ponta cabeça?”

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